Balanço da atividade parlamentar

Exclusão racial e questão indígena são debatidas na Assembléia
31/07/2003 16:55

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Da Redação

A desigualdade racial gerou debates na Assembléia Legislativa neste primeiro semestre de 2003. Temas como a exclusão que o negro ainda sofre no Brasil e a problemática indígena no País foram abordados em diversos eventos, nos quais se discutiram formas de preservar e valorizar a cultura e meios políticos de garantir direitos a essas comunidades.

A questão indígena

No dia 23 de abril, realizou-se o primeiro debate da Semana Villas Boas, "Os índios na formação do povo brasileiro", que contou com a coordenação da antropóloga Bethy Mindlin e dos expositores Regina Vasconcelos, geógrafa, e Renato Simões, deputado estadual (PT), que defendeu o projeto que cria o Conselho Estadual do Índio.

A geógrafa destacou características dos índios que constatou durante quatro anos de relacionamento com comunidades do Acre. "Os índios têm aprendido a registrar fatos, transformando o passado oral em presente escrito", disse Regina. "Os indígenas deixam marcadas em mapas localidades que já não mais existem, com a finalidade de resguardar a história". A capacidade que os índios têm de transitar entre os mundos material, espiritual e tecnológico também foi abordada pela geógrafa. "Eles acumulam experiências, ao invés do homem branco que, ao construir algo, acaba por destruir o que existia anteriormente."

Segundo Regina, a mobilização é outra habilidade que os índios desenvolveram. "Eles estão organizados em movimentos de luta por seus direitos, como a Associação dos Professores Indígenas do Acre e a União Nacional Indígena." A coordenadora do evento explicou que o Programa Acre é pioneiro no Brasil e que mudou o conceito brasileiro sobre educação indígena. "O Acre implementou o programa de formação de professores índios e ofereceu ao país uma nova forma de pensar o ensino para esse segmento."

"Minha abordagem será política e regional, uma vez que tratei da política indígena durante o período que presidi a Comissão de Direitos Humanos", disse Renato Simões, que também reafirmou a importância do projeto de lei, pronto para ser discutido e votado, que cria o Conselho Estadual do Índio. "Este órgão terá caráter deliberativo para discutir políticas públicas para o índio sem a participação direta do Estado." Segundo o deputado, a importância do índio na formação do povo brasileiro foi negada e marginalizada. "Pensar a vertente indígena foi ato excluído das preocupações acadêmicas", afirmou Simões, lembrando o incidente entre índios e policiais militares da Bahia durante as comemorações dos 500 anos do Descobrimento.

Simões falou sobre o relatório feito pela Comissão de Direitos Humanos a partir da oitiva de índios ao longo de audiências públicas realizadas em Parelheiros, Bauru, Pariquera-Açu (Vale do Ribeira) e Santos. "Paralelamente, os índios organizaram grupos de discussão para a formalização de demandas e elaboraram cartas de reivindicações." Simões enviou, ainda, requerimentos de informações aos secretários da Habitação, Educação, Justiça e Defesa da Cidadania e Assistência Social, cobrando resposta às reivindicações feitas pelas comunidades indígenas no relatório.

"O maior problema do índio em São Paulo é a questão da terra, uma vez que cerca de 5 mil índios ocupam 14 mil hectares", destacou Simões, ressaltando que o único governo que assumiu a tarefa de demarcar terras indígenas foi o de Franco Montoro, de 1983 a 1987, em parceria com a Funai.

Abolição da escravatura

Promovido pelo deputado Nivaldo Santana (PCdoB), foi realizado no dia 13 de maio ato público intitulado "Retrato da Exclusão do Negro no Brasil", data em que a abolição da escravatura completou 115 anos. Mais de um século depois, a mídia constatou que a condição do negro ainda beira a escravidão, uma vez que matéria publicada pela Folha de S. Paulo denunciou que os salários dos negros são, em média, 50% mais baixos que os recebidos pelos brancos. Esse quadro é que leva grupos de movimentos negros a afirmar que 13 de maio é dia de luta, não de comemorações.

Segundo Nivaldo, esse é um dos indicadores econômicos e sociais que expõem a grande desigualdade sofrida pela comunidade negra na sociedade brasileira. "Os negros têm menor escolaridade, empregos com menor qualificação e são a maioria entre os desempregados, e isto é uma herança da escravidão, agravada por uma situação de preconceito e discriminação que ainda existe no país". Para o deputado, a reversão desse quadro só será possível com dois componentes básicos: a luta pela igualdade social e as políticas afirmativas.

Esteve presente ao ato público Simone Diniz, vítima de racismo, que teve a denúncia contra um anúncio de um grande jornal levada à Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA. O classificado solicitava uma empregada doméstica, "preferencialmente de cor branca". Ao ligar para a contratante e informar que era negra, Simone foi dispensada sob a alegação de que o critério da cor da pele era importante. Também participaram do evento deputados do PT e do PSDB, os convidados Hélio Santos, Maria da Penha Guimarães, da Comissão do Negro - OAB/SP, Maria Dirce Pinho (Dida), do movimento "Fala Preta!", e representantes dos movimentos União de Negros pela Igualdade (Unegro), Comissão do Negro e de Assuntos Antidiscriminatórios da OAB/SP, do Departamento Jurídico do Instituto do Negro Padre Batista e do Grupo de Negros e Políticas Públicas da Assembléia paulista.

Umbanda e Candomblé

Também no dia 13 de maio, a Assembléia Legislativa sediou o pré-lançamento do V Congresso de Umbanda e Candomblé de Diadema e Grande São Paulo. Na abertura do evento, presidida pelo deputado Sebastião Arcanjo, o Tiãozinho do PT, salientou-se a importância do 13 de maio como dia nacional de denúncia ao racismo. "Hoje é o dia da valorização da história e cultura africana no Brasil, um dia de denúncia contra a discriminação no trabalho, na religião, na cultura e contra a violência policial aos descendentes afro-brasileiros", ressaltou Tiãozinho.

O deputado Nivaldo Santana (PCdoB), falou da necessidade de luta dos negros para a conquista de liberdade religiosa. "Nosso país é o país da diversidade racial. Essa pluralidade tem que ter como pilar fundamental o respeito à liberdade de culto religioso", afirmou. Para a deputada Maria Lúcia Prandi (PT), "o 13 de maio tem um sentido de denúncia, luta e resistência do povo negro na sociedade".

O coordenador geral do evento, pai Francelino de Shapanan, saudou o patrono do V Congresso e 1.º orixá cultuado em terras brasileiras: Ere Xangô. Segundo ele, Xangô é um deus político, preocupado com a sobrevivência do seu povo. "Nestes sete dias de estudos e reflexões vamos procurar o fortalecimento do povo do Axé com o Poder Legislativo, através do respeito aos rituais, à fé e à religião, procurando a igualdade com as demais crenças presentes no país", disse pai Shapanan. "Queremos um Brasil plural, em que o diálogo religioso possa promover a paz".

Durante o evento foram homenageadas personalidades e instituições que promovem a valorização da cultura negra. Entre os homenageados estão as escolas de samba Nenê da Vila Matilde, Império da Casa Verde e Mocidade Alegre; o grupo de afoxé Ilê Omo Dadá; o Ogan Antônio Basílio Filho; o professor da USP Carlos Eugênio Marcondes Moura, e José Walter Destefane.

alesp