Lula tem razão

Opinião
27/04/2005 18:01

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Pensei em dar a este breve artigo um título mais picante: "Derrière", ou, simplesmente "traseiro". Mas o receio de que uns e outros me tomassem por um hedonista extemporâneo falou mais alto. Além disso, o sempre sensato presidente da República nos alertou para o fato de que, por comodismo, nós pagamos juros estratosféricos. Se tirássemos o "traseiro da cadeira" e trocássemos de banco, daqui pra frente tudo seria diferente, como naquela velha música de Roberto e Erasmo Carlos.

No fundo, Lula tem razão. Afinal, nada mais fácil que trocar de banco, uma ou duas vezes por semana, se preciso. Como sabemos, o processo de abertura e fechamento de contas é algo simples. É só chegar para o gerente e exigir taxas de juros menores, cheque especial e demais vantagens que a coisa se resolve na hora. Mesmo que o saldo esteja negativo e não se tenha condição de quitar o débito junto à instituição bancária. Mudar de banco é tão ou mais simples que mudar a geografia econômica do mundo, erradicar a fome do planeta e ensinar às elites como se governa. Tarefas às quais nosso presidente tem se dedicado com especial denodo. Querer é poder. Portanto, basta querer.

É irrelevante o fato de que em Pindorama os juros reais fixados pelo Banco Central sejam os maiores do mundo. Aqui, eles são da ordem de 13% ao ano " contra 1,2%, 0,6% e 2,0%, respectivamente, a média geral entre 40 países, a média dos países desenvolvidos e a média dos países emergentes. Igualmente irrelevante que, em março, o número de cheques devolvidos pelos bancos por carência de fundos tenha superado todos os índices registrados pela Serasa desde março de 1991.

Se o desemprego é grande e o orçamento curto, como dizem os especialistas em economia e finanças, as pessoas que tomem juízo e acomodem seus traseiros no sofá da sala. E ouçam, claro, ao menos um dos inúmeros discursos semanais do presidente. Além de não gastarem o que elas não têm estarão ampliando seus conhecimentos sobre os temas mais diversos da atualidade. Toda a família sairá intelectual e moralmente engrandecida. Afinal, o ilustre orador, como ele próprio admitiu em Roma, é homem "sem pecados".

Importante registrar a coerência do presidente. São raros os momentos em que ele acomoda o traseiro em sua poltrona giratória do Palácio do Planalto. Fazer o que ali? Ler relatórios, analisar documentos, avaliar projetos? Bobagem. Preferível viajar mundo afora e levar aos povos um pouco de sabedoria e esperança. O mundo lhe será eternamente grato.

Milton Flávio (PSDB-SP) é deputado estadual e professor da Faculdade de Medicina da Unesp, em Botucatu.

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