Secretário Arce diz que aumento de tarifa de energia para repor perdas é legal

A informação foi dada durante debate promovido pela Comissão de Serviços e Obras Públicas
21/03/2002 22:38

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DA REDAÇÃO (com foto)

O secretário de Energia do Estado de São Paulo, Mauro Arce, convidado a debater a situação econômico-financeira da concessionária Elektro em reunião da Comissão de Serviços e Obras Públicas realizada nesta quinta-feira, 21/3, afirmou que o aumento de tarifa de energia para repor as perdas sofridas pelas concessionárias é legal e contratual.

Na reunião, presidida pelo deputado Antonio Mentor (PT), Arce disse que é muito difícil pedir à população que economize energia e ao mesmo tempo tentar diminuir as perdas das empresas. "Não acho justo que se peça à população, que acabou de passar por um racionamento, que pague mais pela energia. Mas está no contrato, é legal". De acordo com o secretário, não há margem para rompimento de contrato com nenhuma das concessionárias que operam em São Paulo. "Isso só seria possível se alguma delas não estivesse cumprindo sua parte no contrato." A possibilidade de perda de concessão está vinculada ao descumprimento do contrato, ou índices de desempenho abaixo do esperado.

Fiscalização

Para o comissário chefe do Grupo Comercial e Tarifa do Conselho de Serviços Públicos de Energia (CSPE), Moacir Trindade Andrade, as concessões foram feitas respeitando-se critérios mínimos de atendimento, de acordo com o serviço prestado antes da privatização. "No setor, tínhamos uma regulamentação muito ampla que não era exigida. Hoje, o órgão regulador está cada vez mais presente", disse. De acordo com ele, as concessionárias têm sido fiscalizadas e penalizadas quando necessário. Sobre o racionamento, Andrade afirmou que a população deu um exemplo brilhante de cidadania e adquiriu novos hábitos, o que levará as concessionárias a encontrar outras formas de trabalhar, "porque a população vai manter a racionalização no consumo".

Ressarcimento

Sobre a recuperação do equilíbrio das contas das concessionárias depois do racionamento, Arce disse que não só as distribuidoras mas também as co-geradoras serão ressarcidas. "E o financiamento recebido será pago por cada um dos consumidores", sentenciou. O secretário admitiu não ficar muito à vontade em relação ao assunto.

Outro tema tratado foi o contrato de energia emergencial feito pela Secretaria, o chamado "seguro antiapagão", que está sofrendo uma ação civil pública movida pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Pró-Teste) e pelo Instituto Pedra Grande de Preservação Ambiental (Ipeg). De acordo com Arce, o contrato foi necessário para que São Paulo tivesse uma garantia de energia caso não chovesse o suficiente e os reservatórios não tivessem se recuperado. "Se isso acontecesse, o governo seria cobrado", falou, esclarecendo que o valor que está sendo cobrado não será utilizado este ano, mas, quando necessário, na compra de energia no mercado, que caso não seja necessária, poderá ser revendida para abaixar o custo ao consumidor.

Seguro antiapagão

A diretora da Pró-Teste, Maria Inês Dolci, levantou diversos motivos que, do ponto de vista da associação, sustentam a argumentação para a suspensão imediata do seguro antiapagão. Para ela, as geradoras e distribuidoras estão livres da responsabilidade do serviço e foram premiadas com o total afastamento do risco do negócio, em desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor.

Elektro

O debate sobre a situação da Elektro e as conseqüências para o serviço público de energia ante a concordata da empresa norte-americana Enron, acabou ficando para uma outra ocasião, já que o representante da empresa e o diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), José Miranda Abdo, não compareceram e tanto o secretário como Moacir Andrade deixaram claro sua preocupação mas esclareceram que o assunto está fora da competência de ambos.

Nivaldo Santana, deputado pelo PCdoB, e responsável pela solicitação da reunião, fez uma série de perguntas sobre as privatizações, particularmente sobre a Elektro. Segundo Santana, a empresa atende a 228 municípios paulistas, num total de cerca de 1,6 milhão de pessoas; foi privatizada em 1998 por R$ 1,5 bilhão, com 98,8% de ágio sobre o preço inicial e por um período de 30 anos de concessão. Ainda de acordo com ele, a Elektro tem hoje um prejuízo de R$ 250 milhões e deve reduzir seus investimentos. "Precisamos saber o que vai acontecer com essa distribuidora da Cesp agora que a Enron, acionista da Elektro, está em processo de liquidação em virtude de constantes burlas à legislação dos Estados Unidos", disse Nivaldo Santana, relatando a seguir que uma subsidiária da Enron na Argentina, que detinha contratos de fornecimento de água e tratamento de esgotos para 72 distritos da província de Buenos Aires, não estava cumprindo as cláusulas contratuais. "Os argentinos romperam o contrato e reassumiram a água e o esgoto."

Questionado sobre os motivos das privatizações ocorridas no Estado de São Paulo, Arce afirmou que a privatização energética ocorreu mais por uma situação que o governador Mário Covas encontrou nas empresas paulistas do que por uma questão ideológica. Ele lembrou que o setor foi regulamentado num processo legislativo e que os contratos de concessão trazem, de um lado os direitos e de outro os deveres das duas partes; e ainda que o preço mínimo, sobre o qual se conseguiu mais de 98% de ágio, foi estabelecido por uma auditoria.

O presidente da Comissão de Privatização da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Paulo José Nogueira da Cunha, criticou as regras utilizadas para a venda de prestadoras de serviço público que, na sua opinião, não podem ser as mesmas que regem qualquer outro tipo de venda de empresa. "É uma relação diferenciada", disse o advogado completando que vai entrar também com uma ação civil pública. "Que regra é essa que a energia aumenta 18%, 20% e o salário do trabalhador 7%?"

Cunha relatou o processo de venda da Elektro. De acordo com ele, metade do capital social da empresa foi vendido para a Terraço, que pagou quase o dobro do preço inicial das ações. A empresa tinha, segundo Cunha, uma dívida com um banco americano e acabou sendo absorvida pela Elektro, que, por sua vez, tornou-se deficitária e acabou tendo o lote de R$ 33,00, quando, da primeira venda, valia R$ 10,00. Tudo isso teria ocorrido quando a Elektro ia começar a dar lucro. "Ela absorveu a dívida e deixou de arrecadar Imposto de Renda, fazendo com que o governo deixasse de arrecadar R$ 400 milhões. Talvez neste caso, a legislação seja madrasta, mas nós temos que defender os consumidores."

Sobre os possíveis futuros racionamentos de energia, o secretário disse que felizmente o Brasil tem grandes recursos hídricos e que vamos continuar com um sistema predominantemente hidrelétrico, ou seja, que depende das condições hidrológicas.

alesp