Opinião - Reciclagem: destino para o lixo

Maria Lúcia Prandi*
20/07/2009 18:34

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A Baixada Santista recicla pouco mais de 1% das 36 mil toneladas de lixo que produz todos os meses. Considerado modelo para o Brasil quando o assunto é coleta seletiva, Londrina (Paraná) recicla 20% do lixo produzido. O trabalho é feito em parceria com organizações não-governamentais formadas por carrinheiros. Batizada de "Reciclando Vidas", a iniciativa envolve mais de 500 trabalhadores e já recebeu o prêmio "Gestão Pública e Cidadania" da Fundação Getúlio Vargas.

Há pelo menos três anos, defendo a implantação de um sistema metropolitano de coleta seletiva, com a criação de usinas de reciclagem. Estes locais seriam alimentados por materiais recolhidos a partir do trabalho realizado fundamentalmente por cooperativas de catadores e carrinheiros, que atuariam em micronúcleos definidos nos municípios. O estabelecimento destas áreas de atuação teria como base a divisão em setores censitários do IBGE, em cada cidade da região. O mecanismo é similar ao aplicado em Londrina, só que teria caráter regional.

Com o envolvimento efetivo dos diversos instrumentos a serviço do Poder Público, a teia da coleta seletiva chegaria a todas as casas. Isto se daria, por exemplo, por meio da participação dos agentes comunitários de saúde, que fariam uma apresentação do novo sistema à população. Os catadores, por sua vez, se tornariam agentes públicos de limpeza. O vínculo entre eles, por meio de suas cooperativas, e o governo deixaria de ter o papel assistencialista para se tornar uma prestação de serviço social e ambientalmente necessária.

A implantação desse sistema é, sem dúvida, o melhor caminho para a destinação dos resíduos sólidos gerados em nossa região. Além de reduzir os impactos nocivos ao meio ambiente, a medida gera ganhos sociais, resgatando para a cidadania um setor historicamente marginalizado, que é o de carrinheiros. O ganho financeiro obtido por estes trabalhadores também movimenta a economia local. O volume obtido com a concentração de matérias-primas para reciclagem aumenta o valor agregado dos produtos e reduz o custo operacional do sistema.

Assim, fechando o ciclo, os ganhos também chegam ao Poder Público, com a redução dos gastos em relação ao tradicional modelo de coleta e destinação final do lixo. Por consequência, mais recursos para investimentos em áreas essenciais, como Educação, Saúde, Moradia, Esporte e Cultura. Entretanto, lideranças políticas de nossa região parecem não querer enxergar esta realidade. Em comitiva, foram à Alemanha para conhecer o funcionamento de incineradores de lixo e querem importar para cá esta tecnologia, ainda controversa pelos detritos que gera.

Pesquisa do governo francês vincula a fumaça de incineradores ao aumento da incidência de câncer de mama e fígado, cujos índices em nossa região já são elevados. Esquecerem de observar também, ao que parece, que o modelo germânico é baseado, ante de tudo, na separação do lixo doméstico, na coleta seletiva e na reciclagem destes materiais. Apenas o que sobra vai para os fornos, tecnologia que, aliás, não precisa ser trazida de fora. A Universidade Federal do Rio de Janeiro já dispõe deste conhecimento.

Com menos que o R$ 1 bilhão estimado para o incinerador, é possível avançar a passos largos na coleta seletiva, gerando ganhos inquestionáveis para o meio ambiente, a saúde, a cidadania e os cofres públicos. Este é o caminho.



*Maria Lúcia Prandi é deputada estadual (PT) e cientista política. Colaboradora.

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