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10 DE JUNHO DE 2002

81ª SESSÃO ORDINÁRIA

 

Presidência: ROBERTO MORAIS

 

Secretário: JAMIL MURAD

 

DIVISÃO TÉCNICA DE TAQUIGRAFIA

Data: 10/06/2002 - Sessão 81ª S. ORDINÁRIA  Publ. DOE:

Presidente: ROBERTO MORAIS

 

PEQUENO EXPEDIENTE

001 - ROBERTO MORAIS

Assume a Presidência e abre a sessão.

 

002 - ALBERTO CALVO

Indigna-se com o assassinato do jornalista Tim Lopes. Pede que a imprensa apóie a ação da polícia contra criminosos.

 

003 - JAMIL MURAD

Homenageia a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado pelos seus 40 anos. Lê  artigos da edição especial da revista "Pesquisa Fapesp" sobre a instituição.

 

004 - JOSÉ ZICO PRADO

Lamenta o assassinato do jornalista Tim Lopes. Relaciona o desemprego com aumento da criminalidade.

 

005 - WAGNER LINO

Lamenta o assassinato do jornalista Tim Lopes. Lê comunicado da Rede Globo sobre o assunto.

 

006 - CONTE LOPES

Comenta a inversão de valores entre bandidos e policiais, na atual situação da violência.

 

007 - Presidente ROBERTO MORAIS

Anuncia a presença dos Vereadores Miguel Lombardi, José Roberto de Toledo e Dr. Júlio C. Pereira dos Santos, do Secretário de Saúde, Dr. Vicente Pironti Netto, e de diretores da Santa Casa, todos da cidade de Limeira.

 

GRANDE EXPEDIENTE

008 - CONTE LOPES

Analisa a origem do PCC e seu poder paralelo nas cadeias.

 

009 - WAGNER LINO

De comum acordo entre as lideranças, requer o levantamento da sessão.

 

010 - Presidente ROBERTO MORAIS

Acolhe o pedido. Convoca os Srs. Deputados para a sessão ordinária de 11/06, à hora regimental, com Ordem do Dia. Levanta a sessão.

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Havendo número legal, declaro aberta a sessão. Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos. Convido o Sr. Deputado Jamil Murad para, como 2º Secretário “ad hoc”, proceder à leitura da Ata da sessão anterior.

 

O SR. 2º SECRETÁRIO - JAMIL MURAD - PCdoB - Procede à leitura da Ata da sessão anterior, que é considerada aprovada.

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Convido o Sr. Deputado Jamil Murad para, como 1º Secretário “ad hoc”, proceder à leitura da matéria do Expediente.

 

O SR. 1º SECRETÁRIO - JAMIL MURAD - PCdoB - Procede à leitura da matéria do Expediente, publicada separadamente da sessão.

 

* * *

 

-  Passa-se ao

 

PEQUENO EXPEDIENTE

 

* * *

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Tem a palavra o nobre Deputado Roberto Gouveia. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Emídio de Souza. (pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Cesar Callegari. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Alberto Calvo.

 

O SR. ALBERTO CALVO - PSB - Sr. Presidente, nobres Deputados, telespectadores da TV Assembléia, leitores do ‘Diário Oficial’, assomo a esta tribuna simplesmente para um comentário em relação ao assassinato cruel de um jornalista, praticado por traficantes sanguinários, facínoras e que desafiam não só a polícia, mas o País inteiro. Eles desafiam qualquer coisa que se lhes anteponha porque estão seguros da impunidade.

Já estamos cansados de vir a esta tribuna para criticar o que se está fazendo em termos de melhorarmos à segurança do nosso País, em especial, do nosso Estado e de pedir que a polícia seja prestigiada pelos seus mais altos escalões, a fim de que o policial prestigiado, apoiado, possa exercer a sua função com eficiência, coisa que não ocorre, porque ainda continuamos com o Proar, continuamos cerceando o livre desempenho do policial na sua nobre tarefa de garantir à população o direito de ir e vir, até o direito de morar em sua própria casa, porque os bandidos hoje invadem qualquer moradia e continuam impunes.

É necessário que se mude, mas não temos obtido o apoio da imprensa. Quer dizer, agora a imprensa está revoltada, agora a imprensa se sentiu extremamente agredida, escandalizada com essa morte infame perpetrada contra o ilustre jornalista da TV Globo, porque, na realidade, temos visto, quando os soldados são assassinados com crueldade pela bandidagem, determinados animadores de programas de televisão colocarem sempre um senão: “Mas, será que o bandido morto não poderia ter sido preso? Será que o policial não foi cruel, não foi arbitrário?” - e se põe contra o policial.

Só agora a imprensa se revolta, porque atingiu um jornalista ilustre , que não merecia ser trucidado dessa forma no exercício da sua profissão de jornalista, que é muito bonita, muito importante e que é uma das profissões que garante a democracia. Mas é pena que isso só veio depois que também a casa do jornalista foi cruelmente atingida, porque até hoje só vimos criticar a polícia, só vimos colocar sempre uma dúvida na ação da polícia. E vemos, sim, a defesa de bandidos. E vimos, sim, que é muito comum em programas de grande audiência, levarem artistas que estão se amasiando com bandidaços, e defendendo bandidaços, e eles fazem aquela festa, como se fosse uma glória, quando eles deveriam se sentir enojados, com estas atitudes de determinadas artistas famosas, que têm predileção por bandidos. A verdade é essa, porque são loucas para visitar bandidos e para sair com bandido.

Depois desta infâmia, que foi perpetrada contra um dos maiores jornalistas da América do Sul, agora a Globo diz: “alguém que estava no legítimo exercício da profissão, que foi desrespeitado.” Ela tinha que dizer também em relação aos policiais que são assassinados por bandidos. E também não lhes foi permitido o legítimo exercício de suas profissões, que era o de policiar, e tiveram que reagir. E foram para o Proar, e foram escarnecidos, escarmentados e foram, sem dúvida nenhuma, criticados severamente por uma parte daqueles que detém o poder da comunicação.

Espero que isto sirva de lição, Sr. Presidente, Srs. Deputados. Espero que isto sirva de lição, senhores telespectadores. è preciso mudar. Rigor, rigor mesmo, até as últimas conseqüências, ou então não vamos conseguir mais nada. Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Tem a palavra o nobre Deputado Vitor Sapienza. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Reynaldo de Barros. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Jamil Murad.

 

O SR. JAMIL MURAD - PCdoB - Sr. Presidente, senhores deputados, em nome da bancada do PCdoB, em meu nome e no do Deputado Nivaldo Santana, quero me incorporar à homenagem dos 40 anos de funcionamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP. São 40 anos de serviços de alta relevância a favor da ciência, da tecnologia, do desenvolvimento científico, econômico e social de nosso Estado e, portanto, de nosso país.

Nessa homenagem, queria pedir a transcrição do discurso feito sábado à noite, na Sala São Paulo, pelo Dr. Carlos Henrique de Brito Cruz, presidente da FAPESP, que se pronunciou a respeito do tema: “Apoio na busca pelo conhecimento: Fundação cumpre o seu papel na capacitação científica e tecnológica.” E ele iniciou o seu pronunciamento, e o seu artigo na revista especial FAPESP, citando uma opinião de Lord Rutherford, publicada em 1947, no período de criação da eminente Fundação.

“A ciência está destinada a desempenhar um papel cada vez mais preponderante na produção industrial, e as nações que deixarem de entender essa lição hão, inevitavelmente, de ser relegadas à posição de nações escravas, cortadoras de lenha e carregadoras de água para os povos mais esclarecidos.” Lord Rutherford, citado no documento Ciência e Pesquisa, cujo artigo deu base à fundação da FAPESP.

Passo a ler o documento:

 

“EDITORIAL - CARLOS HENRIQUE DE BRITO CRUZ*

Apoio na busca pelo conhecimento

Fundação cumpre seu papel na capacitação científica e tecnológica

 

"A ciência está destinada a desempenhar um papel cada vez mais preponderante na produção industrial. E as nações que deixarem de entender essa lição hão inevitavelmente de ser relevadas à posição de nações escravas: cortadoras de lenha e carregadores de água para os povos mais esclarecidos"

 

Lord Rutherford, citado no documento Ciência e Pesquisa - Contribuição de Homens do Laboratório e da Cátedra à Magna Assembléia Constituinte de São Paulo, que propôs a criação da FAPESP em 1947

 

Conhecimento é hoje, mais que ontem, o elemento fundamental para a geração de desenvolvimento das nações. Apoiar e desenvolver cada vez mais a geração de conhecimento no estado de São Paulo é a missão da FAPESP. Missão que a fundação vem cumprindo há 40 anos, contribuindo para que no estado - e por extensão no país - exista hoje um fator de capacitação científica e tecnológica invejável mesmo para referenciais de nações mais desenvolvidas.

A FAPESP começou a ser criada em 1947, quando um grupo de cientistas de São Paulo levou à Assembléia Constituinte uma proposta para a inclusão na Constituição paulista de um artigo prevendo o apoio à pesquisa científica como uma das importantes missões do Estado. A proposta foi acolhida pelo deputado constituinte Caio Prado Júnior e converteu-se no Artigo 271 da Constituição estadual. A fundação veio a ser instalada em 1962 através de um decreto-lei promulgado pelo governador Carvalho Pinto. Posteriormente, em 1989, a nova Constituição do estado de São Paulo incluiu o mesmo artigo original, aumentando o valor dos recursos a serem repassados anualmente à fundação de 0,5% para 1% da receita tributária paulista.

São Paulo, por meio de sucessivos governos estaduais, vem honrando meticulosamente esse dispositivo constitucional, especialmente a partir de 1982. A constância dos recursos e sua previsibilidade, aliadas à autonomia da fundação, têm permitido que a FAPESP tome iniciativas ousadas como a plêiade de novos programas criados a partir de meados dos anos 90, que marcam um ponto de inflexão em sua história. Ponto de inflexão que só pôde acontecer porque nas décadas anteriores o Estado brasileiro, através da FAPESP, do CNPq e da Capes, investiu fortemente na formação de uma base acadêmica capaz de enfrentar os mais sofisticados desafios científicos e tecnológicos. Some-se a isto o fato de que São Paulo tem sabido reconhecer a importância do investimento na geração de conhecimento desde a década de 30 do século 20, o que pode ser constatado pela criação de três grandes e potentes universidades públicas dedicadas à educação superior e à pesquisa: a Universidade de São Paulo (USP) em 1934, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em 1966 e a Universidade Estadual Paulista (Unesp) em 1976.

Ao lado da estabilidade do apoio estadual e do contato permanente com a comunidade acadêmica paulista e com as demandas e oportunidades existentes no Estado, o outro ingrediente essencial para o sucesso da FAPESP é o sistema de análise e seleção de projetos, baseado na utilização de assessores ad hoc - com a prerrogativa da confidencialidade - para todos os projetos, sem exceções.

Em constante e intenso contato com a comunidade acadêmica paulista e com o Poder Legislativo e Executivo, a FAPESP soube identificar demandas e aproveitar oportunidades. Por meio de programas mobilizadores, a fundação apresentou desafios de alto nível e a comunidade acadêmica paulista soube responder à altura. Assim nasceram programas de alta visibilidade como o Genoma, o premiado BIOTA, ao lado do não menos importante Programa de Pesquisa em Políticas Públicas, que já apoiou mais de 160 projetos estabelecendo parcerias entre a academia e órgãos da administração pública em áreas tão relevantes como saúde pública, ensino público, emprego, segurança, meio ambiente e outras. Ou o Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), através do qual a FAPESP propiciou, até aqui, que mais de 200 pequenas empresas pudessem transformar conhecimento e idéias em produtos, algumas delas com sucesso comercial já consolidado. O Programa de Apoio à Infra-estrutura de Pesquisa investiu mais de US$ 400 milhões na recuperação e no desenvolvimento da capacidade de pesquisa no estado, criando condições de infra-estrutura realmente competitivas.

Na maioria dos casos, o impacto - econômico, social e acadêmico - desses programas tem sido notável. A Parceria para Inovação em Ciência e Tecnologia Aeroespacial (PICTA), por exemplo, foi fator decisivo para que a Embraer - maior exportador brasileiro - optasse por instalar no Estado sua segunda fábrica. A agilidade da FAPESP para criar o PICTA - sempre de acordo com a tradição e a missão institucional da fundação - fez com que as condições oferecidas à empresa por São Paulo superassem em atratividade as ofertas de vários outros estados brasileiros. Os projetos contratados no PICTA vão fazer de São Paulo um centro de geração de conhecimento em áreas da ciência e da tecnologia tão importantes para a aeronáutica e espaço como aerodinâmica ou fluidodinâmica computacional.

Se o desenvolvimento tecnológico ou das aplicações da ciência é importante e gera visibilidade devido ao interesse da mídia, continua sendo fundamental para a FAPESP o apoio à ciência acadêmica, aquela atividade de avanço do conhecimento humano que é insubstituível para o desenvolvimento da ciência e para a formação das novas gerações de cientistas.

Desde meados dos anos 90 a FAPESP aumentou significativamente seu esforço de apoio à pesquisa acadêmica em SP - FAP-Livros, Infra-estrutura, CEPIDs e as várias modalidades de auxílio à pesquisa em todas as áreas do conhecimento. Basta citar como exemplos, programas já tradicionais da fundação, como o de bolsas de mestrado, que teve o número de bolsas aumentado em 372%, de 1994 a 2001, ou o de bolsas de doutorado, que cresceram por 850% no mesmo período.

Neste momento de comemoração, é fundamental lembrar que por mais que a FAPESP seja determinante para o desenvolvimento da pesquisa em São Paulo, a fundação não tem feito isto solitariamente, nem poderia vir a fazê-lo. O apoio à ciência em São Paulo por agências federais como o CNPq, a Capes e a Finep é absolutamente necessário - na verdade, indispensável - e tem sido, ao longo de todas essas décadas, fator decisivo para o desenvolvimento do sistema de ciência e tecnologia paulista. O princípio federativo determina que esse apoio continue, reconhecendo-se inclusive a importância do desenvolvimento científico e tecnológico paulista para o amadurecimento social, econômico e cultural do país.

O desenvolvimento brasileiro não poderá prescindir de um substancial aumento de capacidade na geração de conhecimento na academia e na empresa. A FAPESP está convencida disto, tem realizado com sucesso seus objetivos institucionais e continuará a fazê-lo. Num século que se iniciou sob a égide da importância do saber para o desenvolvimento das nações, é reconfortante saber que a contribuição da fundação tem sido e continuará sendo destacada para que o Estado de São Paulo crie seu futuro com mais justiça social e desenvolvimento.

*Presidente da FAPESP e reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)”

 

Queria prestar homenagem a figuras que foram marcantes na história da FAPESP, segundo a própria revista da Fundação . Foram eles: o Dr. Adriano Marchini, engenheiro e ex-superintendente do IPT; o Dr. Antonio Barros de Ulhôa Cintra, que foi professor da Faculdade de Medicina, Secretário Paulista da Educação, e reitor da USP; o Dr. Jayme Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti, igualmente ex-professor da Faculdade de Medicina da USP;  o  cientista, historiador e membro da Assembléia Legislativa, Deputado Caio Prado Júnior, do Partido Comunista do Brasil, o meu partido (que teve participação decisiva na aprovação do artigo que criou a FAPESP), ele sempre se empenhou para garantir plena autonomia para a futura entidade. E por fim o quinto homenageado especial, o Professor Florestan Fernandes, sociólogo, catedrático da USP, conselheiro da FAPESP, foi Deputado Federal pelo Partido dos Trabalhadores e  propôs, na Constituinte de 1988, a emenda que permite aos Estados vincular parcela dos impostos ao fomento, ao ensino e à pesquisa.

Queria também homenagear neste momento, o Professor Alberto Carvalho da Silva; o Professor Maurício Rocha e Silva, que foi meu professor na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, e outros eminentes cientistas que contribuíram para o êxito dos objetivos da FAPESP. Queria também prestar uma homenagem ao Dr. Carvalho Pinto, ex-governador de São Paulo que, em 1962 logo que tomou posse, tomou as iniciativas para a concretização e  o funcionamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Ela existia  na Constituição desde 1947, mas só foi viabilizada em 1962, portanto, em 2002 ela está fazendo 40 anos. Importantes projetos de pesquisa científica e aplicada foram financiados, patrocinados pela FAPESP, que tinha duas características: autonomia sem ingerência política,  e o financiamento fixo de meio por cento da receita tributária do Estado. Na Constituinte de 1989 este percentual de financiamento público dobrou, passando a ser 1% da receita tributária do Estado

Por isso, Sr. Presidente e senhores deputados, queríamos neste momento dizer que o investimento na ciência e na tecnologia só tem trazido progresso, seja econômico, seja social, para o Estado de São Paulo e para o Brasil. E este investimento tem de crescer, de aumentar. Está aqui a USP, que com todas as suas virtudes está hoje em determinada situação – graças à aplicação da política de Fernando Henrique Cardoso e do governo tucano de São Paulo, que não aumentam os investimentos.

 A USP chega a ter 200 alunos por sala de aula, como na faculdade de Filosofia – que está há 40 dias em greve,  porque os alunos querem professores, para que haja qualidade no ensino e a manutenção do serviço prestado pela USP à nossa sociedade. Por esta e outras razões, o investimento público no ensino superior e na pesquisa têm de crescer proporcionalmente ao crescimento da população de estudantes.

Portanto, aquela coisa de elogiar que está tendo mais vagas, está atendendo mais alunos, com menos professores e menos servidores, é um erro que nos leva ao abismo, nos leva à tragédia. Temos que pegar o exemplo dado pelo povo de São Paulo, que fez o investimento na FAPESP, que fez investimento na USP, que aumentou o financiamento de meio para um por cento da arrecadação. Há que se investir mais na ciência, na tecnologia, na educação, nas questões sociais, no desenvolvimento econômico e social, para termos uma sociedade que contemple o anseio de progresso do povo de São Paulo e do Brasil.

Passo a ler o documento:

 

“EDITORIAL - JOSÉ FERNANDO PEREZ*

FAPESP - A catedral e o bazar

Há 40 anos a Fundação acredita na competência dos pesquisadores

 

Os parâmetros de qualidade tradicionalmente utilizados para avaliar uma agência de fomento à pesquisa são a competência e a credibilidade de seus processos de avaliação, a rapidez do processo de tomada de decisões e de liberação de recursos e, finalmente, os custos operacionais da instituição. Com base nesses critérios, a excelência do desempenho da FAPESP sempre foi reconhecida ao longo de seus 40 anos de existência. O reconhecimento documentado mais expressivo talvez seja o artigo de Daniel Newlon, então diretor do Programa de Economia da National Science Foundation (NSF), que, ao escrever sobre "O estado da arte no financiamento à pesquisa"1 começou por redefinir o título de seu trabalho para "O estado da arte no financiamento à pesquisa está no Brasil". Segundo Newlon, com base nos indicadores tradicionais apontados acima, nenhuma agência de fomento, incluindo a própria NSF, "does a better job than FAPESP".

Nos dias de hoje, porém, o papel a ser desempenhado por uma agência de fomento vai, necessariamente, além dessas formas tradicionais de atuação. Espera-se de uma agência moderna que demonstre capacidade de reconhecer desafios e oportunidades, gerando estímulos e induzindo atividades de pesquisa que respondam a necessidades estratégicas para o avanço do conhecimento, para o desenvolvimento tecnológico e para a formação em grande escala de recursos humanos altamente qualificados que possam atender às demandas do sistema de inovação do país. Da mesma forma, a complexidade e multidisciplinaridade da pesquisa na fronteira do conhecimento passam a exigir das agências uma atividade articuladora de iniciativas que não poderiam ser geradas espontaneamente pelos pesquisadores, individualmente, ou dentro de grupos confinados aos limites institucionais.

Especialmente num país como o Brasil, cujo sistema de pesquisa tem potenciais e carências, é necessário adotar uma atitude mais pró-ativa de atuação, necessariamente conjugada à manutenção do padrão de qualidade atingido. Mas essa forma de atuação requer grande agilidade e flexibilidade. Há necessidade de ousar e de arriscar ser imperfeito para buscar efeitos rápidos.

"A catedral e o bazar" é o título do livro de Raymond e Young² sobre o sistema operacional Linux, construído por hackers da Internet, em um processo caótico só nas aparências. Nessa obra, os autores comparam duas formas de organização. A de catedral, que busca a perfeição absoluta e tem vocação de persistência milenar, obedecendo a planejamentos detalhados. E a do bazar, por outro lado, uma ordem eminentemente vinculada a seu contexto espacial e temporal, que procura responder com eficiência e rapidez às urgências e, por isso mesmo, é imperfeita e sujeita a permanente atualização. Aqui, a perfeição está no processo e não no produto.

Esse talvez tenha sido o grande desafio enfrentado pela FAPESP nos últimos anos: conjugar, de forma tão harmônica quanto possível, sua dimensão catedral e sua face bazar. E a resposta, que marcou a última década de atividades da Fundação, foi o lançamento de uma série de programas que respondem a objetivos estratégicos, visando enfrentar e sanar deficiências flagrantes ou criar oportunidades.

 

A indução conceitual na transferência de conhecimento

Os programas especiais lançados nos anos 90 deveriam estimular conceitualmente pesquisas de natureza específica, sem estipular áreas de conhecimento prioritárias.

A primeira iniciativa nesse sentido foi a criação, em 1990, dos projetos temáticos, voltados para o desenvolvimento de pesquisas multidisciplinares em projetos ambiciosos, de longa duração, que envolvessem equipes mais numerosas com a participação de grupos de excelência. Essa foi a primeira quebra de paradigmas.

A partir de 1994, uma série de outras iniciativas tiveram o objetivo de encorajar a adoção de mecanismos eficientes de transferência de conhecimento do sistema de pesquisa para a sociedade, tanto para o setor público como para o privado. A característica comum entre elas é a preocupação de articular a oferta de pesquisa com a demanda de conhecimento por parte da empresa ou órgão do governo.

Entre essas ações, a pioneira foi o Programa Parceria para a Inovação Tecnológica, o PITE. Pela primeira vez começaram a ser financiadas propostas em que era exigida a participação de empresas que compartilhassem os custos e assumissem os riscos do projeto. O enunciado simples desse conceito visa documentar o real interesse do setor privado na apropriação dos resultados da pesquisa.

A mais inovadora, entretanto, foi o Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas, o PIPE, que, ao financiar projetos voltados para a inovação no ambiente empresarial, rompeu paradigmas vigentes no sistema de pesquisa nacional. O PIPE trata diretamente do principal desafio de política científica e tecnológica do país: a expansão dos limites do sistema de pesquisa para além das fronteiras do ambiente acadêmico ou dos institutos oficiais de pesquisa.

A transferência de conhecimento para setor público foi estimulada por dois programas, o de Pesquisa em Políticas Públicas e o de Ensino Público. Nos dois casos são financiados projetos cujos resultados possam influenciar a formulação de políticas públicas de relevância social. Do parceiro público - órgão de governo, escola pública - é exigido um compromisso com a execução do projeto e com sua implementação.

Finalmente, o financiamento em caráter experimental dos dez Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão, os CEPIDs - que conjugam pesquisa multidisciplinar, transferência de conhecimento para o setor público e privado e atividades educacionais inovadoras - propõe um novo paradigma para a organização da pesquisa, funcionando como um corolário dessas iniciativas.

 

Presença articuladora

A iniciativa em genômica foi, sem dúvida, a que teve a maior repercussão nacional e internacional. O Programa Genoma conjugou excelência científica, busca de solução de problemas socioeconômicos e formação de recursos humanos altamente qualificados em uma área de importância estratégica para o país, o que exigiu da Fundação agilidade, eficiência, capacidade de se alimentar de idéias propostas pelas lideranças acadêmicas do Estado, competência na avaliação, credibilidade com a iniciativa privada e grande articulação com todo o sistema de pesquisa do Estado - universidades, públicas e privadas, institutos de pesquisa. Mais ainda, os projetos Genoma propiciaram à FAPESP buscar parcerias com organismos internacionais, entre eles o Instituto Ludwig de Pesquisas sobre o Câncer e o Ministério da Agricultura dos Estados Unidos.

O indicador final de sucesso do programa é o aparecimento de um promissor sistema de pesquisa e desenvolvimento em Genética Molecular, sinalizado pela criação das empresas de base tecnológica Alellyx e Scylla.

De relevância comparável, o programa BIOTA-FAPESP, ambiciosa iniciativa que está inventariando, mapeando e estudando toda a biodiversidade do estado de São Paulo, também teve origem no diálogo permanente da comunidade científica com a instituição. Não há precedentes internacionais de uma ação concertada entre mais de 400 pesquisadores doutores articulados por esse verdadeiro instituto virtual da biodiversidade, aderindo ao mesmo protocolo de registro de informação e disponibilizando na Internet toda a informação obtida em suas pesquisas. O programa contribui para o avanço do conhecimento sobre uma das biodiversidades mais ricas do planeta e para a definição de políticas públicas relativas à conservação e uso sustentável de nosso patrimônio ecológico. Em 1999, o Biota recebeu o prêmio Henry Ford de Conservação Ambiental na categoria Iniciativa do Ano em Conservação.

 

Escapando à dicotomia:

demanda induzida x espontânea

A criação de cada um desses programas representou novos modelos de atuação e um processo de aprendizagem para todos os atores envolvidos - a comunidade de pesquisadores, as instituições, as empresas, o poder publico e a própria FAPESP.

Finalmente devemos refletir sobre os fatores que têm viabilizado essa trajetória institucional.

Um traço marcante da atuação da FAPESP ao longo de seus 40 anos de atividades é o compromisso inarredável com o processo conhecido como avaliação pelos pares. Segundo essa sistemática, as decisões sobre o financiamento se baseiam em pareceres de assessores ad hoc, especialistas na área de conhecimento específica em que se enquadram os projetos. Muito embora essa mesma sistemática seja adotada pelas mais prestigiosas agências nacionais e internacionais, na FAPESP ela assume características singulares e seu impacto sobre a instituição vai muito além dos processos de avaliação. Isso porque o processo é coordenado por comissões formadas por pesquisadores ativos, lideranças em suas respectivas áreas de atuação, que definem a escolhas dos pareceristas ad hoc e que, de posse desses pareceres, os transformam em recomendações para a decisão.

Essas comissões, ao mesmo tempo em que garantem a qualidade do processo de avaliação pela escolha dos pareceristas e pela análise de seus pareceres, constituem-se em uma interface muito estreita entre a instituição e a comunidade de pesquisa do Estado. A presença forte e contínua dessas lideranças constitui-se, sem dúvida, em fator decisivo para a qualidade da atuação da agência, que procura se manter em permanente sintoma com os anseios e preocupações da comunidade. Trata-se de uma presença inspiradora que distingue a FAPESP entre as instituições congêneres e dá à Fundação uma vantagem competitiva da qual apenas as agências regionais de fomento podem se beneficiar.

A presença desse quadro de assessores, pesquisadores ativos, tem sido responsável não somente pela manutenção do padrão catedral, mas pelo permanente aperfeiçoamento da instituição, pela geração de novos programas, em suma, pela face bazar, que busca sintoma com as expectativas da sociedade que a financia. Nenhum dos programas lançados pela FAPESP teria sido concebido ou implementado sem essa contribuição e todos eles tiveram a decisiva participação dessa equipe - um dos grandes fatores de sucesso da Fundação. Poucas agências de fomento terão tido uma influência tão constante e intensa da comunidade científica, participando em todas as instâncias da ação institucional.

 

1Daniel Newlon, The state of the art and research funding, World Bank Discussion Papers, 325, 1996;

2Eric S. Raymond and Bob Young, The cathedral and the bazaar, Musings on Linux and Open Source by an Accidental Revolutionary, O'Reilly and Associates, 2001.

*Diretor científico da FAPESP”

 

Passo a ler o documento:

 

“OPINIÃO - ALBERTO CARVALHO DA SILVA*

Um longo e árduo processo

A FAPESP surgiu da ação de pesquisadores e políticos que sabiam da importância da ciência

 

As origens da FAPESP e seus primeiros passos diluem-se em uma época bem diferente da atual. Um grupo de pesquisadores liderados por José Reis e Maurício Rocha e Silva havia fundado a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência em defesa das instituições científicas e de condições para se tornarem mais produtivas e livres dos interesses políticos. Os recursos para pesquisa científica eram escassos e, em grande parte, frutos da filantropia das Fundações Guggenheim e Rockefeller e de algumas famílias abastadas e generosas. Os Fundos Universitários de Pesquisa, criados em 1942 pelo reitor da Universidade de São Paulo (USP) Jorge Americano como contribuição ao esforço de guerra, estavam encerrando a atividade pioneira; e a USP ia perdendo as energias de sua criação, 15 anos antes. A carreira universitária resumia-se no professor catedrático vitalício e seus assistentes, por ele nomeados e demissíveis ad nutum, sem perspectivas de carreira, com salários modestos e com reduzida compensação pelo trabalho em tempo integral. CNPq e CAPES, fundados em 1951, traziam a mensagem inovadora com que todos sonhávamos, mas nem de longe reuniam recursos e condições administrativas para oferecer caminhos novos e seguros. Já em 1947, um grupo de pesquisadores e docentes universitários, liderados por João Luiz Meiller e Adriano Marchini, haviam submetido à Assembléia Constituinte do Estado o documento Ciência e Pesquisa que, graças ao trabalho dos deputados Lincoln Feliciano e Caio Prado Júnior, deu origem ao artigo 123 da nova Constituição do Estado.

O artigo 123 estabelecia que o amparo à pesquisa deve ser propiciado por meio de uma fundação à qual se atribuía "anualmente, como renda especial de sua privativa administração, quantia não inferior a meio por cento de sua receita ordinária".

O artigo era claro mas foram necessários 13 anos de discussões e lutas para torná-lo realidade. Dessas lutas participaram, entre outras organizações, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Associação de Auxiliares de Ensino da Universidade de São Paulo.

Os estatutos da Associação foram aprovados em agosto de 1956, em assembléia presidida por mim e secretariada por Fernando Henrique Cardoso e, como pontos cruciais de seu programa, elegeu: a criação de uma carreira universitária aberta; a elevação dos vencimentos dos docentes, com destaque para o tempo integral; e a instituição da Fundação de Amparo à Pesquisa. Como parte da campanha, além de numerosos contatos com SBPC, reitor da USP e membros do Conselho Universitário, a diretoria da Associação procurou várias vezes o governador do estado, Jânio Quadros, solicitando o seu empenho em favor das medidas que estava propondo.

Jânio Quadros era ríspido. Ao assumir o governo, tinha cortado verbas da universidade que, na época, ainda não tinha autonomia.. Ameaçava de punição os professores que reclamavam dessas medidas, como Cruz Costa e Livio Teixeira, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. E nos recebia sempre de mau humor. Ameaçou-nos de punições se déssemos entrevistas e escolheu alguns de nós para formar uma comissão cujo trabalho praticamente ignorou.

Este clima mudou com o governador Carlos Alberto de Carvalho Pinto. Logo no início de seu mandato, o novo governador formou uma comissão integrada por seus secretários Antônio Queiroz Filho, José Bonifácio Coutinho Nogueira, Fauze Carlos, José Vicente Faria Lima e o reitor da Universidade. A comissão, com a tarefa de estudar a Fundação, era secretariada por Hélio Pereira Bicudo e tinha, entre seus assessores, Paulo Emílio Vanzolini.

A comissão trabalhou com excepcional rapidez e ainda em 1959 apresentou o anteprojeto de lei 1.953, que foi encaminhado à Assembléia Legislativa, acompanhado de uma representação de mais de 1.000 pesquisadores e sancionado por Carvalho Pinto como Lei 5.918, em 18 de outubro de 1960.

O passo seguinte foi a organização da estrutura prevista na Lei. Ao Conselho Superior, presidido pelo novo reitor Antonio Barros de Ulhôa Cintra, cabia indicar ao governador os membros do primeiro Conselho Técnico Administrativo, que ficou composto por Jayme Arcoverde Cavalcanti, diretor presidente; Warwick E. Kerr, diretor científico; e Rafael Ribeiro da Silva, diretor administrativo, logo seguido por Celso Antonio Bandeira de Mello.

A esse pequeno grupo, provisoriamente instalado em uma ou duas salas no 4º andar da Faculdade de Medicina, coube a tarefa de definir não apenas o estatuto de nova Fundação mas toda a sua estratégia. Como parte desta tarefa, que foi crucial na vida futura da Fundação, mereceu destaque: a forma do entendimento com os pesquisadores; as normas para apresentação de pedidos; a sua avaliação e decisão baseadas apenas na contribuição para o desenvolvimento da ciência, viabilidade e credenciais do pesquisador; a assessoria em caráter confidencial por assessores de reconhecida competência científica; e, com base na lei, a que instituiu a proibição de que a Fundação assumisse encargos permanentes ou tivesse centros de pesquisa próprios. E logo de início, tornou-se claro que a responsabilidade pelas decisões era do diretor científico, evitando-se os atrasos e outros inconvenientes das decisões a cargo de comissões ou conselhos. Para adoção destas normas foram básicas a objetividade do diretor científico e suas observações em viagem aos Estados Unidos, Canadá e alguns países da Europa, patrocinada pela Fundação Rockfeller; a lucidez e a experiência de Paulo Emílio Vanzolini, apoiadas em sua vida de pesquisador e visitas a instituições do exterior; e o espírito liberal aliado à experiência científica e acadêmica de Ulhôa Cintra e Jayme Cavalcanti.

Essas foram as decisões cruciais que definiram os caminhos que a Fundação deveria seguir, combinando a experiência e os procedimentos de outros centros com uma visão clara da realidade paulista, baseada na experiência de cada uma. Foi esta orientação seguida à risca que mereceu à FAPESP a confiança, o apoio e o respeito de todos os pesquisadores do estado; que lhe facilitou, logo nos primeiros anos, o intercâmbio com organizações nacionais e internacionais; e que lhe permitiu resistir a umas poucas tentativas de interferência durante o regime militar. Igualmente decisiva foi uma escolha cuidadosa dos sucessivos diretores científicos, dando-lhes toda a autoridade. Foi graças a essas condições que já os primeiros diretores, com base em entendimentos com pesquisadores, criaram iniciativas visando promover a pesquisa em temas socialmente prioritários, e que, ainda no fim da década e início da seguinte, o quarto diretor científico, Oscar Sala, desse todo o apoio da Fundação a projetos que hoje são parte integrante de nosso desenvolvimento científico e tecnológico como o Bioq/FAPESP, que promoveu o grande desenvolvimento da Bioquímica no Estado; a rede ANSP, atualmente um componente essencial de nosso sistema de comunicação em ciência e tecnologia; e o projeto Radasp, abrindo os caminhos para o uso atual do radar em meteorologia.

Nos anos seguintes, duas medidas, ambas fruto da luta de seus dirigentes, ampliaram consideravelmente os horizontes da Fundação: a Emenda 34, do deputado Fernando Leça, assegurando a transferência de recursos antes de serem por demais corroídos pela inflação, e a elevação dos recursos para 1% da receita do estado, com transferências mensais. Graças a esta última mudança, à iniciativa e criatividade de seus diretores e ao apoio que vem recebendo da comunidade científica, a FAPESP passou a combinar auxílios individuais a pesquisadores e bolsistas com a abertura de novos programas em áreas cruciais do desenvolvimento científico e tecnológico, contribuindo para maior participação dos pesquisadores acadêmicos no desenvolvimento social e econômico. Na condição de um dos últimos sobreviventes do grupo que lutou pela instalação da Fundação e suas formas de atuar, eu me permito afirmar que os serviços prestados pela FAPESP nos seus 40 anos de vida merecem de longe a prece de todos nós para que ela possa continuar ainda por muitos anos como uma das instituições que alcançaram maior continuidade e sucesso no apoio ao desenvolvimento da ciência e transferência de seus benefícios à sociedade.

* Co-fundador, ex-diretor científico e ex-diretor presidente da FAPESP”

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Tem a palavra o nobre Deputado Pedro Yves. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado José Augusto. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Antônio Salim Curiati. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Newton Brandão. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Paschoal Thomeu. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Nivaldo Santana. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Edson Ferrarini. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado José Zico Prado.

 

O SR. JOSÉ ZICO PRADO - PT - Sr. Presidente, Srs. Deputados, telespectadores da TV Assembléia, estamos indignados, diante das análises que têm sido feitas pelos jornais, principalmente pela “Folha de S.Paulo” e “O Estado de S.Paulo”, com a situação econômica do país, estamos indignados com a violência que a sociedade vive hoje.

Acabamos de assistir, com muita tristeza, o seqüestro e a morte do jornalista Tim Lopes, do Rio de Janeiro, um trabalhador competente, um jornalista que fazia inveja a todos os brasileiros. E parece que toda essa situação que estamos vivendo hoje não tem um responsável.

Por que a nossa sociedade chegou até esse ponto? Qual a situação em que nos encontramos hoje? Se formos fazer uma análise da situação que o país vem vivendo nestes últimos anos, principalmente do Governo Collor para cá, notaremos que os que mais os Governos têm demitido são trabalhadores, pais de família, das periferias dos grandes centros urbanos. É a camada pobre que mais tem sofrido com a política neoliberal implementada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, pelo então Governador Mário Covas e pelo hoje Governador Geraldo Alckmin. Peguemos o exemplo do Governador Geraldo Alckmin aqui em São Paulo, responsável pela entrega da CESP, da CPFL, das estradas, da Eletropaulo e, principalmente, pela péssima situação da escola pública no Estado.

Estamos vendo a periferia de São Paulo cada vez mais abandonada, os nossos jovens sem perspectiva de vida. São eles os mais prejudicados, os que têm morrido e praticado todos esses assaltos e essa barbárie que está acontecendo principalmente na Região Metropolitana de São Paulo e no Rio de Janeiro. Quero fazer junto com os telespectadores uma análise. O que mudou nas nossas escolas hoje?

O Governo, baseado na proposta do Banco Mundial de que o nível de escolaridade no Brasil deva ser de três a quatro anos, enquanto nos outros países, principalmente nos Estados Unidos, é de 10 a 12, resolveu fazer uma distribuição de diplomas aqui no Estado de São Paulo com essa tal progressão continuada, com essa tal política educacional que aprova o aluno independente de sua capacidade, de sua aprendizagem. Isso tem levado à queda da qualidade do ensino público. Por que o Governo Mário Covas implementou essa política no Estado de São Paulo? Por que o Governo Geraldo Alckmin vem mantendo essa política, enchendo as salas de aula com 45, 49, 50 alunos? Não importa se o aluno está preparado ou não para ser aprovado, o que importa é que ele tenha um diploma na mão. Essa situação foi criada porque o Governador acha que no Estado de São Paulo o que falta não é qualidade de ensino, mas diploma. Mas nós sabemos que o que falta são condições para a população usufruir de boas escolas, de emprego.

Vejamos: só na área da Educação, quantos professores foram demitidos com essa política implementada no Estado de São Paulo? Mais de 60 mil professores. Na privatização da Eletropaulo, quantos funcionários foram demitidos? Mais de 10 mil. Quantos funcionários das ferrovias foram demitidos com a privatização? Mais de 15 mil. Quantos funcionários do DER, do Dersa foram demitidos com as concessões das estradas? Se fizermos as contas, só o Governo do Estado mandou mais de 250 mil pais de família para o “olho da rua” com as privatizações e concessões.

Este é o resultado da política que trata da violência. Não estou justificando a violência com o desemprego, mas é o caminho.

Quando um pai de família não tem condições de dar o mínimo para seu filho, ele procura outro caminho nos seus 12, 15, 18, 20 anos. O maior responsável pela violência no Estado de São Paulo é essa política implementada pelo Governo Fernando Henrique e Geraldo Alckmin aqui no Estado de São Paulo. Hoje, só na Região Metropolitana de São Paulo, mais de dois milhões de pais de família estão desempregados. Esta é a maior violência cometida contra as famílias e é isso que devemos combater.

Já tive oportunidade de ler em jornais o Governador dizer que isso é culpa do Governo Fernando Henrique Cardoso. Mas ele também tem de assumir a sua responsabilidade aqui no Estado de São Paulo.

No Brasil nós temos de votar de acordo com o que manda o Sr. George Soros, patrão de Armínio Fraga, presidente do Banco Central. Ele é que está determinando a política que temos de seguir aqui no Brasil, ou seja, a política da continuidade da entrega do nosso patrimônio, a política dos juros altos, a política do investidor, que vem aqui e leva embora tudo o que foi construído com o sangue e o suor do povo brasileiro. Mas a população este ano vai dar uma resposta para esta política neoliberal implementada por Geraldo Alckmin e Fernando Henrique Cardoso.

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Tem a palavra o nobre Deputado Vanderlei Siraque. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Pedro Mori. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Gilberto Nascimento. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Cícero de Freitas. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Rodolfo Costa e Silva. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Donisete Braga.

Esgotada a lista de oradores inscritos para falar no Pequeno Expediente, vamos passar à lista suplementar. Tem a palavra a nobre Deputada Maria Lúcia Prandi. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Wagner Lino.

 

O SR. WAGNER LINO - PT - SEM REVISÃO DO ORADOR - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é com bastante pesar que lemos hoje no “Jornal da Tarde” a descrição do assassinato do Jornalista Tim Lopes. Diz o jornal: “Júri condenou Tim Lopes à morte.” Os traficantes não só seqüestraram, como executaram o jornalista”.

Eu gostaria também de citar, dentro dessa matéria, as palavras da companheira Marta Suplicy, Prefeita de São Paulo, que diz que “qualquer morte é inaceitável, mas quando se trata de um jornalista investigativo e a questão é relacionada a tráfico é mais sério: são as instituições e a democracia que correm riscos. Espero que encontrem os responsáveis."

E também o que foi dito pela Governadora do Rio de Janeiro, do Partido dos Trabalhadores, Benedita da Silva: "Não podemos estabelecer prazos, mas nossa polícia está incansável no combate à violência. Lamentamos profundamente esse crime cruel e bárbaro, mas temos de encarar a situação da violência na cidade do Rio de Janeiro como a situação da violência no Brasil como um todo."

Por que são importantes essas palavras? Concordo com a companheira Governadora Benedita da Silva. A violência no Brasil é uma violência no conjunto do País, com bases estruturais na desagregação moral em que nosso País vive e na crise econômica e social que nós atravessamos. O Deputado José Zico Prado teve oportunidade de mencionar, momentos atrás, a situação grave de desemprego que estamos vivendo.

Por que colocamos essa questão? Não são só dois milhões de trabalhadores desempregados em São Paulo. Há milhões de trabalhadores no setor informal. Há 11 milhões de trabalhadores desempregados em todo o Brasil. Nossa economia cresce 2,2%, ao passo que a cada ano chegam ao mercado de trabalho um milhão e quinhentos mil jovens - nesse ritmo de desenvolvimento o Presidente Fernando Henrique Cardoso apenas é capaz de criar seiscentas ou setecentas mil vagas/ano para os trabalhadores. O resto são os excluídos da possibilidade do trabalho. E grande parte dessas pessoas é a juventude, que vai de certa maneira formar os grandes exércitos do narcotráfico, dos assaltantes de banco, dos pequenos furtos, dos assaltos de domicílio e do seqüestro neste País.

Portanto, ao lado da necessidade de termos uma política que possa reforçar o aparato policial, oferecer um salário mais alto e estrutura melhor para a nossa polícia, unificar os seus comandos, acabar com a corrupção no seio dessa polícia, precisamos também de uma política de investimentos sociais na escola, na reforma agrária, no emprego e no desenvolvimento do nosso País, caso contrário não encontraremos saídas. As saídas não são apenas pelo investimento na polícia. Hoje só se discute a respeito da violência porque a violência, hoje, diferentemente da renda, é socializada: nenhum industrial, nenhum banqueiro que more no Brasil, nenhum grande empresário, seja da cidade ou do campo, pode dizer que está livre, ele e sua família, de serem atingidos por essa violência. Essa violência já era socializada na base, quando morriam - e morrem - milhares de pessoas anônimas, mas que têm família, trabalho, endereço, filhos. Enquanto essa violência não se socializou, as televisões pouco falaram disso.

E digo aqui para a Rede Globo que os meios de comunicação no Brasil têm um papel preponderante e fundamental nessa discussão - que não é apenas em torno dos crimes do dia-a-dia - premente sobre as reformas estruturais que devem ser feitas neste País, para que possamos acabar com as bases da violência. Que reformas temos de proceder para que possamos acabar com essa situação que gera uma cultura de violência em nossa sociedade? A Rede Globo, a Rede Bandeirantes e todas as demais redes de televisão, de rádio e da imprensa escrita deste País têm um papel preponderante.

Vamos discutir profundamente as causas. Por que chegamos a este caos? Que tipo de política econômica e social, também do ponto de vista da segurança, deve ser empreendida para que acabemos efetivamente com as bases da violência neste País, porque as bases mais profundas estão na situação de injustiça que vive o nosso povo, na situação de injustiça com que a sociedade brasileira convive e que a cada momento se agrava.

Passo por fim a ler o comunicado de ontem da TV Globo, assinado pelo diretor da Central Globo de Jornalismo, Sr. Carlos Henrique Schroder:

 

“Que a morte dele sirva de alerta às autoridades

 

Comunicado de ontem da TV Globo, assinado pelo diretor da Central Globo de Jornalismo, Carlos Henrique Schroder:

"É com um profundo sentimento de pesar e, ao mesmo tempo, de revolta e indignação que a TV Globo comunica: a polícia confirmou hoje oficialmente que o repórter Tim Lopes, um de seus jornalistas mais premiados, foi de fato brutalmente assassinado durante a realização de uma reportagem sobre bailes funks nos subúrbios do Rio de Janeiro no domingo, dia 2.

Há três semanas, moradores do bairro da Penha denunciaram a existência de um baile funk com consumo de drogas e sexo explícito na favela de Vila Cruzeiro, promovido por traficantes do morro, para o qual eram aliciadas meninas menores de idade. Os traficantes armavam um parque de diversões próximo à entrada da favela para atrair crianças e, assim, evitar que policiais entrassem atirando no caso de invasão do morro. O fato teria sido denunciado à polícia diversas vezes, sem resultado.

Os moradores disseram a Tim Lopes que temiam pela degradação moral de suas famílias e estavam impotentes diante do poder armado dos traficantes e da falta de ação da polícia. Tim esteve na região quatro vezes, duas sem microcâmeras e duas vezes com o aparelho, a última delas no domingo, dia 2.

Naquele dia, Tim ficou de encontrar-se às 20h com o motorista que o acompanhava e estacionara longe da favela.

Àquela hora, Tim apareceu e disse ao motorista que iria se atrasar porque ainda não considerava encerrado o seu trabalho.

Marcou novo encontro para 22h, mas não mais apareceu. Segunda-feira de manhã, a emissora comunicou o seu desaparecimento às autoridades. No meio da tarde, uma equipe de policiais encontrou, no alto do morro, fragmentos de corpo carbonizado ao lado de pedaços de fita de oito milímetros, de um tipo, no entanto, que não é usado pela emissora. Os restos mortais foram levados ao Instituto Carlos Éboli para identificação e, depois, transferidos para o Laboratório Sonda, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), para realização de exames de DNA, que, no entanto, só ficarão prontos em 15 dias.

Hoje, policiais da 38ª Delegacia de Polícia, de Brás de Pina, prenderam dois suspeitos de terem envolvimento no assassinato de Tim.

Eles relataram, com detalhes, toda a selvageria ocorrida, mas negaram que tenham participado diretamente da ação. Disseram que o traficante Elias Maluco teria executado Tim pessoalmente. A Justiça chegará à verdade.

Tim Lopes, de 51 anos, era um dos jornalistas mais brilhantes de sua geração. Depois de carreira vitoriosa nos jornais O Globo, O Dia e Jornal do Brasil, Tim entrou na TV Globo no dia 1º de março de 1996.

Ele começou como produtor do Fantástico e, quatro meses depois, foi remanejado para a Editoria Rio. Além de trabalhar na Rio, Tim produziu reportagens investigativas para todos os jornais da TV Globo. Pela Editoria Rio, comandou a equipe que fez a série "Feira das Drogas". Com este trabalho, exibido no Jornal Nacional, a equipe da Globo conquistou o primeiro Prêmio Esso de Telejornalismo de 2001. Sua última grande reportagem na Globo foi uma série sobre os maus-tratos que pacientes estavam recebendo em clínicas para recuperação de drogados, um trabalho de meses, durante os quais Tim se internou em diversos estabelecimentos para provar o péssimo tratamento dado às vítimas.

O brutal assassinato de Tim Lopes deixa consternados todos nós, seus companheiros de trabalho, e todos os jornalistas brasileiros e cidadãos de bem desse País. Neste momento, nossos pensamentos vão especialmente para a família de Tim, que tem toda a nossa irrestrita solidariedade e apoio.Tim morreu em pleno exercício da profissão que tanto amava, na defesa de uma população que vive, impotente, sob o terror do tráfico e do crime organizado. O jornalismo investigativo tem prestado um inestimável serviço ao país, com a denúncia contundente de crimes, corrupção, prevaricação de autoridades e serviços malprestados aos cidadãos. Seja usando as técnicas usuais da apuração jornalística ou se valendo de aparatos eletrônicos, como uma microcâmera de vídeo, no caso da Globo, ou microcâmeras fotográficas ou microgravadores, no caso de jornais, revistas e emissoras de rádio, grande parte da imprensa brasileira tem se dedicado a esse trabalho.

Um trabalho que ressalta, talvez, o lado mais nobre do jornalismo:

empenhar-se com tenacidade, mas dentro de limites rígidos que minimizem os riscos, para revelar os lados obscuros de nossa sociedade. O único objetivo é torná-la mais humana e mais justa. Nós temos certeza de que, mesmo diante deste atentado, a imprensa brasileira não abrirá mão do seu papel. Nós, da Globo, continuaremos firmes neste propósito.

Tim era um apaixonado pelo jornalismo investigativo e se orgulhava dos resultados positivos de cada denúncia que fazia. Não permitamos que sua morte tenha sido em vão. Que sirva, ao menos, de alerta para que as autoridades dêem um basta definitivo à violência e à criminalidade. Nós vamos cobrar.”

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Tem a palavra o nobre Deputado Paschoal Thomeu. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Arnaldo Jardim. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Vanderlei Siraque. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Newton Brandão. (Pausa.) Tem a palavra o nobre Deputado Conte Lopes.

 

O SR. CONTE LOPES - PPB - Sr. Presidente, Srs. Deputados, aqueles que nos acompanham através da TV Assembléia, o que está acontecendo em razão da criminalidade e da violência já era de se esperar desde o momento em que criminosos passaram a ter mais valor que o policial e passaram a conceder entrevistas na Rede Globo de Televisão.

Eu mesmo tive oportunidade de participar, numa madrugada, do programa do Serginho Groisman. Chegando lá, deparei-me com dois bandidos que iriam debater comigo, bandidos presos, que saíram da cadeia escoltados, o Afro-X e outro amigo com quem ele canta. Eu não entendi. Se o Afro-X pode sair da cadeia para debater comigo na Rede Globo de Televisão só porque canta rap, então tem de soltar também o que canta tango, o que canta música sertaneja, o pintor, o metalúrgico, e mesmo o policial que cometeu crime.

Eles foram à Rede Globo, e não foram só para dar entrevista, mas para debater, para contrastarem as idéias deles com as minhas, que sou policial - estou como Deputado, mas sou policial. Tudo isso é inversão de valores. Na minha cabeça, como eu aprendi no quartel, o bom policial é o que pega bandido, que corre atrás, que captura, que prende, que troca tiro. E até o que morre recebe honrarias de herói. Aliás, nos últimos dez dias fui a oito enterros de policiais - vejam se é fácil.

Da mesma forma, quando o bandido tiver segurança psicológica de que ser bandido é bom, de que quanto mais violento melhor, acabou tudo. Ora, ele vai se preocupar com Tim Lopes da Globo? Não, ele seqüestra e mata - e vejam com que requintes: o jornalista foi descoberto com a câmera de televisão, informaram ao dono do pedaço - Elias Maluco - que determinou que ele fosse assassinado; recebeu um tiro em cada pé para não poder correr, foi levado à presença do traficante, que o executou a golpes de espada de samurai. Dá para acreditar nisso? Onde, no mundo, acontece uma coisa dessa? Foi julgado, condenado. O problema é que amanhã ou depois, se eu for pego, vou ser julgado e condenado.

É um poder paralelo que se instalou em vários estados e que vem ocorrendo há muito tempo. Mistura-se o bom com o mau policial. Hoje, o policial que é honesto e decente fica com a pulga atrás da orelha: “Eu estou aqui no Proar, um ou dois anos afastado, e aquele que não presta e favorece o traficante, os seqüestradores...?“ Onde estão os dois investigadores da quadrilha do Andinho? Estão num presídio especial da Polícia Civil, e o policial militar, segurança do Andinho, está num presídio especial da Polícia Militar . Para aquele que entra na Polícia e vira bandido, é uma boa, porque se for preso ele terá direito a uma prisão especial Civil ou Militar.

Não se iludam, porque isso que ocorre no Rio ocorre também aqui em São Paulo. Em várias favelas a Polícia não entra. Na zona norte, em alguns locais, quando a viatura é chamada, são colocados sobre a viatura aqueles pontos vermelhos de mira laser, indicando que as viaturas e policiais estão sob a mira dos fuzis dos bandidos e traficantes, e a viatura sai de lá.

E o que há de concreto? Nada. Não se cria nada, não se estimula nada. O policial está cada vez com o salário mais corroído e se ele combater o crime ele é punido. Nos finais de semana ficam um soldado, um delegado de plantão e um tenente, porque a Polícia em São Paulo trabalha das oito às 18 horas. Ela faz o expediente e depois das 18 horas é problema de cada um. É evidente, pois ninguém é estimulado a fazer mais. Qual é o estímulo que existe em ser um policial que comanda tropa na rua? Todos que chegam a coronel normalmente não passaram por batalhões de área ou pelo policiamento. Você tem dois caminhos ao ser declarado oficial: ir para a Assembléia, ao Palácio do Governo, encostar em algum político ou se danar na vida sendo um policial como eu, que até hoje tenho processos. Nunca pedi imunidade, fui julgado como Deputado aqui nesta Casa várias vezes pelas minhas ocorrências na polícia. Então, é melhor entrar no palácio e ficar lá a ser policial, combater o crime e não ganhar nada. Só se ganha processos. Obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Srs. Deputados, a Presidência tem a grata satisfação de anunciar a presença dos Vereadores Miguel Lombardi, José Roberto de Toledo e Dr. Júlio C. Pereira dos Santos, todos Vereadores da Câmara de Limeira e também do Dr. Marco Zaccaria, provedor da Santa Casa e Virgílio Rossi, vice-provedor da Santa Casa, ambos da cidade de Limeira, todos acompanhados pela Deputada Elza Tank.

Presente também o Dr. Vicente Pironti Netto, Secretário Municipal da Saúde da cidade de Limeira. A todos as homenagens do Poder Legislativo (Palmas).

Srs. Deputados, esgotado o tempo destinado ao Pequeno Expediente, vamos passar ao Grande Expediente.

 

* * *

 

-  Passa-se ao

 

GRANDE EXPEDIENTE

 

* * *

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Srs. Deputados, há sobre a mesa requerimento de permuta de tempo entre os nobres Deputados Paschoal Thomeu e Conte Lopes.

Tem a palavra o nobre Deputado Conte Lopes.

 

O SR. CONTE LOPES - PPB - Sr. Presidente, Srs. Deputados, eu estava falando sobre a vantagem de trabalhar em determinados lugares em detrimento de ser um policial de rua. Não que eu esteja contra os policiais que trabalham na Assembléia. Se é vantagem trabalhar na Assembléia, que cada um procure trabalhar na Assembléia, no Palácio, no Tribunal da Justiça. Ficar na rua para quê? Para tomar tiro de bandido? E no dia em que o policial morrer darem uma bandeira para a mulher e para o filho, como presenciei na última quinta-feira. O policial devia ter uns 24 anos, a esposa uns 20 anos, a criança uns quatro, cinco anos.

Na verdade, estamos enfrentando uma realidade. Nós queríamos que o Governo do Estado se interessasse e criasse antídotos contra o crime. Não vamos nos esquecer, quem criou o PCC foi o PSDB. É cria. Hoje eles falam em infanticídio, querendo matar o próprio filho. Na CPI do Crime Organizado, em 1994, mandamos para João Benedito de Azevedo Marques, Secretário de Assuntos Penitenciários do Governo do Estado de São Paulo, o estatuto do PCC que estava sendo criado nas cadeias. Fomos vítimas até de gozação e ironias: “tem até erros de Português”. O Deputado Afanazio Jazadji perguntou ao Secretário se ele queria que o Rui Barbosa escrevesse o estatuto do PCC. Ele se preocupou com os erros de Português e não com o domínio do bandido nas cadeias. Se o bandido toma conta das cadeias ele tem medo de ser preso? Não, ele não tem medo de nada.

Na semana passada recebi no meu gabinete os pais de um filho que se viciou e está preso no Belém. Eram obrigados a, semanalmente, depositar na conta dos bandidos 400 a 500 reais. Os números das contas estão lá no meu gabinete. Entrei em contato com o Dr. Otávio, Juiz Corregedor, com quem não consegui falar na primeira noite. Na segunda noite, quando eu estava no enterro do policial Amaia, no Mausoléu da Polícia Militar, ele me ligou dando um retorno de que iria pelo menos garantir a vida. O que a família faz? Tem que depositar. Pelo celular: “O seu filho está aqui, ou deposita, ou seu filho morre.” Se demorar, o valor aumenta. São os juros. A família tinha que levar o dinheiro para Cachoeirinha, Brasilândia e entregar para os traficantes.

O preso que está na cadeia e tem o poder de fazer isso não está cumprindo pena. Ele está ganhando dinheiro. Ele não quer sair da cadeia. Mulher, ele tem todo final de semana. Ele tem o domínio do presídio e lá ele ganha dinheiro. Se ele for para a rua ele se arrisca a enfrentar uma viatura, tomar um tiro e morrer, ou até morrer em tiroteio com bandidos. Na cadeia está uma maravilha, ele rouba e seqüestra o preso que está preso.

Diretores de presídio não sabem disso? E coordenadores do sistema carcerário, que liberam presos para cometer crime, alguns agentes penitenciários que participam disso? O agente penitenciário que é honesto é afastado, encostado e não é promovido.

Vai de mal a pior. Não vamos nos iludir. O que aconteceu com o Tim Lopes no Rio de Janeiro acontece aqui também. Um policial da Rota, com quem eu trabalhei, foi transferido da Rota para a zona leste de São Paulo. Ele estranhou, porque coordenava um policiamento e, na favela, as viaturas faziam sinais. Ele gravou esse sinal feito pelo policial. O que fez o sargento? Foi ao mesmo lugar e fez o sinal. Vieram os traficantes pagar propina, e ele os prendeu. Os bandidos, no outro dia, foram à casa do sargento e o executaram dentro da sua própria casa. Ou seja, foi assassinado porque estava combatendo o tráfico de drogas, da mesma forma que o Tim Lopes. Só que ele era sargento e não era da Globo, por isso, a repercussão é só para nós, os policiais.

É preciso mudar o quadro triste que está aí, criando uma política de combater o crime, e tentar demonstrar que o crime não compensa, porque aqui compensa. O jornal de hoje mostra ex-PM coordenando seqüestros. Ele seqüestrava em São Paulo e levava para sua chácara. O que mais o PM aprendeu a fazer na vida, assim como eu aprendi, foi enquadrar os outros. Ou você enquadra para o lado do bem ou para o lado do mal. Fechar um carro para dar batida, todo PM faz. Só que, em vez de fazer isso para verificar para ver se a pessoa é bandida, ele aborda para seqüestrar. E ele tem o domínio da situação.

Quando acreditamos que haverá prisão perpétua, prisões rigorosas, não acontece nada. O bandido que seqüestrou e mandou matar o Prefeito de Santo André, Celso Daniel, foi preso por um policial que trabalhou comigo aqui na Assembléia, Dr. Edson Santi, na semana passada em uma favela na Barra Funda. Sabe qual é a função do bandido, o “Monstro”? Coordenador de seqüestros. Vejam aonde chegamos. Ele fica dentro da favela, na Barra Funda, coordenando os seus cativeiros.

Felizmente, o Dr. Edson Santi conseguiu interrogar o “Monstro”, que indicou o cativeiro onde estavam três pessoas; uma criança de 11 anos, um serralheiro - vejam só, um serralheiro; se não der para pagar 200 mil, paga 200 reais -, e um rapaz de São Bernardo, dono de uma agência de automóveis. O indivíduo, com sua quadrilha, seqüestrou, matou o Prefeito, ficou um mês e meio na Bahia e em Pernambuco e voltou. “Vou voltar para a vida do crime. Não vou seqüestrar na Bahia, nem em Pernambuco, vou para São Paulo, lá é o canal.” E vem. E já estava cometendo o mesmo tipo de delito. É a descrença na punição, é acreditar que não vai acontecer nada com ele.

Há 15 dias, venho gritando. O “Pateta” não estava com uma arma, com mais quatro bandidos perigosos, “Tico Branco” e outros, para sair da Penitenciária do Estado? O mesmo “Pateta” que escapou da Castello Branco; houve um resgate, mataram um policial conhecido meu e balearam outro. O mesmo “Pateta” foi preso novamente pelo delegado Edson Santi.

Se todos os delegados fossem como o Dr. Edson Santi, talvez não houvesse mais bandido. Por que não põem o Dr. Edson Santi como Delegado-Geral? É uma boa idéia, porque ele está em toda ocorrência. Quem desvendou o seqüestro de Celso Daniel foi ele. A Polícia Técnica foi ao cativeiro e não achou nada. Ele voltou lá, Deputado Wagner Lino, e achou um documento do Celso Daniel. É questão de ter vontade ou não de trabalhar.

O “Monstro” está aí como uma demonstração de que o crime compensa. Nós conversamos com os policiais e percebemos que eles estão aterrorizados, não sabem o que fazem. Podem falar que ele tem um colete à prova de bala. E daí? Se tomar um tiro na cabeça, ele morre. Fuzil fura colete. Então, não é só o Governo dar um colete; é dar estrutura para o trabalho; é valorizar o homem de rua, que é o policial.

Todo mundo é prestigiado: a banda de música, o Corpo de Bombeiros, a Polícia Florestal. Para o policial de rua, nada. Pelo contrário. Para acabar com a corrupção policial tem um jeito. Quantos policiais corruptos eu mandei embora? Dez, vinte, cinqüenta? Mandei um sargento com 29 anos e seis meses de serviço. Eu vinha com uma viatura da Rota, encontrei uma moto parada perto de um desmanche, desci e fui ver o que estava acontecendo. Cheguei lá, tinha uma mesinha, um sargentão conversando com duas pessoas e um monte de documento em cima da mesa. Logo dei um murro na cabeça e perguntei o que era. Ele disse que não sabia. Eu perguntei, então, quanto lhe tinham dado e ele respondeu que 50 reais. O indivíduo ficou bravo, dizendo que eu não poderia fazer isso, porque ele tinha 29 anos de serviço. Um soldado, Jonas, que trabalhava comigo falou que o sujeito havia colocado alguma coisa embaixo do banco. Chamei cinco testemunhas, levantei o banco da viatura e o dinheiro estava lá. Foi expulso da polícia com 29 anos e meio de serviço.

Quem expulsa o mau policial é o bom. Não sou eu como Deputado; não é o jornalista; não é o promotor público. No caso da Cracolândia, todo mundo deveria ter sido preso em flagrante, porque, tendo um flagrante, tem de prender. Mas não o promotor público. Quem vai realmente pôr ordem é o policial honesto, decente, que acredita na Pátria, na sua família, na integridade, na honra. Têm muitos que acreditam nisso. É esse que prende o mau policial; é esse que expulsa o mau policial. Se eu estou com um Volkswagen e o meu colega está de Ferrari, alguma coisa está errada. Qualquer comandante sabe quem tem dinheiro e quem não tem.

Mas é o contrário, porque, atualmente, o bom é punido. O bom foi punido com o Proar, que não tem nada de psicológico para consertar ninguém. Era justamente para os policiais não combaterem o crime. Misturaram ditadura militar com policiamento. Eu não tenho nada a ver com Castello Branco. Eu entrei na polícia, porque tinha de arrumar um emprego na vida e eu entrei como soldado. Entrei em 1967, época da ditadura. Mas o que tenho a ver com isso? Eu tinha de ter um emprego. Meus parentes eram da polícia e eu entrei.

Quando se fala em reunir a sociedade, para analisar a melhor polícia, a sua forma de agir, eu até aceito. Mas do jeito que está, tanto faz São Paulo como Rio de Janeiro, vai de mal a pior. E o pior de tudo é que os policiais estão com medo. É só passar em frente ao Batalhão da Rota. Se tem uma viatura da Rota estacionada 24 horas em frente ao quartel para que ele não seja atacado, a partir disso, o que podemos fazer na nossa casa? A Rota tem informação, tem policiais que se infiltram. Se eles têm medo de uma invasão ao quartel da Rota, que dirá um cidadão de bem, uma dona de casa?

Se os bandidos executam o jornalista da Rede Globo de televisão, que dirá as pessoas comuns? Pedir socorro para quem? Aonde vamos pedir socorro? Não tem jeito. Ou voltamos a reestruturar a coisa e damos condição para a polícia trabalhar ou não sei o que pode acontecer.

Fazer blitz em São Paulo? São Paulo tem cinco milhões de carros. Se parar uma avenida perto da 23 de Maio, São Paulo inteira fica parada. Eu moro na Zona Norte. Fizeram uma blitz em cima da ponte do Rio Tietê e ninguém andava. E ninguém pára ninguém, ninguém olha para ninguém. De vez em quando, param um carro para dizer que estão parando.

Em 1974, paramos de fazer blitz em São Paulo. Há 30 anos percebemos que atrapalhava o trânsito e não pegava ninguém, porque a pessoa não vai ficar esperando numa blitz. Quem é o idiota que está com um seqüestro, com um quilo de cocaína e vai ficar esperando chegar a vez dele na blitz? Ele dá uma ré e vai embora, ou larga o carro e vai embora a pé. Ora, desde aquela época, não funcionava.

Tudo isto é triste, mas, como no Rio de Janeiro e aqui em São Paulo, os traficantes estão mandando. E o pior de tudo: agora, eles acham que são fortes mesmo, porque têm o poder, a ponto de aqui, em São Paulo, ameaçar de morte a filha do Governador, ameaçar juízes, promotores e jornalistas pelo PCC. E lá já começaram a executar.

Muito obrigado, Sr. Presidente, Srs. Deputados.

 

O SR. WAGNER LINO - PT - Sr. Presidente, havendo acordo entre as lideranças presentes em plenário, solicito o levantamento da presente sessão.

 

O SR. PRESIDENTE - ROBERTO MORAIS - PPS - Srs. Deputados, havendo acordo entre as lideranças presentes em plenário, esta Presidência, antes de levantar a sessão, convoca V.Exas. para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental, informando que a Ordem do Dia será a mesma da 79ª Sessão Ordinária.

Está levantada a sessão.

 

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- Levanta-se a sessão às 15 horas e 31 minutos.

 

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