MORTALIDADE MATERNA: O DESPERDÍCIO DE VIDAS A SER EVITADO - OPINIÃO

Célia Leão*
26/07/2001 18:48

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O Brasil apresenta uma taxa de mortalidade materna de 110 mortes por 100 mil nascidos vivos, de acordo com estudos da Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos (Rede Saúde), uma entidade criada por iniciativa de organizações feministas do país que atua no campo da saúde da mulher. Esse número é semelhante ao apresentado pelos países mais pobres da América Latina e mostra que as mortes de mulheres por complicações da gestação, parto e pós-parto no país representam um desperdício de diversas vidas.

Desperdício de vidas porque são mortes que podem ser evitadas se o sistema de saúde oferecer a assistência correta. Estudos da Rede Saúde indicam que a principal causa de morte materna são as doenças hipertensivas, seguidas de hemorragias, complicações do aborto e infecções. Todas elas são responsáveis por 89% dos óbitos de mulheres grávidas no Brasil e estão ligadas diretamente à qualidade da assistência durante o parto. A falta de sangue nos hospitais, por exemplo, tem tirado a vida de centenas de brasileiras, sendo que as mortes maternas já correspondem a cerca de 6% dos óbitos de mulheres de 10 a 49 anos no Brasil, segundo o Ministério da Saúde.

Outros fatores que contribuem para agravar ainda mais o problema são a inexperiência dos médicos e profissionais de saúde em cuidar da doença, a demora em admitir a gravidade do caso e a falta de registro do óbito em cartório, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, que apresentam o maior número de mortes maternas por serem os locais onde a desigualdade social é maior.

Os abortos feitos na clandestinidade também provocam infecções nas mulheres e a demora pela busca da ajuda e socorro, exatamente devido ao medo destas se exporem, já que se utilizaram de um sistema que sabem que é precário, representam a terceira causa desse tipo de morte. Só para se ter uma idéia da dimensão desse problema social e de saúde, o número de adolescentes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para tratamento das complicações de aborto, entre 1993 e 1998, ultrapassou 50 mil. O parto por cesariana expõe à futura mãe a mais riscos por já ter feito cesárea, e portanto com uma tendência em apresentar quadros hemorrágicos. Logo, estimular o parto normal, além de ser mais saudável, pode influir numa significativa diminuição de óbitos. E é isso que o Ministério da Saúde tem feito, através do Sistema Único de Saúde, que paga mais para os hospitais e médicos realizarem o parto normal, evitando as cesáreas.

Para evitar mais tragédias, convém à mulher realizar o exame pré-natal no mínimo seis vezes, além de fazer uma consulta após o parto, recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Esse acompanhamento durante a gestação, juntamente com um maior investimento na integração entre os serviços de pré-natal e atenção ao parto, são importantes para reduzir a mortalidade materna no Brasil. Tanto os médicos como os hospitais devem estar preparados para atender as pacientes, não só em consultas rotineiras, mas também em casos de urgência.

O governo federal está fazendo a sua parte, propondo medidas para reduzir a morte materna. Um exemplo é a criação da Comissão Nacional de Mortalidade Materna pelo Ministério da Saúde, composta por representantes de instituições governamentais, sociedades científicas, movimento de mulheres e especialistas. O trabalho dessa comissão é importante, juntamente com os Comitês estaduais e municipais, na medida em que identifica os níveis de morte materna, aponta as causas e propõe melhorias. Em São Paulo, por exemplo, já existe o Comitê de Estudos de Morte Materna, que estuda o assunto e contribui, dessa maneira, para diminuir o óbito materno.

Além disso, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), instalada no ano passado pela Câmara de Deputados sob a presidência da deputada Fátima Pelaes (PSDB-AP), a fim de investigar as causas e responsabilidades, encerra o trabalho no início de agosto e aponta a má qualidade, a falta de acesso ao pré-natal e o despreparo da rede pública de saúde como as principais causas desse grave problema social. Sem dúvida, todas essas medidas são bem vindas para que a negligência não mais persista, sob risco de cada vez mais mulheres morrerem por motivos tolos e egoístas, isto é, que poderiam ser muito bem evitados com a ajuda e boa vontade de toda a sociedade.

*Célia Leão é deputada estadual pelo PSDB.

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