Opinião - A nossa luta contra o tempo

A Lei Pelé, que seria um avanço para o futebol, foi distorcida, prejudicou mais do que ajudou
02/03/2012 16:21

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Estamos vendo chegar a Copa do Mundo e, embora tenhamos ouvido falar em jogos amistosos, uma vez que a nossa seleção já está classificada e não precisa participar das eliminatórias, algo não deixa de ser preocupante. Ainda não temos um time formado e, apesar de o atual treinador ter testado dezenas de atletas, nada está definido e não podemos dizer que somos favoritos, mesmo a festa sendo em nossa casa.

A indefinição quanto aos possíveis convocados reflete muito bem o estágio atual do nosso esporte mais popular. Endeusados pela mídia, bem orientados por empresários e profissionais do marketing, jogadores muitas vezes medianos são transformados em craques, ganham destaque nos noticiários e engordam a conta bancária, deles e dos seus representantes. E, consequentemente, muitos acabam vestindo a camisa da seleção nacional, sem que tenham mostrado condições para tal.

O futebol mudou, se para melhor, ou para pior, é fácil responder. E, ao fazermos a simples comparação com o que tínhamos, somos obrigados a ouvir que, hoje "não tem mais bobo no futebol". Se não existem os tais "bobos", será que eles existiram no passado?

Se o argumento deriva para a discussão de salários, benefícios, promoção pessoal, somos obrigados a aceitar. De fato, no passado os nossos craques foram ingênuos, ou algo assim, quando negociavam salários, luvas, bichos, e coisas do gênero. Dizer que os atuais atletas são melhores na preparação física, podemos aceitar também, afinal, antes não tínhamos a atual tecnologia, nem os avanços da medicina esportiva.

Mas, salvo alguns exemplos, comparar a categoria dos atuais jogadores com os do passado é ilusão. O nível do futebol caiu como um todo, e ainda fazendo a comparação, não vamos nos esquecer de que, quando tínhamos grandes equipes, quando éramos campeões de verdade, o campeão brasileiro oferecia pelo menos cinco atletas titulares absolutos para a nossa seleção. E hoje, dos últimos campeões brasileiros, quantos podem ser titulares?

No passado, os campeões paulista, carioca, gaúcho, mineiro tinham no mínimo dois titulares na Seleção Brasileira. E hoje, quantos? Naquele tempo tivemos equipes como Palmeiras, Internacional, São Paulo, Corinthians, Atlético Mineiro, e várias outras que vestiram a camisa verde e amarela, ou que teriam condições de fazê-lo, representando muito bem o selecionado nacional.

Na verdade, o futebol perdeu em qualidade, em entusiasmo; perdeu o brilho, perdeu a emoção. A Lei Pelé, que seria um avanço para o futebol, foi distorcida, prejudicou mais do que ajudou, banalizou e jogou os atletas no colo dos empresários, muitos deles de índole duvidosa. Ao mesmo tempo, fora do campo cresceu a violência, e ela invadiu as ruas, chegou ao transporte público, virou rotina na sociedade.

E a realidade é que temos que lutar contra isso. O tempo é escasso. Além de ter que formar um time, precisamos que o nosso futebol sofra profunda transformação, em todos os sentidos. E a oportunidade é única, a Copa do Mundo está à nossa porta e não devemos deixar escapar a chance. Precisamos mostrar ao mundo que, mais que construir estádios, somos capazes de criar uma nova realidade.

A renovação precisa vir na estrutura dos clubes, com dirigentes mais abertos ao diálogo, profissionais usando a seriedade para nortear suas atividades, um povo recebendo bem e respeitando o turista, o Poder Público cumprindo o seu papel. E assim, mesmo que não tenhamos obtido sucesso dentro do campo, pelo menos mostraremos ao mundo que estamos no caminho certo, que somos uma grande nação.



*Vitor Sapienza é deputado estadual (PPS), presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Informação, ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, economista e agente fiscal de rendas aposentado.

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