Comisssão de Serviços e Obras promoveu debates sobre política habitacional

Retrospectiva 2004
20/01/2005 19:02

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DA REDAÇÃO

O déficit habitacional, moradias inadequadas, a situação dos mutuários, conjuntos habitacionais malcuidados, falta de acompanhamento social nos condomínios, bem como outros assuntos congêneres levaram a Comissão de Serviços e Obras Públicas da Assembléia Legislativa, presidida pelo deputado Simão Pedro (PT), a realizar audiência pública, no 2º semestre de 2004, para debater com a sociedade esses temas.

Na audiência, ocorrida em setembro, o então secretário de Estado da Habitação, Mauro Bragato, compareceu para debater a Política de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado. Bragato reconheceu as deficiências do sistema habitacional no Estado e afirmou que dúvidas sobre a questão habitacional são freqüentes, "mas há vontade política para que a questão da habitação seja transparente; temos uma política habitacional que atende, principalmente, as pessoas que recebem de um a três salários mínimos". De acordo com o governo, 75% das moradias construídas contemplam essa faixa da população.

Os números da Habitação

Na ocasião, Bragato informou que em todo o Estado foram entregues oito milhões de residências, compreendendo todos os 12 projetos do Programa Pró-Lar. A questão referente à destinação de 1% do ICMS para o setor habitacional permeou quase todo o debate. O secretário informou que essa porcentagem não é "bruta". Segundo Bragato, técnicos da Secretaria da Fazenda podem esclarecer as dúvidas dos parlamentares sobre o valor real destinado à habitação. "Temos que descontar a cota-parte do Estado e do Município e o repasse para outras secretarias de Estado, como a da Saúde."

Os números sobre o déficit habitacional divergem entre os institutos de pesquisa que tratam do tema. "De acordo com a Fundação Seade, o déficit em todo Estado é de 746 mil unidades. Já o Instituto de Administração do Estado declara que esse índice atinge 850 mil unidades habitacionais".

Conforme o próprio secretário, a carência habitacional no Estado é de quase três milhões de imóveis. Estima-se que mais de um milhão de famílias não tenham moradia.

Reivindicações

Parlamentares da oposição aproveitaram a reunião para reivindicar a regulamentação de algumas matérias importantes para o setor, como a Lei 10.535/2000, que trata da compra de terras para a construção de habitações populares, e o Projeto de Lei 9.142/1995, do ex-deputado estadual Roberto Gouveia, que trata da destinação de recursos habitacionais para entidades populares, o uso total dos recursos orçamentários para a habitação, a transparência e o acesso às informações sobre os programas em andamento e a criação do Conselho e Fundo Estadual da Habitação.

Diferenças políticas

O evento também foi marcado por embates políticos. O deputado Edson Aparecido (PSDB) afirmou que os programas habitacionais só não beneficiam mais pessoas por responsabilidade dos governos municipal e federal. Segundo ele, os acordos firmados entre algumas prefeituras e o Estado não foram cumpridos - declaração refutada pelos deputados Maria Lúcia Prandi, Sebastião Almeida, Sebastião Arcanjo e Mário Reali, todos da bancada do PT, que afirmaram que o parlamentar desconhece os projetos do governo federal para o setor. Sendo responsabilidade do governo estadual, municipal ou federal, o fato é que o déficit habitacional é maior na Capital, na Grande São Paulo e na Baixada Santista.

Empresas e entidades marcaram presença

Após o pronunciamento dos deputados, foi aberto espaço para a manifestação de representantes da construção civil e de entidades, que apresentaram suas questões. José Carlos Molina, do Sindicato da Construção Civil (Sinduscon), lembrou a gravidade do problema habitacional em São Paulo. "Há 2.910 moradias inadequadas, 740 mil famílias sem habitação, ou seja, 3 milhões de pessoas moram mal e 10 milhões sequer possuem uma casa".Molina questionou o repasse de 1% da arrecadação do ICMS para a CDHU.

Representando o Fórum dos Moradores Sem Teto, Verônica Kroll disse que os programas habitacionais andam mal. "Muitas favelas estão em áreas de risco ou de despejo e permanecem nos locais".Kroll cobrou também o término do condomínio do Brás, a criação de um sistema unificado para os cortiços, contas de água separadas nos conjuntos habitacionais e o atendimento a pessoas com renda inferior a 800 reais.

Ao final, Bragato esclareceu que a CDHU negocia caso a caso as dívidas e tem se preocupado em reduzir a alta taxa de inadimplência, que atinge 30% dos mutuários. "Não podemos permitir que os mutuários deixem de pagar valores razoáveis como os cobrados pela companhia".Quanto à água, a cobrança já é individualizada nos novos condomínios. O secretário disse que o Estado tem procurado investir cada vez mais em habitação (em 2004 foram mais de 8 milhões). Já o programa de cortiços prevê 14 mil reais de subsídios para as famílias e, portanto, não utiliza o método de sorteio. Bragato lembrou que a integração entre Estado e Prefeitura é fundamental para o setor habitacional. Participaram da reunião, além do presidente da Comissão, Simão Pedro, os deputados Sebastião Almeida, Sebastião Arcanjo, Maria Lúcia Prandi, Mário Reali (todos do PT), Said Mourad (PFL), Paulo Sérgio (Prona), Edson Aparecido (PSDB) e Nivaldo Santana (PC do B), representantes do setor imobiliário - Sindusco e Secovi - e de movimentos habitacionais, como o Fórum dos Cortiços.



Denúncia trabalhista

Outro tema que levou à realização de audiência pública foi a divulgação de eventuais irregularidades trabalhistas cometidas pela concessionária de energia elétrica Duke Energy Paranapanema. Convocada pelas comissões de Serviços e Obras Públicas e de Relações do Trabalho, a reunião contou com a presença de Mickey Peters, presidente da concessionária, que procurou defender a empresa (que opera oito usinas hidrelétricas) das acusações feitas pelo Sindicato dos Trabalhadores Energéticos do Estado de São Paulo (Sinergia). A entidade sindical havia entregado ao deputado Sebastião Arcanjo (PT) um dossiê que apontava irregularidades na condução da empresa, entre elas, a demissão de funcionários, seguida de contratação de mão-de-obra terceirizada e sem qualificação.

O dossiê

Dirigida por Hamilton Pereira (PT), presidente da Comissão de Relações do Trabalho, e por Simão Pedro (PT), presidente da Comissão de Serviços e Obras Públicas, a audiência começou com o depoimento de Wilson Marques, vice-presidente do Sinergia, que resumiu as acusações do sindicato constantes do dossiê entregue à CRT e à Delegacia Regional do Trabalho de Marília.

"A Duke começou a operar em 1999. Em julho de 2000, 84 trabalhadores já haviam sido afastados", informou Marques, que também relatou a falta de pagamento do adicional de periculosidade, de horas extras - já que a jornada ordinária da categoria é de seis horas e os empregados da Duke trabalham oito - e da manutenção de turnos de trabalho em que um único funcionário cuida dos equipamentos durante o horário noturno. "Em caso de acidente não há quem possa prestar socorro", informou.

Marques também criticou o termo de confidencialidade ao qual os funcionários da Duke são obrigados a aderir. "O instrumento vai além da prerrogativa de sigilo profissional, inibindo a participação sindical com a ameaça de demissão imediata e multa de 50 mil reais".

Em sua exposição, o auditor fiscal do Trabalho, Joaquim Gomes Pereira, destacou a inspeção feita na usina de Chavantes, no início do mês. "As irregularidades constantes do dossiê são procedentes. Algumas delas se embasam na legislação vigente. Outras somente serão obrigatórias a partir da edição de uma nova instrução normativa do Ministério do Trabalho e Emprego, que, embora já discutida, ainda não foi homologada".

Quanto à terceirização de mão-de-obra, o auditor afirmou não haver impedimento legal, desde que não interfira na atividade-fim da empresa. "A exploração do fornecimento de energia foi objeto de licitação e, por conseguinte, é indelegável", afirmou.

Modernização necessária

Mickey Peters, com auxílio de um intérprete, ponderou que apesar de contar com apenas cinco anos de atuação no Brasil, a Duke Energy tem mais de um século de experiência, o que se traduz na baixa ocorrência de acidentes de trabalho. "Estamos comemorando cinco milhões de horas sem afastamentos por acidente", pontuou, pedindo licença aos deputados para que o diretor de operações César Teodoro prosseguisse na explanação, por conhecer melhor o assunto.

Por sua vez, o diretor escusou a empresa do enxugamento no quadro de funcionários, já que esta postura seria decorrente da imprescindível modernização dos equipamentos, única forma de manter a qualidade e a segurança na prestação dos serviços. Indagado por Sebastião Arcanjo (PT), Teodoro informou que a contagem de horas sem acidentes não leva em consideração os empregados de empresas terceirizadas.

Os transformadores que utilizam como isolante o ascarel, óleo resultante da mistura de hidrocarbonetos a derivados de petróleo, não foram considerados de substituição prioritária pela empresa, apesar de o manuseio do produto causar danos irreversíveis ao sistema nervoso central, provocar câncer no fígado, no baço e nos rins, além de ameaçar de contaminação o solo, os rios e os lençóis freáticos. "A fabricação de equipamentos que utilizam ascarel foi proibida no Brasil em 1981, mas a lei não incluiu a utilização dos equipamentos que já existiam", justificou Teodoro.

O deputado Sebastião Arcanjo acrescentou que o Brasil assinou, em 2001, a convenção de Estocolmo sobre poluentes orgânicos persistentes (POPs), de forma que o país está comprometido com sua erradicação. "As empresas que ainda utilizam o ascarel devem apresentar um projeto com cronograma de substituição dos equipamentos". Segundo o deputado, é fundamental que a Duke Energy cumpra o acordo coletivo firmado com o Sinergia, que fixa o mínimo de 320 funcionários. "Quando foi privatizada, a empresa contava com 420 trabalhadores diretos, hoje são apenas 285".

Participaram também dessa reunião os deputados Nivaldo Santana (PCdoB), Baleia Rossi (PMDB), Said Mourad (PFL), Geraldo Tenuta (PSDB) e Roberto Felício (PT).

alesp