Estado tem papel fundamental na pesquisa, dizem cientistas

Pesquisa acadêmica e inovações tecnológicas devem receber recursos do setor público (com fotos)
17/08/2001 19:38

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As diferenças entre pesquisa básica e pesquisa aplicada não impedem que elas compartilhem um elemento importante: o setor público, que tem papel fundamental no desenvolvimento tanto de uma como de outra. A necessidade de atuação do Estado foi apontada na mesa de debates que abriu, na manhã desta sexta-feira, 17/8, o segundo dia da Conferência Regional de Ciência, Tecnologia e Inovação, que está sendo realizada na Assembléia Legislativa.

Sob a coordenação da deputada Célia Leão (PSDB), presidente da Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia da Assembléia, o debate sobre as bases do desenvolvimento científico e tecnológico destacou o papel do Estado já na intervenção do reitor da Universidade Estadual de Campinas, Hermano Tavares. "Se queremos achar um atalho tecnológico, temos que, ao mesmo tempo, achar um atalho social", ele alertou, ao apontar problemas como má distribuição de renda, baixa média de escolaridade da população e ensino superior que, implantado tardiamente, é ainda excludente.

Para ele, o grande desafio de expandir o ensino universitário - que, segundo dados do Ministério da Educação, é oferecido a apenas 12% da população brasileira - exige tornar mais eficientes os gastos com educação, já que, segundo dados da Organização das Nações Unidas, o Brasil gasta no setor 5,2% de seu Produto Interno Bruto, mais do que a média mundial de 4,9%.

Além disso, o poder público deve assumir frontalmente seu papel na educação superior. "Atualmente, 83,5% dos estudantes universitários estão na rede privada de ensino. Percentual como esse não existe em parte nenhuma do mundo", afirmou.

O presidente da Academia de Ciências do Estado de São Paulo, Walter Colli, defendeu a importância da pesquisa acadêmica como a origem da inovação tecnológica que depois é oferecida à sociedade. "É necessário fazer pesquisa básica nas universidades, com recursos do Estado", afirmou. De acordo com Colli, têm diminuído os recursos de bolsas de estudo destinadas pelo governo federal ao Estado de São Paulo, o que acaba sobrecarregando a Fundação de Amparo à Pesquisa (Fapesp). "E a pesquisa básica é 10 a 100 vezes mais barata que a inovação tecnológica; o mau direcionamento dos recursos pode acabar matando a fonte de idéias", advertiu.

Para José Ripper Filho, da empresa Asga Microeletrônica, o governo tem papel fundamental até no desenvolvimento tecnológico das indústrias, como contratante de pesquisas. Segundo ele, a maior parte dos recursos do governo norte-americano, na área de pesquisa e desenvolvimento, destina-se ao setor privado. "O governo estrangeiro dá forte apoio ao desenvolvimento tecnológico das empresas, e o Brasil já fez o mesmo em outras épocas, como no caso da Embraer", lembrou.

Conhecimento estratégico. O segundo painel do dia: O Conhecimento Estratégico para o desenvolvimento paulista, sob a coordenação de Celso Barbosa, da Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras (ANPEI), três especialistas da Unicamp e um técnico do Instituto Nacional de4 Pesquisas Espaciais (INPE).

Para os especialistas, São Paulo avançou muito, mas ainda está longe de desenvolver todo o potencial aberto pela utilização e pesquisa de novas tecnologias nas mais diversas áreas.

O professor Carlos Joly do Departamento de Botânica da Universidade de Campinas apresentou números que atestam o país como o maior depositário da biodiversidade mundial, são 55 mil espécies de plantas, 6.500 de vertebrados, 12 mil de insetos catalogados. Segundo o pesquisador, a utilização deste potencial é ainda pequena e as informações dispersas. Só recentemente foram finalizados estudos que mapeiam o Estado e que mostram a riqueza de uma área de transição entre dois importantes biomas, o do Cerrado e o da Mata Atlântica.

A utilização da biomassa como geradora de energia é outro aspecto em que houve um avanço considerável no Estado, segundo a avaliação do professor Isaias Macedo, da reitoria da Unicamp, a tecnologia desenvolvida para a utilização da cana-de-açúcar já se traduziu em custo menor que o praticado no Exterior para geração de energia. Para Isaias, temos que caminhar na utilização de todos os resíduos da produção agrícola, como o bagaço da cana, a palha do arroz, por exemplo. Se o Estado trilhar este caminho em alguns anos existirão sobras energéticas. Outra área em que avançam as pesquisas e que, segundo o pesquisador, o país deve investir é no das plantações voltadas para a geração de energia, como de eucaliptos.

As pesquisas para o mapeamento biológico têm bolsões de desenvolvimento, como na indústria de papel e celulose, onde já são comuns as florestas clonais, mas em outras áreas é preciso investir para que os resultados práticos apareçam, esta é a visão do professor Paulo Arruda, que também chamou a atenção para a inexistência de empresas de biotecnologia, que seriam as responsáveis pela aplicação prática dos conhecimentos oriundos dos centros de pesquisa ligados ao poder público.

Para Gilberto Câmara Neto, do INPE, é necessário que o órgão passe por uma reformulação, assim como outros órgãos ligados ao desenvolvimento aeroespacial do país, para que haja um desenvolvimento harmônico das várias áreas com reflexos práticos para a sociedade. O Brasil é o terceiro país na utilização de imagens por satélite para os mais diversos fins, por um erro estratégico preferimos pagar para utilizar a tecnologia de outros países do que desenvolver nossa própria. Para o técnico, é necessário que haja uma integração entre o nosso programa aeroespacial e sua aplicação na indústria.

alesp