Sábado - 7 de agosto de 1954

Especial Getúlio Vargas - Agosto de 1954: 50 anos de uma tragédia brasileira
07/08/2004 18:10

Compartilhar:


As investigações prosseguiam, às vezes sem nenhuma eficácia. Uma jovem de apenas 16 anos informou, no 2º DP, que o autor do atentado fora um tio, integrante da Polícia Especial. O delegado Pastor convocou a imprensa para que a moça fosse fotografada. À tarde, o delegado se dirigiu para o apartamento de Carlos Lacerda, em Copacabana, para que o mesmo fizesse o reconhecimento do policial. O jornalista se recusou e, irritado, afirmou que "aquilo era uma palhaçada, pois a polícia bem sabia que aquela pista era falsa".

O crime da rua Tonelero continuava a ser o assunto da ordem do dia. Os vereadores da Câmara Municipal do Distrito Federal, de oposição ao governo, Lígia Lessa Bastos, Mário Martins, Frederico Trota, Paulo Areal, Aníbal Espinheira e Gladstone Chaves de Melo acusaram o governo pelo atentado.

Instado pela imprensa, o ministro da Guerra, general Zenóbio da Costa, afirmou: "exijo, em nome do Exército, que o criminoso seja descoberto e entregue à Justiça". À noite, entraram de prontidão trinta mil homens do Exército sediados no Rio.

O Clube de Diretores e Proprietários de Jornais, reunido, condenou o inquérito policial pela forma como vinha sendo conduzido e exigiu, então, que um membro do clube acompanhasse as diligências. É relembrado, então, como justificativa ao pleito, o atentado ao jornalista José Eduardo de Macedo Soares, em 1945, quando o diretor do jornal Diário Carioca foi agredido por um policial que pertencia ao corpo de segurança presidencial. O inquérito não foi concluído e o crime ficou na impunidade. O indicado para integrar a comissão de inquérito foi o jornalista Elmano Cardim, do Jornal do Commércio.

O ministro Tancredo Neves, por determinação do presidente Getúlio Vargas, divulgou novo comunicado, no qual reafirmou: "Perante o país, especialmente a Aeronáutica, o compromisso de que se empenha, com o maior rigor, em apurar todas as responsabilidades pela deplorável ocorrência", acrescentando "que não se deteria ante nenhuma consideração pessoal, social, ou política pelos que o tenham inspirado ou dele participado... de forma a que ninguém se eximia de responsabilidades sob quaisquer pretextos, por mais excepcionais que sejam".

Às 8 horas da manhã, Nelson Raimundo foi transferido das dependências do 2º DP, em Copacabana, para o quartel de Motomecanização da Polícia Militar, localizado na av. Salvador de Sá, no centro do Rio, sob o pretexto de que não se considerava seguro na delegacia, diante das ameaças de linchamento por parte dos oficiais da Aeronáutica. No quartel, foi confinado no alojamento dos sargentos.

À noite, o capitão João Ferreira Neves, professor da Escola de Polícia, com um tabuleiro de damas debaixo do braço, foi ao encontro de Nelson e o convidou a jogar. Puxando conversa com o preso, este foi falando de sua vida, que até como barbeiro já havia trabalhado. O capitão deu corda para que seu interlocutor fosse falando, e quando perguntou se ele era da polícia, surpreendido, confessa que sim. Nelson Raimundo afirmou que era investigador da policia do Estado do Rio de Janeiro. Indagado se conhecia alguns integrantes da Polícia Especial, ele citou o nome de um certo Valente. Depois de alguma insistência, o capitão perguntou quem ele transportava em seu automóvel no memento do atentado, e depois de pensar respondeu: Climério.

Nelson Raimundo de Souza confessou então que, na noite da véspera do crime, Climério Euribes de Almeida, membro da guarda pessoal do presidente da República, chamara-o pelo telefone e com ele contratara, por 20 mil cruzeiros, o transporte para o local do crime e a fuga posterior. Naquela mesma noite haviam estado no Externato São José, na Tijuca, onde Lacerda realizava uma palestra. Seria lá o local do crime, mas ali era desfavorável em virtude do aglomerado de pessoas que se formou em torno de Carlos Lacerda. De lá seguiram para Copacabana, aonde chegaram em torno da meia noite. Estacionou o carro em uma transversal, após o crime foi para o centro e depois retornou ao seu ponto em frente o palácio do Catete. Pouco depois, chegou Climério, vindo de Copacabana, a quem transportou para a residência em Cachambi, zona norte do Rio de Janeiro.

Chegando ao seu destino, percebeu que o carro estava marcado à bala. Preocupado, resolveu apresentar-se na delegacia do Catete naquela mesma madrugada. Ainda na noite de sábado, o coronel João Adil de Oliveira telefonou para a residência oficial do ministro Nero Moura, no Galeão, informando em primeira mão que se encontrava no quartel da PM, no centro da cidade, e que "tinha o chofer aberto a boca e contado tudo". Solicitou a presença do ministro porque "havia elementos da guarda pessoal do presidente envolvidos e nós temos que ir buscá-los agora no Catete".

Quando o ministro da Aeronáutica chegou à sede da Motomecanização, Adil deu a entender que havia pessoas da família Vargas envolvidas na trama. No local, já se encontravam o brigadeiro Eduardo Gomes e o promotor Cordeiro Guerra. Nelson já tinha confessado que havia transportado o pistoleiro e sido contratado por gente da guarda pessoal, um tal de Climério. Como se tratava de um homem de dentro do palácio e o ministro era de confiança do presidente, foi solicitado a Nero que fosse buscá-lo. Ele respondeu de pronto que era um problema exclusivo da polícia e assunto do Ministério da Justiça, e pediu licença para chamar Tancredo Neves.

alesp