Engodos e enganos

OPINIÃO - Vaz de Lima*
04/02/2004 17:57

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O líder da bancada do PT na Assembléia Legislativa de São Paulo, ao comentar o discurso do governador durante a prestação de contas ao Legislativo, afirmou que a proposta de Parceria Público-Privada apresentada pelo governo estadual é "um engodo". O governador havia destacado a importância da Assembléia discutir e votar o PPP, elemento essencial para o modelo de modernização e agilização do Estado defendida pelo PSDB.

Engodo é o Fome Zero, cujos resultados aparecem apenas na TV, não na vida das pessoas que precisam. Engodo são os CEUS que ao invés de enfrentar a sério os problemas da educação, cria uma dispendiosa vitrine que atenderá apenas a uma ínfima parte dos alunos. Engodo é gastar mais em viagens e publicidade do que em gastos sociais e investimentos como faz o governo federal. Engodo é gastar mais com a compra do avião presidencial do que com ministérios da área social.

Enfim, engodo são estes tantos projetos que os governos petistas encomendam aos seus marqueteiros , pagos a peso de ouro e que apenas desperdiçam recursos públicos. Só para voltar ao tema, engodo é o PPP anunciado pelo governo federal em um daqueles factóides do primeiro semestre do ano passado, sem que efetivamente sejam tomadas medidas para implementar parcerias de fato. O PPP do governo federal não é uma parceria de fato, mas uma proposta quase indecente de "socialização dos prejuízos" às custas do contribuinte, garantindo até um lucro mínimo para as empresas que forem escolhidas para estas parcerias.

As parcerias entre o poder público e as empresas privadas são um ponto importante do estado moderno e o governo de São Paulo pode falar de cátedra sobre este assunto, porque sempre foi pioneiro. Até há poucos dias os parlamentares petistas vinham diariamente à tribuna para criticar estas parcerias que permitiram ao Estado fazer vários investimentos que de outra forma não seriam possíveis.

Assim certamente o governo do Estado não pode ser acusado de copiar um modelo de gestão no qual é pioneiro, com vários exemplos de sucesso, de uma outra administração recém-convertida à compreensão da importância destas parcerias e que apenas engatinha no desenho do seu projeto, que antes mesmo de ser apresentado já tem recebido tantas críticas.

O líder do PT crítica o projeto do PSDB porque ele não é idêntico ao do governo federal, o que é natural, visto a vasta experiência acumulada que o governo estadual detém na área e sem os tropeços do projeto do governo federal. Note-se, contudo, que a desculpa do PT não é sequer para votar contra o projeto, mas sim para que sua discussão e votação seja agilizada.

Curioso que quando fala do governo Lula o discurso do deputado é que como ele foi eleito pela maioria então pode tudo, mesmo quando não mostra resultados concretos ou gera terremotos políticos e econômicos. Já em relação ao governo do Estado, eleito na mesma eleição que o presidente, é necessário obstruir, tumultuar, criticar, impedir que pontos fundamentais do programa tucano possam ter as ferramentas para ser colocados em prática.

Este é um exemplo da velha política que não pode mais continuar ocorrendo, a submissão do interesse público às paixões e interesses partidários, a incoerência não só entre o discurso e a prática, mas também entre o discurso conforme se trate do governo federal, estadual o municipal. Também é coisa do passado a estratégia de contornar a vontade da população expressa pela maioria do legislativo através de manobras regimentais.

Nenhum argumento sólido, nenhuma base concreta foi utilizada para justificar um termo tão forte como "engodo". A única crítica objetiva foi o fato do PSDB ter tido cautela suficiente para basear-se em sua própria experiência, ao invés de copiar o modelo petista. Essencialmente, contudo, os dois projetos pretendem atingir às mesmas finalidades, guiam-se pela mesma filosofia e estruturam-se segundo os mesmos paradigmas, portanto não parece plausível tal hostilidade, e mesmo violência, contra o projeto.

Já passou da hora do PT parar de submeter sua ação parlamentar às suas estratégias eleitorais, de se preocupar menos com a próxima eleição do que com o bem estar da população. Talvez os parlamentares petistas devessem aprender um pouco com a bancada do PSDB no Congresso Nacional, que faz críticas ao governo Lula, aponta as falhas, sugere modificações, mas jamais se omite de dar a sua contribuição, de agilizar as votações, de negociar de forma racional e não eleitoral, de aprovar os projetos que são essenciais para que o governo federal cumpra sua agenda.

*Vaz de Lima é líder da bancada do PSDB na Assembléia Legislativa e presidente da Comissão Parlamentar de Acompanhamento da Reforma Tributária do legislativo paulista.

alesp