Para colher é preciso semear

Opinião
30/06/2005 16:38

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Brasília foi palco de uma grande manifestação popular. Mais de três mil tratores e cerca de 20 mil produtores de vários estados argumentam estar enfrentando "a pior crise dos últimos tempos". Dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) confirmam a tese dramática " o setor agrícola deve perder R$ 11,8 bilhões, em valor bruto da produção em 2005, uma retração de 11% nos 20 principais produtos do setor agrícola em relação ao ano passado.

Câmbio apreciado, falta de investimentos em logística e armazenamento, endividamento dos produtores, falta de linhas de crédito, alta da taxa de juros, aumento nos custos de produção, quebra de safra e queda dos preços das commodities. Como se não bastasse esse quadro soturno, o governo federal tem contribuído para aprofundar a instabilidade no campo, seja pela tentativa de incorporar novos índices de produtividade, para efeito de desapropriação de terras voltadas à Reforma Agrária, ou fazendo vista grossa para as invasões de terras.

Mesmo assim, o saldo da balança comercial já superou US$ 15 bilhões, no acumulado do ano, e o responsável por este resultado é o agronegócio. Foi o único setor da nossa economia que registrou crescimento, nos três primeiros meses do ano, de 2,6% em relação ao trimestre anterior, segundo o IBGE.

Porém, não basta este olhar momentâneo, são claras as indicações da diminuição de ritmo de declínio deste suprimento. O mais impressionante é que estes números não refletem a dura realidade enfrentada pelo nosso setor agrícola.

Os efeitos perversos da falta de uma política agrícola já começaram. A exemplo da Cargill, outras duas esmagadoras de soja paulistas " a Cooperativa dos Agricultores da Região de Orlândia (Carol) e o Grupo Brejeiro ", já cogitam interromper suas operações. O Curtume Vitapelli, um dos três maiores exportadores de couro do país, foi obrigado a paralisar turnos de produção e dar férias coletivas a 40% dos seus 2,2 mil funcionários. A Jumil, quinta maior fábrica brasileira de máquinas agrícolas, engavetou o projeto de uma nova fábrica, no valor de US$ 5 milhões, que ampliaria em 20% a sua produção. A Agrishow 2005 registrou um volume negociado 47% menor que o do ano passado, quando movimentou R$ 760 milhões. Se essa é a situação dos grandes, imaginem o que está acontecendo com os milhares de pequenos e médios agricultores?

O governo anunciou que deverá investir R$ 44,35 bilhões para o financiamento da safra 2005/2006, valor 12% superior aos R$ 39,5 bilhões liberados na safra passada. Já o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) anunciou que destinará R$ 1 bilhão para o pagamento de dívidas dos agricultores atingidos pela seca. Entre os cerca de 900 municípios que tiveram a situação de emergência reconhecida pelo governo federal, 22 são paulistas da região do Médio Vale Paranapanema. Segundo a CNA, seriam necessários R$ 81,4 bilhões de investimentos para a próxima safra e, destes, R$ 68,5 milhões para custeio e comercialização.

É preciso lembrar que o agricultor é o elo mais frágil da cadeia do agronegócio, pois é o mais suscetível às intempéries do clima e à depreciação dos preços no mercado, principalmente, o pequeno agricultor. Com isso, tensiona-se a cadeia: cooperados ficam insatisfeitos com suas cooperativas e os agentes financeiros passam a temer quebra de contrato.

Criar fundos rurais permanentes e abrangentes em todo o território nacional, destinados a financiar a produção agrícola, estabelecer um sistema de estocagem capaz de diminuir os riscos diante das oscilações das cotações das commodities, investir em logística e transporte por meio de Parcerias Público Privadas, implantando um sistema intermodal para facilitar o escoamento da produção, desonerar o setor produtivo agro-exportador, barateando a aquisição de insumos, máquinas e equipamentos, investir em pesquisa e tecnologia, no sentido de agregar valor às exportações, estabelecer uma política cambial que evite a sobrevalorização do real e mantenha a nossa competitividade internacional.

Essas são medidas urgentes que fazem parte de uma política agrícola que teria como meta colocar o Brasil no rol dos principais fornecedores mundiais de produtos agrícolas. Também não podemos esquecer da conquista de novos mercados.

Para colher é preciso semear, reside aí o meu alerta. O setor agrícola tem sustentado a economia brasileira, mas nossos gargalos e a ausência de políticas sérias e consistentes condenam o setor básico da nossa economia. O setor agrícola aguarda iniciativas, até quando resistirá, não sabemos.



*Arnaldo Jardim

Deputado Estadual e líder do PPS na Assembléia Legislativa

arnaldojardim@arnaldojardim.com.br

www.arnaldojardim.com.br

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