É AGORA JOSÉ! - OPINIÃO

Arnaldo Jardim*
16/10/2000 18:22

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O Governo FHC insiste em propagandear que as perspectivas do país são boas, com uma economia estável e em crescimento. Ignora, para tanto, indicadores sociais negativos, como o crescimento da violência e da pobreza, e passa por cima de questões estruturais como a reforma tributária e déficit energético.

E olha nós novamente deparando-nos com premissas diferenciadas para analisar a situação do país. Aqueles que analisam a economia sob a ótica financeira até podem (nem eles deveriam) achar que as perspectivas econômicas do Brasil são razoáveis. Ao mesmo tempo, quem tem a consciência de que com a perpetuação das desigualdades não existe crescimento econômico ou perspectiva de desenvolvimento sustentável, tem razões de sobra para preocupações.

A pesquisadora Sônia Rocha, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, órgão ligado ao Ministério do Planejamento, constatou em pesquisa divulgada recentemente que de 98 para 99 o número de pobres do país cresceu de 51,3 milhões para 54,4 milhões, o que representa respectivamente 33,4% e 34,9% da população. Essa mesma pesquisa indica que o número de indigentes caiu de 13,9% para 13,6% da população.

A pesquisa considera que pobre é quem consegue comer o mínimo necessário mas não ganha o suficiente para roupa e moradia. Já o indigente é aquele que não alcança renda suficiente para o atendimento de suas necessidades básicas de alimentação. Pois bem, em um ano tivemos o crescimento de 1,5% dos pobres e uma queda de 0,3% nos indigentes. Entre pobres e indigentes são 70 milhões de brasileiros ou quase a metade da população do país, e mesmo assim tem gente que insiste em defender que esses números trágicos decrescerão naturalmente com a solidificação do mercado, crescimento da economia e outras considerações do gênero.

Isso não é verdade. Precisamos mudar já e radicalmente o conceito de desenvolvimento. Temos de entender que o crescimento estatístico da pobreza não ocorre impunemente. Junto com a pobreza vem o desmantelamento da família, o aniquilamento dos valores éticos, a desagregação social. Os reflexos disso estão nas unidades lotadas da Febem, nos menores abandonados nas ruas, no crescimento da marginalidade, na explosão da violência e em tantas outras coisas ruins que estão aí e que muitas vezes fingimos serem males que podem ser combatidos apenas com repressão e fortalecimento das polícias.

Uma sociedade que abriga a miséria é pobre de espírito e incapaz de ser feliz. Não adianta a sociedade dos incluídos esconder-se nos guetos dos condomínios fechados, dos circuitos de segurança, em escolas cada vez mais elitizadas. Se os excluídos não forem resgatados eles "invadirão cada vez mais a nossa praia" e o convívio social ficará insuportável. Como diria o poeta Drumond, "com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora?"

É agora José, João, todos nós! É hora de enfrentarmos o desafio de diminuir a pobreza e resgatar a dívida social. É uma tarefa urgente do Estado e da sociedade brasileira.

alesp