Salário mínimo, promessa máxima

OPINIÃO - Vaz de Lima*
05/05/2004 17:50

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O presidente Lula recusa-se a comentar o pífio reajuste dado ao salário mínimo. O silêncio é ainda mais curioso se lembrarmos que, desde sua estréia na política, Lula, bem como tantos outros petistas, jamais deixaram de comentar o assunto, dando especial atenção a ele durante o governo do PSDB. O discurso petista era: "dobrar o valor real do salário mínimo é muito simples, os tucanos só não fazem por uma perversidade".

Em 1o de outubro de 98, por exemplo, Lula divulgou o seu "pacote contra a crise", o qual seria, segundo os petistas, a contribuição da oposição para que a crise fosse superada. Uma das propostas, era a duplicação do valor real do salário mínimo, promessa que, depois foi repetida na campanha eleitoral de 2002. Para dar a este "pacote" a aparência de propostas reais, as promessas, foram apresentadas na forma de decretos, medidas provisórias e outros projetos de lei; a duplicação do salário mínimo, por exemplo, seria enviado ao Congresso em caráter de urgência, caso Lula fosse eleito.

Antes disto, em julho do mesmo ano, Lula havia assegurado que em no máximo dois anos seria possível duplicar o valor do salário mínimo. No primeiro Dia do Trabalhador de FHC, Lula disse - no mesmo evento no qual ele se calou sobre o mínimo este ano - que "neste 1º de maio, a não ser pela data, nós temos é que chorar." Disse também que a única solução seria lutar para que "a população tenha maior consciência política para eleger um governo efetivamente trabalhador".

Mesmo a duplicação do valor não era suficiente para Lula. Em 1o. de outubro de 98 ele assegura: "aumentar o salário mínimo é uma questão de justiça com os trabalhadores. Se o valor tivesse sido reajustado de 1939 para cá, o mínimo estaria em R$ 1.100".

Lula perdeu aquela eleição, mas ganhou a seguinte. Contudo, até hoje o projeto jamais chegou ao Congresso. No Congresso também não ocorreu a nenhum parlamentar petista apresentar projeto de lei aumentando o valor do salário proposto pelo governo, tal como inevitavelmente ocorria antes do PT chegar à presidência. Será que Paulo Paim, que se celebrizou pelas críticas ao baixo valor do salário mínimo e os projetos de reajuste, terá ficado mudo?

Igualmente a CUT fez apenas comentários tímidos sobre a decisão de Lula quanto ao Mínimo. Não se viram nem passeatas, nem protestos, nem declarações bombásticas, tampouco ameaças de greve geral. Em 27 de janeiro de 95, menos de um mês depois da posse de Fernando Henrique, Lula puxava a orelha do PT e da CUT por não se mobilizarem em campanha nacional defendendo valores maiores para o salário mínimo - na época de US$ 100. O hoje presidente condenava os colegas sindicalistas dizendo que eles não ligavam para isto porque "não ganhavam salário mínimo". Atendendo as ordens, tanto o partido como seu braço sindical nunca mais perderam a oportunidade de criticar os reajustes do mínimo, até o ano passado.

Alguém poderia até argumentar que Lula fazia estas promessas impossíveis de serem cumpridas porque tinha vontade de mudar a situação do povo. Mas é preciso ver que os intelectuais petistas jamais deixaram de endossar as palavras do líder e argumentar que estes planos eram factíveis. O próprio Guido Mantega, que hoje, como ministro do Planejamento de Lula, vem dizer que o aumento maior do mínimo é impossível, contava outra história no passado.

Em artigo publicado na Folha de São Paulo de 18 de julho de 98, intitulado "O sonho possível", dizia que "basta recuperar o bom senso, ouvir menos os "conselhos" dos banqueiros internacionais e das elites retrógradas e reencontrar a rota do crescimento com justiça social". Assegurando que era possível não só dobrar o salário mínimo no primeiro ano como fazer diversas outras coisas que Lula agora diz não serem possíveis nem durante todo o mandato, Mantega assevera: "O assentamento de 1 milhão de famílias no campo, a concessão de 4 milhões de bolsas-escola, a elevação dos gastos com saúde até alcançarem R$ 250 anuais por habitante, a implantação do projeto de renda mínima, a duplicação do salário mínimo, a adoção do "médico de família" e outros projetos a serem implantados ao longo de quatro anos custarão, no primeiro ano, cerca de R$ 16 bilhões".

Teria ele errado nas contas antes ou desaprendido os cálculos que fazia? Em todo caso, o que transparece em todo o episódio do mínimo é o desmascaramento de duas farsas: a primeira de que o PSDB guiava-se por uma política "neoliberal" para cometer perversidades contra o povo, a segunda de que as soluções são mais complexas como o PT dizia ser.

*Vaz de Lima é líder da bancada do PSDB na Assembléia Legislativa e presidente da Comissão Parlamentar de Acompanhamento da Reforma Tributária do legislativo paulista.

alesp