Quando daremos o segundo passo?

OPINIÃO - José Caldini Crespo*
14/05/2003 16:43

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Estamos dando o primeiro passo. O governo Lula está lançando

o Programa Brasil Alfabetizado, com o intuito de erradicar o

analfabetismo no Brasil. É uma iniciativa louvável que conta

com a participação da iniciativa privada e dos governos

estaduais.

O primeiro convênio do programa foi assinado no último

sábado, no Acre. Pelo acordo, empresas, governo estadual e

governo federal, através do MEC, estarão trabalhando juntos

para acabar com o triste número de 20 milhões de analfabetos

existentes no país.

No Acre, o programa prevê aulas nas escolas, em espaços

comunitários, nos locais de trabalho e até nas comunidades

indígenas. A capacitação dos educadores e o incentivo a

professores e alunos - inclusive com prêmios em dinheiro -

também estão previstos.

O problema do analfabetismo é uma doença crônica que afeta o

nosso país. E acho que é assim que deve ser visto e tratado.

Todos nós já vimos projetos propondo o fim do analfabetismo

no Brasil. Muitos anos e governos depois da primeira

tentativa e aqui estamos nós: dando o primeiro passo.

Cabe dizer que o governo anterior, assim como outros antes

dele, trabalhou nesse sentido. Dados do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE) dão conta de que o Programa

Alfabetização Solidária, montado pelo governo FHC e hoje

transformado numa ONG, atuou na alfabetização de milhões de

brasileiros nos últimos anos.

Segundo os dados levantados pelo Censo 2000, dos 10

municípios com os piores índices de analfabetismo no censo de

1991 somente dois continuavam na lista (Itamaraty/AM e

Branquinha/AL). Com mais de 70% das salas de aula instaladas

na zona rural dos municípios, a redução do índice de

analfabetismo nessas regiões foi quase duas vezes maior que a

redução do índice nacional. De acordo com o IBGE, a redução

do analfabetismo para o grupo de pessoas com 15 anos e mais

de idade foi menor, embora significativa, passando de 20,1%

em 1991 para 13,6% em 2000. No Nordeste, onde mais de 75% dos

municípios foram cobertos pelo Alfabetização Solidária, a

média da redução foi maior, mais de 11%, no mesmo período.

Os dados do último censo chamam a nossa atenção: ainda temos

24,6% da população do nordeste analfabeta (eram 37,5% em

1991); 15,6% da população da região norte (23,9% em 1991); no

centro-oeste a taxa de analfabetismo está em 9,7% (contra

15,6% no censo anterior). E os índices são altos também nas

regiões consideradas mais ricas: são 7,5% de analfabetos

entre a população da região sudeste (eram 11,5% em 1991) e 7%

entre a população do sul do país (10,8% em 1991).

Segundo notícia veiculada pela agência Reuters os indicadores

educacionais melhoraram na década de 1990, "mas o número de

pessoas analfabetas permanece extremamente elevado".

A população brasileira atingiu, segundo o Censo 2000, 169,8

milhões de habitantes, concentrando 2,8% da população

mundial, de 6,1 bilhões de pessoas, conforme as estatísticas

da Organização das Nações Unidas (ONU). Em 1991 a população

somava 146,8 milhões de habitantes. De acordo com os dados do

instituto a proporção de pessoas alfabetizadas com 10 anos ou

mais de idade aumentou de 80,3% em 1991 para 87,2% em 2000.

Ou seja, aproximadamente 120 milhões de brasileiros se

consideraram aptos a ler e escrever.

Ainda assim, apesar do aumento no número de pessoas

alfabetizadas, existiam no país, no ano 2000, 17,6 milhões de

pessoas de 10 anos ou mais de idade não-alfabetizadas, "o que

representa ainda uma das maiores taxas de analfabetismo da

América Latina", como lembrou a Reuters ao comentar os dados.

De acordo com as últimas notícias veiculadas pela Imprensa, o

governo federal trabalha com o número de 20 milhões de

analfabetos.

E por quê continuamos com 20 milhões de analfabetos em solo

brasileiro? Por quê tantos programas e tantas boas intenções

até hoje não conseguiram resolver a questão do analfabetismo

nacional?

Será que de tempos em tempos não estão surgindo novas

gerações de analfabetos, que aumentam as estatísticas? Será

que não são tantos os problemas enfrentados pelo povo

brasileiro que o fato de não saber ler e escrever tenha

ficado, para os analfabetos, em segundo plano? Será que

estamos fadados a estar sempre dando o primeiro passo?

Espero que não. E espero que, com as novas propostas do

governo Lula, este novo programa dê certo.

Mas não me furto dizer que, mesmo com a alfabetização dos 20

milhões de analfabetos hoje existentes no Brasil, estaremos

ainda no primeiro passo. Isso porque, dentre os 120 milhões

de brasileiros que se declararam aptos a ler e a escrever

para os pesquisadores do IBGE, temos milhões de analfabetos

funcionais - pessoas que lêem e escrevem, mas não entendem o

que lêem e não conseguem se expressar de forma a fazer com

que entendam seus escritos. Ouso dizer que os analfabetos

funcionais, em nosso país, podem ser em número ainda maior.

Como fazer para que esses brasileiros sejam realmente

incluídos numa sociedade que lê, escreve, entende e se faz

compreender?

Acredito que o problema que assola nosso país desde os

primórdios de sua história deva ser amplamente debatido para

que possam aflorar soluções estruturais, talvez menos óbvias

que incentivos em dinheiro e que se mostrem mais eficazes no

final do processo do que as implantadas até agora.

Talvez seja necessário dar o segundo passo....

*José Caldini Crespo é deputado estadual pelo PFL e 2.º

secretário da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa de São

Paulo

alesp