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25 DE ABRIL DE 2005

015ª SESSÃO SOLENE EM HOMENAGEM AOS “MÁRTIRES ARMÊNIOS MORTOS PELOS TURCOS NO GENOCÍDIO DE 1915”

 

Presidência: ARNALDO JARDIM

 

DIVISÃO TÉCNICA DE TAQUIGRAFIA

Data: 25/04/2005 - Sessão 15ª S. SOLENE Publ. DOE:

Presidente: ARNALDO JARDIM

 

HOMENAGEM AOS MÁRTIRES ARMÊNIOS MORTOS PELOS TURCOS NO GENOCÍDIO DE 1915

001 - ARNALDO JARDIM

Assume a Presidência e abre a sessão. Anuncia autoridades presentes. Informa que esta sessão solene foi convocada pela Presidência efetiva, a pedido do Deputado ora na condução dos trabalhos, com a finalidade de homenagear os Mártires Armênios Mortos pelos Turcos no Genocídio de 1915. Convida a todos para, de pé, ouvirem a execução do Hinos Nacionais da Armênia e do Brasil, executados pela Banda da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Afirma que essa homenagem constitui um ato de memória e de militância para reafirmar a causa armênia, e para que o genocídio seja reconhecido por todos os países e também pelo governo turco.

 

002 - DALMO DE ABREU DALLARI

Coordenador da Cátedra Unesco/USP de Direitos Humanos, fala da história do povo armênio, destacando os fatores geopolíticos, jurídicos e religiosos que levaram ao genocídio de 1915.

 

003 - ACHOT YEGHIAZARIAN

Cônsul-geral da República Armênia, agradece a iniciativa desta homenagem, que se repete desde 1989, afirmando que seu objetivo é a memória, a solidariedade e o respeito pelos antepassados. Lamenta o não-reconhecimento e a deturpação do genocídio perpetrada pelos turcos.

 

004 - Presidente ARNALDO JARDIM

Anuncia a apresentação de números musicais. Considera que o genocídio que foi vítima o povo armênio é um crime de lesa-humanidade, que não tem prescrição, e que esta Casa, ao realizar anualmente sessões solenes para lembrá-lo, contribui para seu reconhecimento por toda a comunidade internacional. Informa o lançamento pelos Correios, ao final desta sessão solene, de carimbo evocativo aos 90 anos do Genocídio Armênio. Agradece a todos que colaboraram para o êxito desta solenidade. Encerra a sessão.

 

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O SR. PRESIDENTE - ARNALDO JARDIM - PPS - Havendo número legal, declaro aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.

 

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- É dada como lida a Ata da sessão anterior.

 

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O SR. PRESIDENTE - ARNALDO JARDIM - PPS - Esta Presidência convida para compor a Mesa principal, o nosso Arcebispo Datev Karibian, Prelado titular da Diocese da Igreja Apostólica Armênia; o Dom Vartan Waldir Boghossian, Exarca Apostólico Armênio para a América Latina; o Sr. Achot Yeghiazarian, Cônsul Geral da República Armênia, e o Reverendo Dr. Roy Abrahamian, Presidente do Conselho e Pastor da Igreja Evangélica Armênia de São Paulo. (Palmas.)

Srs. Deputados, minhas senhoras e meus senhores, esta Sessão Solene foi convocada pelo Presidente desta Casa, atendendo solicitação deste Deputado, com a finalidade de homenagear os Mártires Armênios Mortos pelos Turcos no Genocídio de 1915.

Convido todos os presentes para, de pé, ouvirmos os Hinos nacionais armênio e brasileiro, que serão executados pela Banda da Polícia Militar do Estado de São Paulo, sob a regência do Maestro 1º Sargento PM Aguiar.

 

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- São executados os hinos nacionais.

 

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O SR. PRESIDENTE - ARNALDO JARDIM - PPS - Em nome do Poder Legislativo de São Paulo e também da comunidade armênia, agradecemos a Banda da nossa Polícia Militar do Estado de São Paulo. Muito obrigado.

Permito-me, na figura de algumas lideranças representantes, saudar a todas as senhoras e senhores aqui presentes. Menciono o Sr. Gabriel Palulian, representando o Comandante do IV Comar, Major Brigadeiro-do-Ar, Paulo Roberto Cardoso Vilarinho; a Sra. Helena Maria Gasparian, Secretária Municipal de Relações Internacionais, representando o Sr. Prefeito de São Paulo, José Serra. Permitam-me todos, dentro de um clima, acredito, de informalidade e amizade, dizer que somo o meu carinho pessoal a Helena Maria Gasparian, minha esposa. Aproveito para cumprimentar os nossos filhos que aqui estão: Marcelo, Leonardo, Pedro e Rafael Gasparian Jardim. Muito obrigado.

Menciono o Tenente-Coronel Mardiros Burunsizian, representando o Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Coronel PM Eliseu Eclar Teixeira Borges; o Professor Dr. Dalmo Dallari, Coordenador da Cátedra Unesco-USP de Direitos Humanos; o Sr. Dimitris Zoitós, Cônsul-Geral da Grécia. Agradeço a sua presença que simboliza a presença dos povos amigos da Armênia. Menciono o Sr. Dmitry Potapov, vice-Cônsul da Rússia em São Paulo; o Professor Dr. Antranik Manisadjian, Presidente do Conselho Representativo da Comunidade da Igreja Apostólica Armênia do Brasil; o Dr. Roberto Nerguisian, Presidente do Conselho Deliberativo da Comunidade de Osasco/SP; o Professor Ohânes Koutoudjian, Presidente da Diretoria Executiva da Comunidade da Igreja Apostólica Armênia do Brasil; o Sr. Jean Afetian, representando o Sr. Sarkis Sarafian, Presidente do Conselho Administrativo da Igreja Católica Armênia São Gregório Iluminador; o querido Dr. Simão Kerimian, Presidente da Associação Cultural Armênia de São Paulo e Presidente do Conselho Nacional Armênio do Brasil-CNA, a quem quero agradecer muito pelo empenho na organização deste ato; o Sr. Nubar Nercessian, Presidente da Sociedade Cultural Ararat; o Sr. Ochin Leon Nosditchian, Presidente do Comitê Brasileiro para a Reconstrução da Armênia-Fundo Armênia; o Sr. Kevork Kumruian, Presidente da Sociedade Artística Melodias Armênias-Sama-Clube Armênio; Sr. Carlos Matheus der Haroutiounian, Presidente da União Geral Armênia da Beneficência-Ugab; a Sra. Janette Djehdian, Presidente da Sociedade Beneficente das Damas Brasil-Armênia-HOM/São Paulo; o Sr. Hovsep Seraidarian, Presidente da Sociedade Beneficente e Cultural Marachá; o Sr. Garabed Pilavjian, Presidente do Conselho Deliberativo do Clube Armênio de São Paulo; o Sr. Kleber dos Santos, Diretor Regional Adjunto dos Correios de São Paulo; a Sra. Telma Manzi, Assessora de Comunicação dos Correios de São Paulo; o Sr. Garô Aharonian, da Igreja Evangélica Irmãos Armênios. Esta Presidência, o Poder Legislativo de São Paulo saúda a todos e pede que possamos, com uma salva de palmas, marcar essa confraternização e a presença de todos aqui entre nós. (Palmas.)

Sabemos que este ato é de memória, de lembrar, mas é um ato também de militância para reafirmar a causa armênia e para reafirmar o nosso empenho para que o genocídio seja reconhecido pela comunidade internacional, por todos, e seja admitido também pelo governo turco para que possa, de uma forma muito clara, celebrar o nosso compromisso de não deixar apagar esta chama pela justiça e pelo reconhecimento. E é para fundamentar a causa do povo armênio, uma causa de todos nós, temos a grande honra de poder ouvir nosso Professor Dalmo Dallari, a quem concedo a palavra neste instante.

 

O SR. DALMO DE ABREU DALLARI - Exmo. Sr. Presidente, nobres Deputados, digníssimas autoridades civis, militares e eclesiásticas, caríssimos membros da comunidade Armênia, minhas senhoras e meus senhores, antes de tudo, quero agradecer à Assembléia Legislativa de São Paulo, aos organizadores deste evento pela altíssima honra de falar nesta oportunidade.

É um prazer imenso e uma honra estar aqui, porque, além da oportunidade de render minha homenagem, prestar minha solidariedade é também, como ressaltou o Sr. Presidente, uma oportunidade para externar algumas idéias - sem a pretensão de um tratamento teórico - relativamente a aspectos jurídicos implícitos na questão armênia.

Para evitar o risco de uma excessiva demora - a questão é muito importante, tem aspectos realmente fascinantes sob o ponto de vista jurídico -, preferi redigir minha exposição.

Peço licença ao Sr. Presidente para proceder à leitura do texto que registrei: “90 Anos do Genocídio Armênio - A celebração de hoje tem muita importância para toda a humanidade porque, além de manter viva a memória do martírio de um povo, o que é necessário para que a história não se repita, ela presta homenagem às vítimas, aos seus descendentes e a todos os integrantes da mesma nação, dando ensejo a que se registre o triunfo da resistência humanista.

O povo armênio faz hoje uma celebração, para que o mundo saiba que ele não esquece e jamais esquecerá os que foram vítimas de massacres ou foram forçados a deixar a Armênia em busca de sobrevivência, mas para proclamar que ele, povo armênio, não vive no passado mas está muito presente no mundo de hoje, dando sua contribuição positiva e relevante para a preservação de valores fundamentais, que são de toda a humanidade e que são para a eternidade.

A história do povo armênio é uma caminhada de milênios. Sua presença foi reconhecida na origem dos tempos históricos, como se verifica pela obra de grandes historiadores da Antigüidade, como Heródoto e Xenofonte, bem como pelos relatos e ensinamentos de notáveis historiadores do nosso tempo, como Arnold Toynbee. Acompanhando essa longa caminhada, feita de trabalho, de heroísmo e de permanente defesa da cultura e dos valores espirituais, podem-se captar as características mercantes desse povo, que, apesar de ter sofrido agressões físicas e morais de extrema violência, em vários momentos de sua história, nunca se rendeu nem se acovardou, nunca sucumbiu à conveniência de apoiar os invasores poderosos para escapar das agressões, pois sempre manteve a consciência da prioridade absoluta de seus valores morais e espirituais e jamais procurou escapar ao sofrimento aceitando a paz dos escravos.

As características básicas do povo armênio foram bem ressaltadas por um eminente político e corajoso defensor da dignidade humana, Lorde James Bryce, membro proeminente do Partido Liberal Britânico e, depois disso, integrante do Tribunal de Haia. Tendo estado no Cáucaso na segunda metade do século dezoito, teve notícia das atrocidades cometidas na Turquia contra o povo armênio e de volta à Inglaterra denunciou, indignado, aquelas violências.

Por designação da Coroa Britânica, Lorde Bryce efetuou pesquisa minuciosa, obteve muitas informações precisas e pormenorizadas sobre aquelas atrocidades e publicou importante relatório sobre as perseguições sofridas pelos armênios no Império Otomano. Como ficou registrado em seu relatório, tendo como vizinhos povos muito rústicos, que viviam de atividades pastoris e não tinham interesse pela ampliação dos conhecimentos, os armênios contrastavam por serem camponeses organizados, hábeis comerciantes, trabalhadores e amantes da paz, que, além de serem dedicados ao trabalho, cultivavam valores espirituais e procuravam o desenvolvimento intelectual, o que era comprovado pelo fato de que havia escolas em todos os núcleos populacionais armênios.

Tendo em conta essas características, pode parecer estranho que o povo armênio, de índole pacífica e trabalhadora, jamais tendo agredido outros povos, tenha sofrido tremendas violências em vários momentos de sua história. A explicação para os massacres sofridos pelos armênios foi dada, em parte, por Arnold Toynbee, completando-se por observações feitas por estudiosos da chamada ‘questão Armênia', bem como por comentários feitos por analistas que estudaram a história do povo armênio e observaram de perto os terríveis acontecimentos que se registraram de 1915 a 1923, período do ‘genocídio armênio’ perpetrado pelos otomanos, último massacre sofrido pelos armênios. Tem especial importância para a interpretação dos fatos um relatório elaborado pela Comissão Americana de Investigação sobre as Atrocidades Armênias, que se constituiu nos Estados Unidos para que o governo daquele país tivesse informações precisas.

Nesse conjunto de elementos, merece especial atenção a circunstância de que o território ocupado milenarmente pelo povo armênio situa-se num ponto de encontro entre Ocidente e Oriente, um marco divisório entre Europa e Ásia, uma encruzilhada histórica por onde passaram os exércitos de vários dos grandes impérios, podendo-se citar como exemplos o Império Persa, na Antigüidade, e o Império Otomano, em período mais recente.

Fatores de geopolítica deram ao território dos armênios uma importância especial, em termos de ação militar e conquista territorial, levando os grandes Impérios a massacrar a população local para ter pleno domínio do território e para impor suas determinações arbitrárias. Lembre-se, também, que esses exércitos imperiais eram compostos, em grande parte, por pessoas rudes, sem cultura e desprovidas de valores éticos e espirituais, que se valiam da força para efetuar saques e destruições e para praticar violências de toda sorte contra as populações indefesas, especialmente contra as mulheres.

A par disso, a vocação pacifista do povo armênio e o cultivo de valores éticos, espirituais e culturais davam vantagens e criavam um contraste que os invasores não toleravam, pois, além de tudo, sabiam que não poderiam contar com os armênios como guerreiros ferozes e implacáveis que poderiam ser usados para a conquista de outros territórios. Esse contraste, várias vezes referido, foi um dos fatores do genocídio praticado pelos turcos a partir de 1915, como foi expressamente assinalado pela imprensa alemã: 'O armênio, devido ao seu mais elevado talento e superior habilidade comercial, goza de constante vantagem no comércio, nas arrematações de impostos, nas comissões e agências, sobre o turco, e vai enchendo a algibeira enquanto o turco continua pobre' (trecho de matéria publicada jornal alemão ‘Frankfurter Zeitung’, edição de 9 de outubro de 1915, transcrita no livro ‘Atrocidades Turcas na Armênia’, publicado pela Editora Paz e Terra, de São Paulo, em 2003).

Outro fator de extraordinária importância, para a compreensão dos reiterados massacres armênios, é o papel desempenhado pelo povo armênio na implantação e no desenvolvimento do cristianismo. Examinando-se a história do cristianismo, verifica-se que no século quarto da era cristã já havia um evidente distanciamento entre as comunidades cristãs de Roma e as do então chamado Oriente, que era onde se localizava a Armênia. E segundo os historiadores foi justamente a Armênia o primeiro Estado a se declarar oficialmente cristão, o que ocorreu no ano de 301 e teve grande importância para o desenvolvimento intelectual dos armênios, o que fica evidenciado pela criação, nessa época, dos caracteres do alfabeto armênio. Depois disso e sem vacilações e desvios, o povo armênio manteve fidelidade aos princípios do cristianismo e esse foi e continua sendo a base de seu humanismo.

Como foi bem observado por Toynbee, no período de afirmação e expansão do Império Otomano não se travou uma guerra religiosa, não se registrando uma posição exaltada dos muçulmanos contra os cristãos armênios. ‘Tudo foi feito pela vontade do governo e não por fanatismo religioso, simplesmente porque desejavam, por razões puramente políticas, desfazer-se de um elemento não muçulmano que contrariava a homogeneidade do império e constituía um elemento que não poderia sujeitar-se à opressão’ (‘Atrocidades Turcas na Armênia’, pág. 18). Aí está, portanto, outra explicação para o massacre dos armênios nesse período, massacre fartamente documentado, incluindo o assassinato e a tortura de homens considerados aptos para a guerra, deportações de mulheres, velhos e crianças para lugares desertos, desprovidos de água e de alimentação, bem como o rapto de grande número de crianças, entregues a instituições e famílias muçulmanas, para impedir que fossem criadas em ambiente cristão.

Finalmente, cabe uma indagação sobre a caracterização do genocídio, no período mais agudo das violências do século vinte, iniciado em 1915. Vem muito a propósito lembrar aqui a Convenção para a Prevenção e Sanção do Crime de Genocídio, aprovada pela Organização das Nações Unidas em 1948. O artigo II da Convenção contém a definição de genocídio, nos seguintes termos:

‘Artigo II - Na presente Convenção, entende-se por genocídio qualquer dos atos mencionados abaixo, cometidos com a intenção de destruir, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, como tal:

a. Matança de membros do grupo;

b. Lesão grave da integridade física ou mental dos membros do grupo;

c. Submissão intencional do grupo a condições de existência que deverão acarretar sua destruição física, total ou parcial;

d. Medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo;

e. Transferência forçada de crianças do grupo para um outro grupo.’

Aí está, com absoluta clareza, a definição do crime de genocídio, não havendo qualquer dúvida de que o massacre de armênios, a transferência de crianças para outros grupos e todas as demais violências cometidas contra o povo armênio pelos turcos no período de 1915 a 1923 caracteriza esse crime. Quanto ao elemento ‘intenção’, que faz parte da definição, tem sido explorado às vezes pelos acusados de genocídio, que alegam não ter declarado essa intenção.

Entretanto, um grupo de eminentes juristas de várias procedências, reunidos na Universidade de Nápoles em dezembro de 1993, em seminário promovido conjuntamente pela Fundação Internacional Lélio Basso, pelo Instituto Italiano de Estudos Filosóficos e pelo Instituto Universitário Oriental de Nápoles, debateu amplamente,a questão do crime de genocídio, concluindo, entre outras coisas, que além de ser um crime contra o direito das gentes ou crime contra o Direito Internacional, o genocídio é crime contra a humanidade. A par disso, concluiu-se que o crime de genocídio está caracterizado mesmo que não se declare a intenção, desde que os atos praticados conduzam aos resultados enumerados no artigo II da Convenção contra o genocídio aprovada pela ONU.

Por tudo o que foi aqui exposto e por muito mais que se poderia acrescentar, é justa e necessária esta celebração, que, além de seu efeito de denúncia de atrocidades contra um povo, acertando para a preservação dessa memória para que a história não se repita, tem o efeito de por em evidência a superioridade dos que lutam em defesa da dignidade humana e dos valores e direitos fundamentais da pessoa humana. Os grandes e poderosos impérios que se valeram de sua superioridade física, utilizada com absoluta insensibilidade moral, para impor tremendo sofrimento ao povo armênio, todos esses impérios passaram, fazem parte do rebotalho da história, são lembrados apenas como ilustração de momentos de degradação da humanidade. Bem ao contrário disso, o povo armênio, desprovido de grandes exércitos e de poderio militar, continua vivo e atuante, marcando sua presença de maneira positiva, dando contribuição permanente, de grande relevância, para a defesa da dignidade humana e para a preservação e promoção dos valores eternos da humanidade.” Muito obrigado. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE - ARNALDO JARDIM - PPS - O aplauso de todos já formalizou os nossos agradecimentos ao Professor Dalmo de Abreu Dallari que com sua fundamentação, sem dúvida nenhuma, embasa e empolga ainda mais a todos nós na luta por essa causa. Tem a palavra o Cônsul-geral da República Armênia, Achot Yeghiazarian.

 

O SR. ACHOT YEGHIAZARIAN - Exmo. Sr. Presidente, Exma. Sra. Gasparian, Secretária Municipal de Relações Exteriores, excelentíssimos membros do corpo consular, representantes civis, eclesiásticos e militares, prezados representantes da comunidade armênia, senhoras e senhores, permitam-me agradecer, em primeiro lugar, a nobre Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo por estar renovando a cada ano, desde 1989, o seu respeito e homenagem à comunidade armênia.

Não falarei sobre detalhes do assunto em referência, visto que o distinto orador desta noite, Dr. Dalmo Dallari, já abordou o tema tão brilhantemente, sobretudo os aspectos jurídicos do genocídio.

Gostaria apenas de citar para todas as pessoas que se encontram neste recinto que existe um único objetivo que os induz a comparecer: esse objetivo chama-se memória, solidariedade e respeito pelos antepassados. A humanidade, cuja história se emparelhou tragicamente a guerras e confrontos, ainda não conseguiu alcançar a concretização prática do princípio da coexistência pacífica. A síndrome permanente do perigo, os conflitos são latentes, e os problemas com os quais se debelam muitos estados, como a fome, a miséria e a privação, dentre outros tantos, são problemas constantes no mundo contemporâneo.

O genocídio e o assassínio em massa não são fatos do passado. Eles permanecem para a humanidade tal qual a espada de Dâmocles. Vê-se, por outro lado, o surgimento de um despertar amplo na sociedade humana, que é consciente da necessidade de abolir esses abusos, que une a sua voz em prol da justiça, reconhecendo e condenando tais atos.

Junto aos parlamentos e governos de diversos países, já há aproximadamente duas décadas, tenho reconhecido e condenado os nefastos acontecimentos do genocídio armênio de 1915, exigindo que a Turquia também aceite esse acontecimento. Mas, na contrapartida, o governo turco infelizmente não só continua a negar, como também deturpa vergonhosamente a verdade histórica, ao afirmar serem os armênios os autores do assim chamado “genocídio turco”.

Se os senhores tiverem a oportunidade de navegar pelo site oficial turco chamado “Armenian Gang”, verificarão que além do nome hostil, ali quer-se afirmar que foram os armênios que aniquilaram mais de meio milhão de turcos. Os senhores encontrarão ainda nesse lamentável site fotos de alguns grupos de resistência armada armênios serem chamados de gangues armênios. Os turcos não revelam entretanto a verdadeira razão de sua formação, uma vez que esses grupos surgiram para salvar a honra e dignidade das famílias armênias, que estavam à mercê da selvageria das enriquecidas hordas turcas. O referido site sequer traz qualquer complementação documental, visto que tais provas não existem, enquanto os armênios e o mundo todo possuem milhares e milhões de documentos, dados jornalísticos, diplomáticos e testemunhos da época comprovando o fato do genocídio.

Pressionados pela comunidade internacional e pelos países, que, de forma cada vez mais acelerada, vêm reconhecendo o crime de genocídio, vê-se que recentemente o governo turco tem mudado sua tática, desejando incluir a parte armênia numa evasiva discussão sobre a existência ou não do genocídio. No dia 13 de abril, o Presidente da Turquia encaminhou uma carta ao Presidente da Armênia, sugerindo que fosse criada uma comissão mista armênio-turca para analisar a questão do genocídio. O governo da Armênia declarou e afirma que não tem qualquer interesse em analisar essa questão, que já foi devidamente reconhecida pela opinião internacional há muito tempo. Duvidar do genocídio armênio é o mesmo que duvidar da veracidade do holocausto ou, por exemplo, da existência da União Soviética.

Nesses dias de abril, foram realizados amplos eventos na Armênia relativos aos 90 anos do genocídio, dos quais participaram milhares de convidados de todas as partes do mundo. No dia 21 de abril, ocorreu uma grande conferência internacional sobre a questão do genocídio, com a presença de diversas autoridades, ex-presidentes, ministros, juízes, embaixadores e analistas internacionais. A conferência chegou à conclusão de que partindo de seus próprios interesses e ao desejar integrar a União Européia, onde o ponto fundamental é o respeito pelos direitos humanos, então, este estado deve ter a coragem de assumir o seu passado histórico.

Em várias entrevistas que o Ministro das Relações Exteriores da Armênia tem concedido, tem destacado que a Turquia somente cessou as suas operações de guerra agressiva contra a Armênia Oriental quando em 1921 a parcela menor da Armênia histórica passou a ser parte integrante da União Soviética. A Turquia voltaria a iniciar esta agressão após a proclamação da independência da Armênia em 1991 e desta vez através do bloqueio total desta república e pela aliança militar com o Azerbaijão contra a Armênia.

O governo da Armênia considera que as dificuldades que o país sofre atualmente são conseqüências diretas de acontecimentos que ocorreram há 90 anos e acrescenta-se mais, que o país não pode viver seguro enquanto a sua vizinha Turquia, um país forte militarmente, não reconhece os crimes cometidos na sua história recente. Logo, tanto para a Armênia como para a diáspora, uma questão fundamental, o procedimento dos trabalhos em prol do reconhecimento do genocídio em nível internacional e nesse aspecto considera-se ser profundamente importante a decisão e o posicionamento do Brasil nesta questão.

Estamos seriamente convictos de que o Brasil, um dos maiores, mais democráticos e mais respeitados países do mundo, candidato à vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU a exemplo de muitos outros estados, como a França, a Itália, a Rússia, a Grécia, o Líbano, a Argentina, o Uruguai, a Polônia, a Bélgica e muitos outros, ecoará a sua voz em prol da justiça e pela verdadeira causa dos armênios.

Neste sentido, apreciamos altamente as duas decisões adotadas por esta nobre Casa Parlamentar Paulista sobre o genocídio armênio. Apresentamos, ademais, os nossos agradecimentos à Câmara Municipal de São Paulo que recentemente aderiu a uma moção semelhante.

Senhoras e senhores, condenar o genocídio, o holocausto, condenar qualquer crime de ontem e de hoje, significa assegurar um futuro pacífico do mundo, resguardar a estabilidade, o progresso e a coexistência pacífica entre as nações e, finalmente, oferecer um futuro melhor aos nossos filhos e às gerações que se seguirão. Muito obrigado. (Palmas).

 

O SR. PRESIDENTE -ARNALDO JARDIM - PPS - É com muita satisfação que gostaria de convidar para que se apresente a todos nós o Coral das Igrejas Armênias, sob a regência do maestro Yuri Jaruskevicius, com as músicas “Aos que tombaram”, “Senhor, tende misericórdia” e “Erevan Erepuni”.

 

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- É feita a apresentação do Coral das Igrejas Armênias.

 

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O SR. PRESIDENTE - ARNALDO JARDIM - PPS - Amanhã, no canal aberto 48, das 20 às 21 horas, será apresentada uma entrevista alusiva ao genocídio pela GNT, os atos que se sucederam no mundo todo nesse final de semana e as atividades que ainda se desenvolverão. Convidamos todos a irem à Câmara Municipal de São Paulo na próxima sexta-feira. Seja aqui em São Paulo, em todo o Brasil, em todos os lugares do mundo, há chama acesa.

Todos sabem que nesse final de semana, particularmente na Armênia, tivemos manifestações que orgulharam a todos nós. O fundamento daquilo que foi dito pelo Professor Dalmo de Abreu Dallari, o fato de que um crime como esse de lesa-humanidade não tem prescrição, um genocídio como esse merece e necessita ser julgado por toda a humanidade, pois reforça este momento em que vivemos a causa em que acreditamos.

Nós aqui, na Assembléia Legislativa de São Paulo, em 1989, aprovamos uma lei relembrando o dia 24 de abril. E, quando temos feito sessões sucessivas, eu lembro do nobre Deputado Wadih Helú, que durante muito tempo foi persistente na sua ação de fazer com que a Assembléia Legislativa se manifestasse. Tenho a honra de sucedê-lo, para, ao longo dos últimos anos, continuarmos a ter este momento de reflexão, de lembrança e de compromisso reafirmado.

Muitos dos senhores e das senhoras estiveram conosco no ano passado, quando vimos aquele documentário em que, de uma forma muito pujante, recolocava aquilo que alguns ainda se negam a não reconhecer. Hoje, neste ato e neste compromisso permanente que nos unem, temos o momento de renovação muito marcante na presença dos jovens que aqui estão.

Eu me emociono com isso, e, quer seja pela presença dos meus filhos, quer seja pela presença de todos os jovens da comunidade armênia, tenho certeza de que esta luta continuará sempre. Ainda que alcancemos - e alcançaremos - o reconhecimento e a condenação daqueles que são responsáveis por essas atrocidades, manteremos a chama acessa.

Este é o meu compromisso, este é o nosso compromisso, este é o compromisso do Poder Legislativo de São Paulo, este é o compromisso que queremos de toda a humanidade. Aquilo que foi hoje fundamentado, relembrando a Conferência de Nápoles de 2003, que queremos vê-la reconhecida pelo Plenário das Organizações das Nações Unidas, para que isso forme jurisprudência e definitivamente embase esse nosso pleito. Tudo isso, temos certeza de que ocorrerá.

Os passos foram dados. A comunhão das igrejas, que estão aqui representadas, a presença de todas as entidades, que está aqui reafirmada, tudo isso nos faz crer que esse dia está cada vez mais próximo.

Não somos ingênuos. Não temos direito de sê-lo. Sabemos que a conjuntura internacional tem que ser enfrentada. No documentário, que juntos assistimos no ano passado e temos buscado divulgá-lo, sabemos de quanto se avançou. Isso particularmente tem uma importância estratégica na geopolítica internacional. Inclusive, quando se caminhou no Congresso Americano, havia um momento de compromisso do então Presidente Bill Clinton com relação a esse reconhecimento, e sabemos que questões de geopolítica internacional fizeram com que houvesse um recuo daquilo que era um avanço então registrado.

Mas, se nós fazemos isso à custa de uma reflexão sobre os desafios, a certeza de que se avançou, a certeza de que é possível, e a certeza de que juntos tornaremos realidade o reconhecimento do genocídio e a condenação dos seus responsáveis de algo que não é de uma pessoa, não é de um povo, mas que é compromisso de toda a humanidade, em nenhum instante, nos faz esmorecer.

Quero agradecer a presença das nossas lideranças religiosas, a presença das lideranças da comunidade. Quero agradecer em meu nome, em nome do Poder Legislativo de São Paulo, a todos aqueles que com a sua dedicação - funcionários, organizadores - tornaram possível este encontro. E quero, neste instante, para que possamos fazer este encerramento formal da nossa cerimônia, convidar a Mesa, para que possamos, acompanhados do Dr. Kleber dos Santos Ferreira, representante da Empresa Correios e Telégrafos, do Dr. Micham Bertezlian, fazer o lançamento oficial do carimbo evocativo do Nonagésimo Aniversário do Genocídio praticado contra o povo armênio.

Esgotado o objeto da presente sessão, esta Presidência vai encerrá-la. Está encerrada a sessão.

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- Encerra-se a sessão às 21 horas e 09 minutos.

 

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