OLHANDO NO ESPELHO - OPINIÃO

Arnaldo Jardim*
09/02/2001 16:14

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O Estado americano da Califórnia vive um cenário de constantes blecautes e de disparada no preço de energia (saltou dos históricos US$ 30 por MW/hora para US$ 1.400 por MW/hora), o que tem levado ao êxodo de indústrias e à falência de empresas de distribuição de energia.

Trata-se de um alerta para nossa ainda frágil economia, que na última década vem-se desvencilhando do intervencionismo estatal para mergulhar na chamada economia de mercado, inclusive em áreas estratégicas como a de geração e distribuição de energia.

Grosso modo, na Califórnia, na desregulamentação desse mercado, foram fixadas metas tarifárias e divididas as competências privadas de geração e distribuição de energia. Tudo funcionou de forma razoável até o momento em que o crescimento da demanda de energia - decorrente do crescimento econômico do Estado que abriga o vale do Silício e cuja economia, isoladamente, ocupa o sexto lugar no cenário econômico mundial - não foi acompanhado no lado da oferta. No início de agosto, em seminário que organizei junto com a Fapesp, na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, Ron Echus, da Agência de Regulação do Estado do Oregon, chamou a atenção sobre o descompasso nos investimentos de produção de energia na Califórnia.

Aí reside a minha principal preocupação. Mesmo nos Estados Unidos, país de instituições sólidas e com tradição em instrumentos de defesa dos cidadãos, a desregulamentação não conseguiu garantir que o setor privado se antecipasse às necessidades de demanda energética.

O modelo de desregulamentação é irreversível mas não pode ser inflexível nem fechar os olhos para problemas como os do apagão argentino e dos blecautes californianos. É preciso redobrar a atenção com os serviços públicos recentemente desregulamentados, para lhes garantir qualidade, universalidade e preços compatíveis com a nossa necessidade de desenvolvimento e de competitividade numa economia com inserção global cada vez mais acentuada.

No caso específico da questão de energia, é necessário consolidarmos o caráter diversificado da nossa matriz de energia para que não sejamos reféns, como a Califórnia em relação ao gás natural, de uma geração baseada num produto específico. É desejável, portanto, que o Estado brasileiro tenha uma infra-estrutura mínima que garanta a energia para o parque industrial local instalado, por meio de investimentos constantes na produção de energia e na consolidação da diversificação da nossa matriz energética.

No caso da Califórnia brasileira, o Estado de São Paulo, maior força econômica do país, cabe a tarefa urgente de rever a logística produtiva das concessionárias para que haja um acompanhamento da evolução da oferta e da demanda de energia, de modo a evitar uma escassez catastrófica para a economia brasileira.

Enfim, o que queremos é o aprimoramento dos instrumentos de planejamento, controle e fiscalização para garantir serviços de qualidade com preços compatíveis.

*Arnaldo Jardim é engenheiro civil, ex-secretário da Habitação, deputado estadual e relator geral do Fórum SP - Século XXI.

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