ROÇAR O CAMINHO - OPINIÃO

Arnaldo Jardim*
05/04/2002 16:21

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É cada vez mais nítida a percepção de que o Brasil tem uma vocação natural para o agronegócio. No ano de 2001, o saldo da balança comercial brasileira foi de US$ 2,642 bilhões, enquanto o da balança comercial agropecuária foi de US$ 14,74 bilhões, com destaque para o complexo soja, carnes, açúcar, café, couro, fumo e suco de laranja. Conclui-se que, sem a agricultura, o saldo positivo se transformaria num déficit de US$ 12,1 bilhões.

O que é muito, comparado com outros setores da economia, ainda é muito pouco se relacionado ao seu próprio potencial. Isto porque o desenvolvimento do mercado não tem acompanhado a evolução do sistema produtivo.

Foi realizado o dever de casa do ponto de vista da capacidade de produção, desenvolvimento de variedades, aprimoramento tecnológico, medidas fitossanitárias, cuidados ambientais, gestão e outros, o que nos coloca numa condição privilegiada. Somos os maiores produtores mundiais de cana-de-açúcar, laranja e café. Estamos entre os primeiros na produção de carne bovina, frango, milho, soja e na fruticultura.

Agora, o desafio que se apresenta é desenvolver mercados interno e externo, sob pena de acabarmos prisioneiros e vítimas da nossa competência em produzir. Começando pelo mercado interno há uma infinidade de ações possíveis. No caso do complexo soja, por exemplo, existe a possibilidade de explorar-se a produção de biodiesel. Além de gerar empregos e melhorar a performance ambiental do diesel nacional, a medida serviria para economizar divisas, exatamente num momento em que a tendência de alta do petróleo é inexorável.

Na atividade canavieira, recorro à contribuição recebida do diretor geral do Instituto Nacional de Eficiência Energética, Jaime Buarque de Hollanda, para quem "a energia das plantações de cana equivale a cerca de metade do petróleo produzido no País, mas as usinas são quase impedidas de vender eletricidade, que é preciosa porque disponível na época das secas". Ele lembra ainda que "a Câmara da Gestão da Crise de Energia, ao invés de valorizar este potencial, criou uma nova estatal para importar um lixo de geradores estacionados pelo resto do mundo, a peso de ouro, e enviou-nos a conta com um aumento de tarifa de 2% a título de seguro". Outras medidas estão no estímulo ao consumo de álcool hidratado, via aumento da produção e venda de carros a álcool; isto é possível com a adoção de medidas simples como a diferenciação de IPI para carros populares movidos por este combustível. Há também a possibilidade de se estimular a produção de veículos flexíveis, que rodem com gasolina ou álcool, uma alternativa tecnológica interessante e que permite ao consumidor optar pelo combustível mais conveniente.

Acresça-se que, na medida em que se consolida a atividade agrícola e aumenta o emprego e a renda no campo, ocorre uma inclusão social capaz de elevar o consumo per capita interno, o que atinge em cheio o mercado da maioria dos produtos agropecuários.

Do ponto de vista externo, existe um esforço gigantesco a ser feito conjuntamente por governo e setor privado no que diz respeito ao protecionismo dos países ricos. Esta ação, no entanto, precisa ultrapassar o campo diplomático e ganhar musculatura com representações na Organização Mundial de Comércio, contratação de escritórios de lobby na União Européia e em seus países membros, criação de forças-tarefa intersetoriais, campanhas publicitárias no exterior e articulações com as associações de consumidores dos países desenvolvidos. O sucesso da luta contra o protecionismo é a grande chave para o desenvolvimento sustentado da nossa economia. Alguns exemplos: no caso da soja e seus derivados, os US$ 5,2 bilhões de receita gerados pela exportação em 2001 poderiam ser acrescidos em mais de US$ 1 bilhão/ano, apenas com o fim da subvenção ao produtor americano; no açúcar, o Ministério da Agricultura brasileiro estima que o Brasil está deixando de exportar anualmente US$ 1 bilhão, por conta dos subsídios da União Européia ao seu setor açucareiro.

É preciso pois, ação para colocar o trem nos trilhos. Tanto melhor se tivermos, ao invés de administradores de caixa, governo de fato: pronto a promover políticas indutoras, coordenar ações entre setores, articular interesses comuns internacionais e sobretudo, capaz de acreditar que o agronegócio é a chave da nossa soberania.

*Arnaldo Jardim, 46, engenheiro civil, foi secretário da Habitação (1993), é deputado estadual, coordenador da Frente Parlamentar pela Energia Limpa e Renovável e presidente estadual do PPS

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