DECRETO N. 27, DE 12 DE MARÇO DE 1890

Reforma a Escola Normal e converte em Escolas Modelos as Escolas annexas


O Governador do Estado de S. Paulo :
No exercicio da attribuição conferida pelo art. 2.º § 2.º  do decreto do Governo Fedral sob n. 7 de 20 de Novembro de de 1890 :
Considerando que a instrucção bem dirigida é o mais forte e efficaz elemento do progresso e que ao governo incumbe o rigoroso dever de promover o seu desenvolvimento ;
Considerando que de todos os factores da instrucção popular o mais vital, poderoso e indispensavel é a instrucção primaria largamente diffundida e convenientemente ensinada ;
Considerando que, sem professores bem preprados, praticamente instruidos nos modernos processos pedagogicos e com cabedal scientifico adequado ás necessidades da vida actual, o ensino não póde ser regenerador e efficaz ;
Considerando mais que a Escola Normal do Estado não satisfaz as exigencias do tirocinio magistral a que se destina, por insufficiencia do seu alumnos:
Decreta :

TITULO I

DA ESCOLA NORMAL

Artigo 1.º    O ensino da Escola Normal, instituida para preparar professores publicos primarios, comprehenderá as materias seguintes :
Lingua portugueza (leitura, exercicíos de composição, declamação e grammatica) ;
Arithmetica, algebra e geometria e escripturação mercantil ;
Physica e chimica ;
Geographia e cosmographia;
Historia do Brazil, com especialidade a de S. Paulo ;
Educação cívica ;
Noções de econonia política, com especialidade da rural ;
Organização e direcção das escolas ;
Biologia ;
Calligraphia e desenho ;
Gymnastica ;
Exercidos militares e escolares ;
Musica.
Artigo 2.º  O ensino da Escola Normal será gratuito e destinado a am­bos os sexos.
Artigo 3.º  O curso normal será de tres annos e o ensino distribuido pelas seguintes cadeiras :
Duas de lingua portugueza ;
Duas de arithmetica, algebra e geometria e escripturação mercantil ;
Duas de geographia, cosmographia e historia do Brazil;
Uma de physica e chimica ;
Uma de economia politica e educação cívica ;
Uma de organisação e direcção das escolas ;
Uma de biologia.
Artigo 4.º  Alem das cadeiras mencionadas no artigo antecedente, o en­sino normal será distribuido pelas aulas seguintes :
Calligraphia, desenho e economia e prendas domesticas, para o sexo feminino :
Calligraphia e desenho, para o sexo masculino ;
Gymnastica e exercícios escolares para o sexo feminino ;
Gymnastica e exercícios mililares para o sexo masculino ;
Musica, solfejo e canto coral, para o sexo feminino ;
Musica, solfejo e canto coral, para o aexo masculino ;
Trabalhos manuaes.
Artigo 5.º  As aulas mencionadas no artigo anterior serão regidas por professores e profesoras, nacionaes ou estrangeiros, contractados pelo go­vernador, mediante proposta do Director da  Escola.
Artigo 6.º  O ensino das mencionadas cadeiras e aulas será distribuido do modo seguinte:

Primeiro anno

Portugues.
Arithmetica.
Geographía e cosmographia.
Exercicios militares.
Calligraphia e desenho.

Segundo anno
 
Portuguez.
Algebra e escripturação mercantil.
Geometria.
Physica e chimica.
Gymnastica.
Musica.
Desenho.

Terceiro anno

Historia do Brazil.
Biologia.
Educação civica e economia politica.
Organização das escolas e sua direcção.
Exercicios praticos.
§ unico.  No curso para o sexo feminino : no 1.° anno accrescerá—prendas e exercicios escolares, em substituição dos militares ;—no 2.° anno acrescerá—economia domestica e prendas, e será dispensado o estudo de algebra e escripturação mercantil.
Artigo 7.º  O programma do ensino será organizado pelo Director da Escola, com audiencia do Director da instrucção Publica—quanto ao das escolas modelos, e approvado pelo Governador. Esse programma sera rigo­rosamente observado.
§ 1.º  O curso para o sexo feminino funccionará separadamente e po­derá ter um programma mais restricto.
§ 2.º  No programma de ensino serão especialisados exercicios de gym­nastica para cada sexo
Artigo 8.º  Para ser admittido á matricula no 1.° anno da Escola Nor­mal, provará o pretendente perante o Director :
1.° Ser maior de 15 annos de edade, si fôr mulher e de 17 annos, si fôr homem.
2.° Ter sido approvado em rudimentos de portuguez, francez, arithmetica, geographia e calligraphia, em exames prestados na Escola Normal, nos lyceus de instrucção publica que se crearem no Estado, ou nos cursos su­periores da Republica.
Artigo 9.º  Os exames feitos em outro estabelecimento de ensino não serão acceitos para substituir os do curso da Escola Normal.
Artigo 10. Só serão admittidos a exame vago das materias do curso da Escola Normal, com o fim de obterem carta de normalista os professores nacionaes ou estrangeiros, que, por habilitações especiaes, conseguirem do Governo essa permissão, mediante pruposta do Director da Escola, depois de terem exbibido documentos irrecusaveis de sua proficiencia, moralidade e exercicio proveitoso da profissão.
§ unico.  O exame será prestado em cada uma das materias constituti­vas do curso.
Artigo 11.  O pessoal da Escola constará do seguinte :
1  Director ;
10  Professores (art. 3.°) ;
6  Ditos contractados (art. 4.°) ;
1  Professor director da escola modelo annexa do sexo masculino ;
1  Professora Directora da escola modelo annexa do sexo feminino ;
1  Preparador de physica e chimica ;
1  Secretario ;
1  Bibliotecario e archivista ;
2  Porteiros ;
2  Contínuos ;
Artigo 12.  A cargo do preparador de physica e chimica ficarão o labo­ratório e respectivos gabinetes.
Artigo 13.  Ao professor da—organização e direcção das escolas—in­cumbirá a guarda e fiscalização do muzeu pedagogico, sendo-lhe arbitrada uma gratificação por esse trabalho.
Artigo 14.  O cargo de director será de nomeação do Governo e poderá ser um dos professores da Escola. Em seus impedimentos será substituído pelo professor vitalicio mais antigo, como vice director.
Artigo 15.  Os logares de secretario e de bibliothecario-archivista serão exercidos por professores da escola, designados pelo governador.
Artigo 16.  O primeiro provimento das cadeiras, creadas por este decreto, será feito por livre nomeação do governador, independente de con­curso.
§ unico.  As vagas serão preenchidas mediante concurso, no qual o julgamento será por votação nominal, especificando-se os motivos de prefe­rencia na classificação dos candidatos.
Artigo 17.  Os professores contractados (art. 5.°), só depois de 5 annos de exercicio, poderão ser nomeados effectivos, mediante proposta do director
§ unico.  Para a aposentadoria será o tempo do contracto computado com o da effectividade.
Artigo 18.  A substituição temporária dos professores, por tempo que não exceda a 30 dias, será feita por outros professores da Escola, designados pelo director, que, para isso, attenderá ao relacionamento das materias, si a substituição for por mais tempo, a nomeação do substituto será feita pelo governador, mediante proposta do director.
Artigo 19.  Os funccionarios das escolas Normal e Modelo terão os vencimentos seguintes :




TITULO II
 
DAS ESCOLAS-MODELO

Artigo 20.  Annexas á Escola Normal funccionarão duas éscolas-modelo uma para cada sexo, para nellas praticarem na regencia das cadeiras os alumnos do 3.° anno daquella Escola.
Artigo 21.  Cada uma das escolas-modelo será dividida em tres secções correspondentes ao ensino dos tres seguintes gráos :

1.º gráo

- Lições de cousas com observação espontanea.
- Instrucção civica.
- Leitura; ensino proporcionado ao desenvolvimento das faculdades do alumno a ponto de ler correctamente, prestando o professor attenção á pro­sodia.
Exercicios de analyse sobre pequenos trechos lidos, de modo a poder o alumno comprehender e ficar conhecendo a construcção de phrases e sen­tenças, sem decorar regras grammaticaes.
- Escripta graduada até á applicação das regras da orthographia.
- Arithmetica elementar, incluindo as quatro operações fundamentaes, fracções ordinarias e decimaes, regra de tres simples com exercícios praticos, problemas graduados de uso commum.
- Ensino pratico do systema legal de pesos e medidas.
- Desenho de mão livre.
- Exercícios de redacção de cartas, facturas e contas commerciaes.
- Noções de geographia geral e de geographia physica, concernente aos phenomenos da evaporação, formação das nuvens, das chuvas, dos ventos, das serras e montanhas e de sua influencia na formação dos rios, guiando os alumnos ao conhecimento do mappa do Estado.
- Gymnastica, comprehendendo marchas escolares e exercicios militares.
- Canto coral.
- Trabalhos manuaes— (Construcções, trabalhos a colla, papel dobrado, recortes, trabalhos em papelão,  em cordes, em vime.
 
2.° Gráo
 
- Continuação de lições de cousas.
- Leitura de auctores nacionaes com mais apurada observação da prosodia e manejo dos diccionarios.
- Escripta, com attenção ás regras da orthographia e execicíos calligraphicos.
- Continuação do estudo de arithmetica, comprehendendo regras de tres composta, regras de juros simples e composta, formação e extracção de raízes, reducção ã unidade, divisão em partes proporcionais, inclusive as regras de sociedade e mistura media com problemas de applicaçao á vida commum, regras sobre conversão de moedas e sobre cambio.
- Grammatica elementar da lingua nacional ensinada em exercicios pra­ticos e analyse de prosadores e poetas modernos.
- Continuação do estudo da geographia physica, com explicação da for­mação das montanhas, vulcões, rios, mares, ilhas  e  continentes,  especial­mente o estudo das bacias do Amazonas e do Prata, sob o ponlo de  vista, commercial ;—conhecimento do mappa do Brazil.
- Algebra até equações e problemas do primeiro gráo e geometria plana.
- Desenho linear, incluindo elementos de projecção geometrica e dese­nho topographico elementar;
- Exercicíos de composição :
- Trabalhos manuaes : Recórte de papel e papelão, modelação, traba­lhos em páo, em ferro, combinação de ambos.
 
3.° Gráo

- Leituras de autores classicos nacionaes, em analyse para o conheci­mento da syntaxe.
- Grammatica da lingua nacional.
- Língua franceza,
- Continuação do estudo de algebra até equações do 2.° gráo, com problemas e continuação do estudo de geometria,
- Desenho com applicação ás artes.
- Geographia physica e descriptiva, com maior desenvolvimento, quanto ao Brazil, no tocante ás suas relações industriaes e commerciaes com outros paizes.
- Noções elementares e praticas de historia natural.
- Cosmographia.
- Historia do Brazil, especialmente a de S. Paulo.
- Exercicio de declamação e estylo.
- Trabalhos manuaes (Uma arte) 

Artigo 22.  Ao programma da escola modelo para o sexo feminino accrescerá :— no 1.° gráo :—costura simples ; —no 2.° gráo ;— costura, crochet, córte sobre moldes, lavores mais communs e economia domestica ;—no 3.° gráo :—costura, corte e levantamento de moldes e trabalhos diversos de agulha, bordados uteis e economia domestica.
Artigo 23.  As lições deverão ser mais empiricas do que theoricas, e professor se esforçará por transmittir a seus discipulos noções claras e exa­ctas, provocando o desenvolvimento gradual de suas faculdades.
Artigo 24.  Nas escolas modelo serão admittidos á matricula alumnos de 7 a 10 annos de idade para o 1.° gráo; de 10 a 14 para o 2.° gráo; e de 14 a 17 para o 3.° gráo.
Artigo 25.  Não excederá a vinte e cinco em cada gráo ou secção o numero dos alumnos matriculados nas escolas modelo.
Artigo 26.  As primeiras nomeações para as cadeiras das escolas mode­lo serão feitas livremente pelo Governador ; as vagas serão preenchidas mediante concurso, com programma organisado pela congregação da Escola Normal.
Artigo 27.  Os alumnos do 3.° anno da Escola Normal exercerão a pratica do professorado nas escolas modelo, na ordem em que forem designados pelo director e sob a inspecção dos professores directores, aos quaes com­pete a distribuição desse serviço e sua melhor applicação.
Artigo 28.  Os alumnos mestres obedecerão ás determinações dos pro­fessores directores na execução do ensino pratico.
Artigo 29.  A falta de frequencia e disciplina nas escolas modelo importará para os alumnos mestres as mesmas penas estabelecidas pelo Regu­lamento para a falta de frequencia  e de  disciplina nas  aulas da Escola Normal.
Artigo 30.  Os trabalhos manuaes serão executados pelos alumnos das escolas modelo sob a direcção dos mestres, mediante gratificações conven­cionadas. A escolha de taes mestres póde recahir em alumnos da Escola Normal.

TITULO III

DISPOSIÇÕES DIVERSAS

Artigo 31.  Os actuaes professores de desenho da Escola Normal, embora classificados por este decreto entre os professores  contractados, fica­rão já no  goso da  effectividade dos cargos,  independente do decurso do praso de cinco annos ( art. 17), por terem sido nomeados  mediante con­curso.
Artigo 32.  Os actuaes professores das escolas annexas á Normal  terão preferencia para regerem outras cadeiras do município da Capital,  quando vagarem.
Artigo 33.  Os alumnos da Escola Normal approvados em exame do 1.° anno, poderão matricular-se no 2.° anno, mas antes do exame final do 2.° anno, prestarão exames das materias que, por este decreto, accrescem ao primeiro anno.
Artigo 34.  Os alumnos approvados em exame do 2.° anno da Escola,  poderão matricular-se no 3.° anno, mas, antes do exame final desse anno, deverão prestar exame de geographia e cosmographia, chimica, desenho e Calligraphia.
§ unico.  A esses alumnos será dispensada diariamente uma hora de trabalho pratico na escola modelo, afim de frequentarem alternadamente as aulas das materias acima referidas.
Artigo 35.  O Director da Escola Normal, de accordo com a Congregação, organisará o novo Regulamento, consolidando as disposições deste decreto e da Legislação e Regulamentos anteriores, não revogadas por esta Lei. O projecto de Regulamento será submettido á approvação do Gover­nador.
§ unico.  O Director da Escola Normal organisará o regimento interno dessa Escola e das escolas annexas e o submetterá á approvação da Con­gregação.
Artigo 36.  As aulas das Escolas Normal e modelo serão abertas a 15 de Março e encerradas a 14 de Novembro.
Artigo 37.  Serão feriados, além dos domingos : 1.° Os de festa nacio­nal, como taes considerados pelo decreto de 14 de Janeiro de 1890; 2.° os do carnaval ; 3.° a quinta, sexta, e sabado da semana santa.
Artigo 38.  Ficam revogadas as disposições em contrario. 

O secretario do governo o faça publicar.
Palacio do Governo do Estado de S. Paulo, em 12 de Março de 1890.
 
Prudente J. de Moraes Barros