Presidente da Equipe Argentina de Antropologia Forense fala à Comissão da Verdade

Luis Fondebrider está no Brasil a convite da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos
25/07/2014 14:00 | Da Redação: Keiko Bailone Fotos: José Antônio Teixeira

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Público presente na reunião <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164417.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Amelinha Teles, Luis Fondebrider e Adriano Diogo <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164418.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Luis Fondebrider <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164419.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

"A vantagem do Brasil é sua capacidade científica", respondeu Luis Fondebrider, presidente da Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF), ao responder à indagação do presidente da Comissão da Verdade Rubens Paiva, deputado Adriano Diogo (PT), sobre "como estão as coisas no Brasil".

Adriano referia-se ao trabalho de identificação de pelo menos três ex-militantes da luta armada, desaparecidos nos anos da ditadura militar, cujas ossadas foram retiradas há 23 anos do cemitério de Perus e hoje encontram-se no columbário do cemitério do Araçá.

Momentos antes, Amelinha Teles, coor­denadora da Comissão da Verdade, havia lembrado que o presidente da EAAF havia sido convidado em 1990, à época da abertura da vala de Perus onde foram encontradas 1.049 ossadas, para ajudar na identificação. Entretanto, tanto a Unicamp quanto a USP negaram a participação da EAAF naquela ocasião, sob a alegação de que havia antropólogos forenses capacitados no país.

"Até hoje não temos antropólogos forenses, tanto que precisamos recorrer à EAAF para ajudar na elaboração de um protocolo para retomada da investigação da vala de Perus", afirmou Teles.

Em uma breve exposição, Fondebrider explicou que está no Brasil para analisar ossadas encontradas há 24 anos e, portanto, traria à reflexão da comissão alguns momentos dos 30 anos de trabalho à frente da EAAF.

Comentou em mais de uma ocasião as quatro premissas que motivam os familiares em sua busca pelos desaparecidos: verdade, justiça, memória e reparação. Destacou também que são sempre as mulheres que estão à frente desses movimentos.

O que é a EAAF

Ao contar como e por que surgiu a EAAF, Fondebrider voltou a 1976, quando houve seis intervenções militares na Argentina, que resultaram em milhares de desaparecidos. Seus corpos foram enterrados em valas comuns ou jogados no Rio da Prata. Em 1984, com a volta da democracia e o surgimento da Comissão da Verdade naquele país, a Justiça ordenou a exumação de algumas ossadas. "Porém não havia metodologia científica, e o governo não colaborou com os familiares nesse sentido". Assim, naquele ano, surgiu a EAAF, uma organização independente formada por médicos, biólogos, antropólogos e arqueólogos, que, desde 1986, já atendeu a solicitações de mais de 50 países, entre os quais, Filipinas, Chile e África do Sul.

"Há casos de violência política e religiosa, e cada país tem suas características próprias, seus conflitos culturais. Mas a dor é sempre a mesma, e os atingidos "nunca aceitam a conciliação, querem a justiça", observou.

Mais adiante, contou sobre o procedimento de investigação feita pela EAAF, que inclui desde a pesquisa histórica e física das pessoas desaparecidas, bem como das condições do local de enterro e dos vestígios encontrados. A compreensão de como o Estado se organiza também é importante, segundo Fondebrider, para se entender como ocorreu a detenção e a morte da vítima.

"Sempre procuramos saber quem, o que, quando, onde, como e por quê", destacou o presidente da EAAF, exemplificando: "procuramos saber qual a localização da cova, a identidade da vítima, se foi sequestro, morte, qual a aparência, se foi recuperado por policiais, familiares ou testemunhas".

No caso de desaparecidos políticos, as fontes são as mais variadas, segundo ele: denúncia de familiares, atuação de organismos oficiais, fotografias, certidão de óbito, notificação de entrega do cadáver ou mesmo entrevistas com companheiros de militância e médicos. "Nunca mencionamos prazos que não podem ser cumpridos e nem criamos falsas expectativas, porque, muitas vezes, não há resultados", disse Fondebrider.

Ele falou dos problemas que aparecem durante as investigações, como a falta de conhecimento da estrutura do Estado, que muitas vezes mantém registros incompletos ou dispersos ou mesmo dificulta a busca de informações e o acesso aos arquivos. "Tudo isso prejudica a interpretação correta de dados", explicou o antropólogo.

Na parte final de sua exposição, Fondebrider destacou como "lições aprendidas nesses 30 anos": a importância de familiares e ONGs estarem presentes no processo de investigação; a obrigação de o Estado abrir arquivos secretos; a vontade política; e o investimento na memória e educação de jovens, para que se lembrem dos acontecimentos do passado.

alesp