Opinião - Punição para os torturadores


11/05/2010 17:45

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É com tristeza e indignação que recebemos, no final do mês de abril, o resultado do julgamento no STF de Ação ajuizada pela OAB, defendendo que a Lei da Anistia 6.686/79 não abranja os crimes de tortura praticados pelos agentes do Estado durante o regime militar instaurado em 1964 no Brasil. Foram 7 votos contra a Ação e 2 a favor da punição de criminosos do estado autoritário militar, que torturaram, estupraram e mataram milhares de pessoas que se opuseram à ditadura e lutaram por democracia e liberdade de expressão.

Essa decisão vai na contramão da revisão jurídica que está sendo feita em vários países do mundo, principalmente na América Latina, onde vários torturadores representantes do Estado já foram julgados e condenados, como foi o caso do ex-presidente da Argentina Reynaldo Bignone e mais cinco militares do alto escalão, que há alguns dias foram condenados a penas que variam entre 17 e 25 anos de cadeia (penitenciária comum) por crimes de sequestro e tortura.

Porém, o Brasil insiste numa danosa tradição de conciliação entre setores da elite onde a regra tem sido a anistia, diferentemente do tratamento dado aos líderes de movimentos populares como a Balaiada, a Cabanagem e Canudos, entre outros, nos quais seus líderes foram mortos ou duramente castigados.

A Lei da Anistia de 1979 foi aprovada num regime discricionário e de força, com uma oposição consentida pelos militares e em condições extremamente inferiores e desiguais com o governo militar. Podemos dizer sem dúvida alguma que essa lei foi imposta ao país pela imposição das baionetas das Forças Armadas, logo são risíveis os argumentos não só dos ministros do STF como também de representantes de partidos como o PSDB, PCdoB, PT e PV, afirmando que a anistia foi amplamente negociada pelos militares e civis. "Paga-se um preço pela democracia e o acordado tem de ser respeitado", disse o ministro Marco Aurélio de Mello.

Entendemos que os atos cometidos pelos representantes do Estado durante a ditadura devem ser enquadrados nos crimes de lesa-humanidade, e seus autores punidos com o todo o rigor da lei. Tortura não é crime político e nem ideológico. Não há lei de anistia que a proteja, bem como aos seus autores. Os nazistas do regime militar que torturaram, estupraram, sequestraram e mataram têm que ser punidos como foram os generais alemães que exterminaram a vida de milhões de judeus, comunistas e homossexuais durante o governo de Adolf Hitler.

Temos que pegar os nossos torturadores, julgá-los e prendê-los em memória dos mortos e torturados pela ditadura militar. O Brasil é signatário de tratados internacionais que colocam a tortura como crime imprescritível e contra a humanidade, como o de São José da Costa Rica, em 1969.

No entanto queremos render nossas homenagens ao posicionamento do ministro Carlos Ayres Brito, que em seu voto e pronunciamento representou o que entendemos ser a busca da justiça, do fim da impunidade e da memória de quem tombou na luta por melhores dias para o Brasil. Disse ele: "O torturador experimenta o mais intenso dos prazeres diante do mais intenso dos sofrimentos alheios" (...) "O torturador é uma cascavel que morde o som dos próprios chocalhos".



*Carlos Giannazi é deputado estadual (PSOL), professor e diretor (licenciado) da rede pública de ensino

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