A SEGURANÇA PÚBLICA ESTÁ DESMORALIZADA - OPINIÃO

Hamilton Pereira*
21/06/2001 14:38

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O governador do Estado festeja quando entrega aqui ou acolá à nossa polícia uma moderna camioneta inglesa, marca Land Rover. O secretário da Segurança Pública se regozija ao desfilar números e mais números para concluir que a polícia nunca prendeu tanta gente como hoje. Ambos tentam passar a impressão de que o combate à criminalidade no Estado de São Paulo está sob controle e que não há crise na segurança.

Mas a realidade é diferente. Pude constatar que a segurança pública enfrenta uma crise sem precedentes. Após ouvir queixas da população e da própria polícia, visitei há poucos dias os distritos policiais (DPs) de Sorocaba, onde moro. Fiz constatações estarrecedoras, que passo a expor sucintamente, não sem antes dizer que, de acordo com a norma da Secretaria de Segurança Pública, os DPs de 1a classe devem ter 27 funcionários e os de 2a classe, 19.

Em três dos seis DPs de 1a classe visitados, havia apenas sete policiais trabalhando; em dois, somente oito e, no último, 12. Nos dois DPs de 2a classe, o quadro é pior: três e sete policiais estavam à disposição, e na Delegacia da Infância e da Juventude (1a classe), sete. Os números oficiais podem apresentar discrepância, pois computam policiais em licença médica ou maternidade, em férias ou em desvio de função.

Parte dos prédios dos DPs está em condições impróprias de funcionamento por falta de manutenção ou de reforma. As viaturas estão, na maioria, sucateadas. Há, pasmem, veículos da década de 80 em operação. O material de trabalho do dia-a-dia, como papel para boletim de ocorrência, selos para intimação, computadores, gasolina, ou é comprado pelos próprios policiais ou doado pela comunidade. O governo, por sua omissão, incentiva a prática de "pedir coisas para empresários", o que induz relação imprópria entre o poder público e a iniciativa privada.

As visitas que fiz devem-se também a respostas insuficientes da Secretaria de Segurança a um requerimento de informações meu sobre a situação dos DPs e os recursos financeiros destinados por mês para cada um deles. A primeira resposta diz que os distritos policiais não recebem qualquer tipo de recursos financeiros, por não serem Unidades Gestoras e Executoras. A partir daí, seguiram o mesmo diapasão: "Acredito que a resposta ao quesito anterior satisfaz a presente". Após essa prova de desrespeito, em vez de ficar desestimulado, resolvi avançar, recorrendo a metodologia mais eficaz: visitar os distritos, por entender que dependem de recursos do governo para manutenção de viaturas, compra de combustível, equipamentos, material de papelaria etc. É exatamente por isso que questionamos a Secretaria sobre os recursos que deveriam chegar a eles e a forma como seriam distribuídos.

Esse é o quadro real que expõe a desmoralização da política de segurança pública em nosso Estado. Há problemas da mesma natureza na Polícia Técnica e Científica, Polícia Militar e no sistema penitenciário - este gradativamente desafiado e desmoralizado pelas facções criminosas. Pode-se concluir que estamos cada vez mais desprotegidos quanto às garantias do chamado Estado de Direito.

É comum nos refugiarmos na ilusão de que estamos seguros, pelo fato de o governo adquirir viaturas novas e armas modernas e de existir um DP próximo à nossa casa. Quando, porém, constatamos a verdade nua e crua, percebemos que, em termos de segurança, vivemos em um mundo virtual, um grande faz-de-conta, com o governo propagandeando estatísticas para ludibriar a desconfiança popular.

A pior maneira de lidar com problemas é fingir que eles não existem, até porque a situação descrita não é relativa apenas a Sorocaba. A maioria dos DPs no Estado também está desmontada. Negar a crise na segurança pública tem sido a postura recorrente daqueles que deveriam tomar atitudes e não o fazem, porque se acomodaram nesse grande circo de irresponsabilidades. Esses mistificadores não servem aos interesses de quem paga seus salários e, portanto, não podem continuar, a começar pelo secretário de Segurança nomeado pelo governador.

*Hamilton Pereira é deputado estadual (PT-Sorocaba) e 1o secretário da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

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