Pesquisa paulista em risco

OPINIÃO - Luiz Gonzaga Vieira*
25/11/2003 17:10

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Durante toda a história da humanidade houve cidades e regiões cuja vocação para a pesquisa os capacitou a formar centros de renome e pólo de atração das pessoas de talento. De um lado o incentivo público e de outro este efeito de concentração de cérebros, criou ambiente favorável e deu à região a massa crítica necessária para se gerar grandes avanços.

Assim foi com a Atenas Clássica, a Alexandria helenística, a Bagdá dos califas, a Pequim dos imperadores chineses, a Granada dos mouros, as universidades medievais na Itália, os seminários alemães da Reforma, o Vale do Silício na Califórnia e tantos ouros centros que marcaram a sua época. No Brasil é impossível falar de conhecimento sem fazer jus à posição paulista.

Os maiores centros de pesquisa do país estão localizados em São Paulo e é aqui que se concentra a maioria da produção científica e tecnológica do país, qualquer que seja o critério adotado para medir esta produção. Grande parte desta pesquisa é financiada pelo próprio governo do estado, com pouco ou nenhum apoio da União, embora o estado também atenda a grande número de alunos de graduação e pós-graduação vindos dos mais diversos estados do Brasil e de outros países.

Duas ações comprometem seriamente o futuro deste grande parque científico e tecnológico construído em São Paulo. A primeira deles é a intenção de pulverizar os recursos federais ainda mais, com a desculpa de "democratizar" estas verbas, projeto do Ministério da Ciência e Tecnologia cujo potencial destruidor foi apontado com eloqüência pelo físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite em artigo publicado na terça-feira (11/11).

Substitui-se assim o critério da excelência técnica e dos resultados efetivos por parâmetros obscuros - quem sabe marcado pelas veleidades e afinidades políticas que tanto tem caracterizado a administração federal. É bem provável que centros de pesquisa de renome, não só em São Paulo mas em diversos outros estados, tornem-se inviáveis devido a esta decisão.

São Paulo teria condições de sobreviver a este holocausto da pesquisa nacional que se pretende fazer, já que financia boa parte da sua própria pesquisa, se não houvesse outra tempestade na linha do horizonte: a substancial redução na arrecadação do ICMS causada pela mudança na cobrança deste imposto no destino ao invés da origem. Esta proposta do governo federal terá grande impacto sobre as universidades públicas paulistas que tem suas verbas vinculadas à arrecadação deste imposto e a redução das verbas disponíveis certamente contaminará também outros recursos para a área.

Enquanto isto, os gestores das políticas públicas federais na área de ciência e tecnologia dedicam-se a reinventar a roda apresentando como seus diversos projetos gerados em São Paulo.

Enquanto São Paulo mantém há sete anos a maior parte do Centro Nacional de Referência sobre Biomassa - Cenbio - o governo federal anuncia o tema como grande novidade. Enquanto São Paulo investe na construção de presídios modernos utilizando tecnologia o governo federal, sem ter opções de locais seguros para colocar presos, utiliza esta estrutura e ainda dá entrevistas como se fosse ele a manter o presídio. Enquanto os pesquisadores da Politécnica trabalham e o governo paulista financia o governo federal faz os anúncios da transmissão da próxima Copa do Mundo pela TV Digital.

O desenvolvimento da pesquisa no estado de São Paulo beneficia não apenas os paulistas, mas todo o país, contudo o que deveria ser um mérito do estado transforma-se em algo negativo que precisa ser desmontado a pretexto de se evitar a "concentração".

A defesa do desenvolvimento tecnológico e da pesquisa científica brasileira não pode prescindir da defesa da posição paulista e da preservação dos recursos necessários a sobrevivência e ampliação deste trabalho. A pesquisa não pode ser sucateada, ainda mais em um momento no qual o avanço nestas áreas é tão rápido, sob a pena do Brasil ficar definitivamente para trás nesta área.

*Luiz Gonzaga Vieira é deputado estadual pelo PSDB e presidente da Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia Legislativa de São Paulo.

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