Nasrudin, Maria Antonieta e os juros

Opinião
28/04/2005 19:47

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Mais uma vez sou obrigado a recorrer às antigas anedotas de Nasrudin " popular personagem de piadas no Oriente Médio - como fiz em artigos anteriores para tentar compreender as ações do presidente Lula. Afinal, tão disparatadas tem sido as declarações feitas por ele que a única comparação possível é com o paradoxo humorístico.

Perguntaram certa vez a Nasrudin o que era mais importante, o Sol ou a Lua. O pretenso sábio respondeu:

- Sem dúvida é a lua. Afinal, o sol brilha durante o dia, quando já está claro, enquanto a lua ilumina a noite que é escura e por isto precisa mais da luz.

O presidente agiu com raciocínio semelhante quando afirmou que a culpa pelos juros altos estava no comodismo dos consumidores que evitavam "tirar o traseiro da cadeira" para procurar um banco com juros menores. Como o personagem, Lula acha que os juros são questão de escolha de cada um e não o resultado das políticas governamentais determinadas; saiba ele ou não pelas suas próprias decisões.

A primeira reflexão que salta aos olhos de qualquer pessoa que, ao contrário do presidente, conheça um mínimo de política macroeconômica, é por que a equipe econômica " que em tese seria comandada por Lula " não segue a orientação do seu chefe presumido e utilizando todo o aparato tecnológico das mesas de operação e das telecomunicações que interligam os mercados para buscar no mercado internacional juros menores para rolar a dívida pública. Até as crianças do pré-primário sabem que o Brasil paga as mais altas taxas de juros do mercado global, um dos motivos pelos quais os bancos festejam sem parar lucros extraordinários e quebras de recorde. Só o presidente parece não saber disso.

Estas altas taxas de juros revelam outro aspecto para o absurdo da fala de Lula, o fato de que o principal fator que eleva os juros para o consumidor final e setor produtivo é justamente a competição com os juros pagos pelo governo. Como o governo oferece taxas exorbitantes de remuneração para captar dinheiro no mercado, os bancos preferem emprestar para o Tesouro e assim há cada vez menos recursos disponíveis no mercado para empréstimos aos segmentos privados.

Assim, só há duas explicações possíveis para o absurdo da afirmação: a primeira é que Lula desconhece por completo o funcionamento da economia, a ponto de imaginar como vilão justamente a vítima de uma ação que não tem outro responsável senão, em última instância, a própria Presidência. Admitir esta triste hipótese, contudo, seria confirmar a lenda de que o presidente nada sabe do que ocorre em seu próprio governo, sendo apenas um marionete.

A outra hipótese é menos drástica, mas igualmente nada lisonjeira à figura do próprio presidente, que seu discurso foi um disparate, mas sem ter nada de concreto a fazer para cumprir as promessas preferiu ocultar a verdade atrás de um discurso falacioso sabidamente falso e sem sentido. Nesta hipótese, a inteligência que estaria sendo desprezada não é mais a do presidente, mas a de todo povo brasileiro que, então, é levada em tão baixa conta pelo presidente e seus assessores que seria capaz de engolir a primeira desculpa esfarrapada.

Ao desconectar os fatos das suas causas reais para impor uma teoria tão absurda quanta a de Nasrudin o presidente dá mais um salto na sua escalada demagógica que a cada instante tenta escamotear os problemas reais e a cada discurso perde mais o contato com a realidade com a qual o governo não tem mais condição de lidar. Primeiro o presidente tentou culpar o governo anterior pela incapacidade de cumprir as promessas, depois passou a culpar "as elites", a seguir reclamou da "oposição", agora chega ao triste ponto no qual todo o povo brasileiro é responsável pelos seus próprios males.

Neste delírio do presidente ele acaba por assemelhar-se a outro governante que chegou ao mesmo ponto e é famosa por uma frase que em seu sentido estrutural é absolutamente idêntica à do presidente: Maria Antonieta. Também segundo ela o povo reclamava a toa da falta de pão, bastando comer bolo no lugar.

Fica ao gosto e ao senso de cada leitor decidir se o presidente, no caso, agiu de forma absurda como Nasrudin ou com cinismo como Maria Antonieta. Em ambos os casos, contudo, a atitude totalmente desligada da verdade não pode passar impune, nem ser considerada apenas como mais uma das muitas gafes do governo Lula.

*Vaz de Lima é deputado estadual pelo PSDB.

alesp