Opinião - Crônicas do extermínio anunciado (Parte 3)


13/02/2017 17:17 | Carlos Giannazi*

Ao longo dos últimos meses, os burocratas da SEE não dormiram em serviço: impuseram ao magistério paulista uma série de medidas, publicadas na calada silenciosa do recesso escolar, desmontando inúmeros projetos e reduzindo ao mínimo módulos de servidores de apoio ao funcionamento pedagógico e administrativo das escolas. Uma lástima para a educação pública paulista; um sucesso na redução de investimentos, no olhar deles.

O projeto embrionário das Salas de Leitura é um desses. Na verdade, nunca teve o olhar atencioso da secretaria, pois sempre foi programado como algo apenas possível se contasse com o empenho de cada unidade escolar e com a presença de um professor readaptado com disposição e saúde para tocar o projeto. Salas de Leitura, para a burocracia da SEE, nunca fez parte de um currículo sólido, com investimento em acervos, na formação do mediador de leitura e criação de espaços para que a leitura ganhasse vida. Sempre foi um arremedo. Uma pálida imagem do que deve ser uma Sala de Leitura ou uma Biblioteca Escolar. Nunca foi prioridade. Existiu por que muito se fala em leitura, na importância curricular da leitura e no susto causado pelos baixos desempenhos dos brasileiros nesse quesito. Mas nunca foi além disso.

Nos últimos anos, com a possibilidade de outros professores, além dos professores readaptados, com interesse pessoal e perfil de mediador , ocuparem as Salas de Leitura, ouvimos relatos de projetos interessantes aqui e ali, nas escolas, com manifesto interesse das crianças e jovens pela leitura. Quando chegamos imaginar que esse projeto (que deveria ser mais do que projeto e sim parte integrante do currículo) poderia decolar e se firmar, apesar da escassez de cursos de formação e do baixíssimo investimento em acervos, eis que a burocracia da SEE dinamita esperanças e volta anos atrás, praticamente destruindo o que de bom havia. Primeiro pela visão reducionista de que a Sala de Leitura é espaço do professor readaptado, conceito superado há mais de trinta anos, visto que o que deve orientar a escolha do mediador da Sala de Leitura é a sua formação, o seu perfil e o seu interesse. Fazer, como estão fazendo, forçando professores readaptados a assumirem essa responsabilidade é uma insensatez sem tamanho. Ignoram o laudo médico, passam por cima de eventuais outros interessados com perfil adequado. Trazem o autoritarismo imbecil de volta, assediam professores readaptados e cortam trabalhos bem feitos, muitos deles à custa de esforço coletivo da escola. E, de quebra, reforçam uma visão de educação simplista em que equipamentos pedagógicos para além da ala de aula não são importantes nem necessários. Bom desempenho em leitura, nas escolas públicas, ora bolas, para quê? Postura como essa, certamente tem guarida nos conceitos do atual chefe da secretaria, expostos em artigos publicados na imprensa paulista, que o "estado" não pode tudo e temos que procurar alternativas e outros modos de substituir esse leviatã quebrado. Em outras palavras: voltamos ao tempo em que se vivia de campanhas de doação de livros (quase sempre inservíveis) e que Sala de Leitura não passava de um cantinho sob uma escada escura. Sala de Leitura com acervos novos, repostos, com mediador ativo, bem formado e agitador cultural, dentro de um espaço apropriado e criativamente organizado... isso não é possível. E convenhamos, é essa turma que está propondo reforma no ensino médio. Risível!

Não podemos mais nos acomodar com este novo desmonte, extermínio dos muitos bons projetos de Sala de Leitura. A competência em leitura é a sustentação de um currículo crítico e sólido. Que todos, educadores, institutos, ONGs , mediadores de leitura e universidades, façam chegar aos burocratas da SEE o incômodo que estas medidas de extermínio vêm causando , exigindo a volta do espaço criativo, vivo e crítico da leitura nas escolas públicas paulistas.

Voltaremos ao assunto.

*Carlos Giannazi é deputado estadual pelo PSol

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