Audiência organizada pelo deputado Carlos Giannazi (PSOL) na Assembleia Legislativa, em 24/10, abriu espaço, pela segunda vez em menos de dois anos, para oitiva de atuais e ex-franqueados da rede de supermercados Dia, que se dizem prejudicados por operações comerciais lesivas impostas pela empresa Dia Brasil em território brasileiro. Participou da reunião o ex-franqueado português Paulo Jaloto, que lidera em seu país uma associação de vítimas da franquia. Jaloto já havia participado, via internet, da primeira audiência pública sobre o tema em 2013, e agora contou pessoalmente sobre casos de suicídio e de como a empresa engana os investidores na sua franquia, abandonando o franqueado a sua própria sorte e "inventando" promoções para atrair clientes às lojas sem dar o devido respaldo material e logístico. Mostrou ainda um vídeo feito na França de um movimento organizado por franqueados e ex-franqueados Dia e revelou que levou o caso às autoridades europeias responsáveis pelas relações de negócios no bloco, sediadas na Bélgica. Além de detalhar denúncias e práticas abusivas da franqueadora Supermercado Dia na Europa, Jaloto relatou também problemas causados pela empresa na China e na Argentina. Empresários brasileiros Empreendedores da capital e do interior paulista se revezaram ao microfone para contar suas malsucedidas experiências como franqueados da companhia, acusada de assédio, de falta de diálogo e de apoio nas operações do dia a dia, de indução ao endividamento financeiro do franqueado, de não suprir as lojas com as mercadorias solicitadas, de entregar produtos diversificados de forma compulsória nos pontos de venda sem direito à recusa (inclusive alimentos com prazos exíguos de validade que, de acordo com denúncias, vêm como refugo das lojas próprias), de impor margens apertadas e vulneráveis de lucro e contratos fora de prazo com cláusulas abusivas, dentre outras. Laura Araújo e Ruan Pereira, mãe e filho, que foram sócios entre junho de 2012 e março de 2014 numa loja franqueada Dia em Jardinópolis (cidade próxima a Ribeirão Preto, com cerca de 40 mil habitantes), disseram que perderam bens imóveis tentando "salvar o negócio" e hoje estão endividados. "Me sentia burro, incapaz", confessou Pereira. Outro empreendedor da cidade de Artur Nogueira (município próximo a Limeira com 45 mil habitantes) lastimou que ele, o pai e a mãe, presentes na audiência, estivessem à beira de um colapso nervoso e também endividados. Além das consequências financeiras e materiais como falência e dívidas bancárias, problemas de saúde como depressão e casos de suicídio foram relatados durante a reunião. Sindifranqueados A mesa dos trabalhos contou ainda com a presença de Jamil Soufia e Eduardo Caetano, respectivamente presidente e advogado do Sindicato dos Franqueados do Estado de São Paulo (Sindifranqueados). Caetano alertou quanto ao contrato, que considerou abusivo e bom somente para a Dia Brasil, e as diversas condenações trabalhistas impostas à empresa, bem como acordos de reparação já homologados pela Justiça. "O Dia se porta apenas como um operador logístico. Além disso, dá ordens aos funcionários que não são dele e sim do franqueado. A empresa terceiriza a atividade-fim", finalizou o advogado sindical. Ex-funcionário da Dia Brasil, Régis de Matos revelou bastidores das operações lideradas por ele enquanto empregado da companhia numa função de comando regional, como despacho de mercadoria sem pedido, manipulação e maquiagem de dados etc., tudo a mando da rede. Conta ainda que foi processado por difamação, mas absolvido pela Justiça. "A empresa tem como foco somente a distribuição de mercadoria, só isso. No meu entendimento, deveríamos estar lá para ajudar o franqueado, e não para acabar com a vida deles, como acontece", completou. Representantes do Ministério Público Estadual, do Ministério Público do Trabalho, da Associação Brasileira de Franchising e do Supermercado Dia Brasil (Matriz Brasil) foram convidados, mas não compareceram. O deputado Carlos Giannazi afirmou que vai acionar a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais e a Comissão de Fiscalização e Controle da Assembleia para que chamem o representante da Dia Brasil para depor. Depois disso, pretende levar os relatos ao Ministério Público Estadual, ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e à Receita Federal para que esses órgãos investiguem o caso.