Opinião - Inabilidade e desorganização


08/11/2018 11:08 | Atividade parlamentar | Márcia Lia

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As inconsistências sobre temas centrais como economia, meio ambiente e política externa mostradas nesses primeiros dias pela equipe de transição e do presidente eleito deixaram óbvias " agora sem o calor das urnas " a falta de conhecimento do Brasil, de habilidade política e de organização estratégica. Esses primeiros sintomas causam preocupação ainda maior, porque consolidam o discurso genérico de combate aos problemas brasileiros visto durante as eleições.

Nomes e medidas são anunciados e depois retirados (vide General Heleno, anunciado como ministro da Defesa e agora rebaixado ao Gabinete de Segurança Institucional, e a fusão dos ministérios da Agricultura com o do Meio Ambiente. Popularmente falando, estão batendo cabeça e revelando-se despreparados para governar o país. E muito grave: estão fazendo restrições à imprensa e renovando ameaças a oposicionistas. Se recusam a ouvir críticas. 

A saber: nas interligadas economia e relações exteriores, o presidente eleito já acossou o maior parceiro comercial do Brasil, a China, disse que o Mercosul não é prioridade e abalou o mundo árabe ao "anunciar" que mudaria a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém (seríamos o segundo país, além dos Estados Unidos, de Trump). O Egito retaliou, embora não oficialmente, cancelando a visita do chanceler de Temer, Aloysio Nunes, e de uma comitiva de empresários brasileiros nesta semana. 

As relações comerciais com o Oriente Médio representaram 4% das exportações totais brasileiras em 2018. Com a China, cerca de R$ 50 bilhões em trocas comerciais, e com o Mercosul nossas exportações totalizaram US$ 21,037 bilhões entre janeiro e novembro de 2017. 

Nos ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente, em que há interesses das gigantes produtoras de veneno agrícola e de grandes latifundiários de colocar a mão em terras protegidas, a anunciada fusão pode não se concretizar, mas o risco é sempre iminente porque a agenda do presidente eleito caminha nesse sentido. De uma forma ou de outra, a agenda em curso pretende enfraquecer a defesa do meio ambiente, com Amazônia e com tudo, justamente como vem fazendo Michel Temer.

O Ministério do Trabalho também será extinto, com suas funções esquartejadas em vários setores e fragilizando ainda mais a defesa dos trabalhadores. Depois da reforma trabalhista de Temer, a intenção é desarticular ainda mais a classe trabalhadora e evitar uma reaglutinação em torno de sindicatos e centrais, algo que se mostra muito provável num futuro próximo. A conta é simples: sem direitos não será necessário o ministério. Educação, Esportes e Cultura também podem ser aglutinados, relegando dois fortes instrumentos de combate às desigualdades a meras repartições.

Nesse cenário adverso para a democracia e para a classe trabalhadora, o papel da oposição será central. O contraponto à entrega do que nos é mais precioso " os direitos dos trabalhadores e da nossa soberania " precisará ser efetivo na mensagem à população e na articulação política. A frente ampla de resistência só será possível se todos os partidos de oposição entenderem seu papel histórico para enfrentar a grave situação que se desenha, não somente pela oposição, mas pelos próprios membros do futuro governo do Brasil.  

Márcia Lia é deputada pelo PT


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