Democracia verdadeira

OPINIÃO - Mário Reali*
07/07/2003 17:00

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O deputado estadual Roberto Engler, em artigo no Diário do Grande ABC, dia 2/7, tentou explicar sua conduta na Assembléia Legislativa como relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2004. Na falta de argumentos mais consistentes, porém, preferiu atacar, indevidamente, o próprio Diário. Aproveitou para confrontar-se também com a bancada de deputados estaduais do ABC, tentando desqualificar as emendas que apresentamos coletivamente.

Engler vangloria-se por ser, há sete anos, o relator da LDO. Sou deputado há menos de quatro meses e não posso aqui avaliar uma atuação tão prolongada. Só espero que essa permanência deva-se mais a seus méritos que a seus defeitos. Infelizmente, não foi o que vi neste ano. A submissa bancada governista abdicou da obrigação de analisar e aprimorar o projeto imposto pelo Executivo. Como seu representante, o relator acatou, parcialmente, somente 15 das 911 emendas à LDO, de deputados de todos os partidos. Na Comissão de Finanças e Orçamento, ele havia rejeitado todas as emendas. Somente com uma grande pressão essa ínfima parcela de 1,6% das emendas foi aceita posteriormente.

Para tentar justificar tal absurdo, restaram no texto dois supostos argumentos. O primeiro, de que as 33 emendas da bancada do ABC são pontuais. Mas o PSDB sabe que as emendas do ABC não têm esse caráter pontual, mas são resultado de um importante processo político. A Câmara do ABC integra a sociedade civil e os diferentes níveis do Estado, numa oportunidade diferenciada de interlocução no território regional. As emendas do ABC não são apenas dos deputados, mas de todos os agentes políticos, incluindo sindicatos, empresários, ongs, prefeitos, vereadores e representantes do próprio governo estadual. Além disso, elas baseiam-se nos programas da Câmara Regional, que incluem os diversos acordos assinados pelo ex-governador Mário Covas e visam permitir que o governo do Estado cumpra esses compromissos.

O artigo ensina que emendas pontuais são "inclusões de verbas destinadas a obras específicas, como por exemplo recursos para a construção da ponte sobre o rio tal". Mas não é difícil entender que programas regionais de macrodrenagem, transportes, recursos hídricos, entre outros, não são obras específicas. Outra coisa é o fato de que o governo estadual recusa a regionalização do orçamento, porque rejeita a transparência e o controle social sobre os investimentos públicos e quer continuar drenando recursos apenas para as cidades que são de seu interesse (e ponha interesse nisso).

O segundo argumento do texto é que os deputados deveriam ter trabalhado "antes do envio da LDO ao Parlamento, junto às secretarias de Estado, para interferir no texto original do Executivo". Nada mais impróprio. Não cabe aos parlamentares correrem ao Executivo para fazer política de balcão. Nossa bancada participou onde deveria: na audiência "pública" realizada no ABC. Ocorre que o governo do PSDB, ao tratar das audiências públicas, despreza a participação popular. As audiências da LDO foram convocadas pelo Diário Oficial num sábado, para começarem na segunda-feira seguinte. Na audiência do ABC, apresentamos nossas propostas e denunciamos a precariedade de sua convocação. Pois bem, desafio o deputado Engler a mostrar uma única linha da LDO que tenha resultado de contribuição da sociedade nas audiências públicas, inclusive a do ABC. No final do artigo, o deputado ainda afirma que as emendas do ABC poderão ser consideradas no Plano Plurianual (PPA). Mas é sabido que o PPA, por referir-se a um período de quatro anos, exigirá uma outra elaboração, mais genérica, das propostas do ABC.

Penso que a suprema democracia sempre faz bem. Por isso, convido o deputado Engler a participar das próximas audiências públicas do PPA e a comprometer-se com esse processo. Mais que isso, convido-o a apoiar o Projeto de Lei que apresentei à Assembléia, regulamentando a divulgação e a realização das audiências, para que elas sejam verdadeiramente públicas.

Convido ainda o deputado Engler a vir conhecer as audiências do Orçamento Participativo nas cidades do ABC administradas pelo PT. Venha também à audiência pública do Plano Plurianual Federal, que o governo Lula promoverá em São Paulo. Por falar nisso, continuamos aguardando que o governador do PSDB divulgue logo sua proposta de PPA, como já fez o governo federal. Quem sabe da próxima vez os tucanos topem o debate, essencial para quem quer uma democracia verdadeira.

*Mário Reali é arquiteto, deputado estadual e presidente do PT de Diadema

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