UMA CRISE ANUNCIADA - OPINIÃO

Caldini Crespo*
14/05/2001 17:22

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Apagões, multa para quem não reduzir o consumo de energia, bônus para quem consumir menos, racionamento. Essas expressões têm feito parte do dia a dia dos brasileiros nas últimas semanas e gerado um grande número de tentativas de explicações e justificativas por parte das autoridades federais, a quem cabe gerir o setor energético no país. Lembro que há pouco mais de vinte anos, quando ainda era estudante de engenharia elétrica, já se prenunciava que se não houvesse mais investimentos no setor de geração de energia o Brasil acabaria tendo que enfrentar os problemas que hoje vemos estampados em todos os jornais: a incapacidade do setor energético de abastecer todo o país com energia elétrica.

Essa incapacidade decorre não exatamente da inexistência da energia elétrica em si. Explico: os sucessivos governos não tiveram a capacidade de realizar um trabalho sério de interligação das diferentes regiões geográficas do país, através de torres de transmissão de energia, de modo a possibilitar remanejamentos de energia das áreas onde existe uma demanda menor para onde houvesse maior demanda. Não houve, também, um trabalho contínuo de construção de hidrelétricas no país, com muitas obras iniciadas ficando paralisadas anos a fio, mesmo se sabendo que uma obra dessas pode levar mais de uma década para ser concluída.

O investimento em formas alternativas de geração de energia também não existiu. As usinas termoelétricas movidas com o gás natural vindo da Bolívia poderiam ser uma realidade no Brasil, caso a Petrobrás não tivesse atravancado sua instalação durante anos. A produção de energia eólia (a partir do vento) é outra ação que nunca recebeu uma maior atenção de parte do governo. Nunca houve linhas especiais de financiamento do BNDES para a compra de geradores de energia, que além de proporcionar uma economia da energia produzida pelas hidrelétricas, seria um fator de geração de novos empregos nas empresas produtoras desses equipamentos.

O grande problema é que não se pode acumular energia, como se acumula água em um reservatório. Apesar de todo o avanço da tecnologia, o homem ainda não desenvolveu uma bateria capaz de armazenar grandes quantidades de energia de modo a possibilitar-lhe uma reserva para momentos de saturação.

Essa impossibilidade de armazenamento, aliada à falta de investimentos no setor, gera crises como a atual. E estas acabam por denunciar, inclusive, a falta de criatividade do governo federal na adoção de medidas emergenciais. Quando o presidente Fernando Henrique Cardoso desautorizou a Aneel a multar o consumidor que não reduzisse o seu consumo de energia elétrica, ele não o fez por consideração social. Fez sim para evitar o que poderia se configurar um caos político e eleitoral para o PSDB. A multa seria o primeiro passo; logo depois a população - que já sofre para pagar a conta normal - não teria condições de pagar a punição. A etapa seguinte seria o corte no fornecimento de energia. Em pouquíssimo tempo estaria estabelecida uma situação de inadimplência tamanha que conduziria as concessionárias de energia à falência.

Da mesma forma, o desconto anunciado pelo presidente FHC também precisa ser melhor explicado. Afinal, de onde virá o dinheiro para compensar os "prejuízos" das concessionárias de energia? Não podemos nos iludir. Essas empresas não fazem caridade e têm contratos muito bem amarrados com o governo de modo a garantir-lhes o lucro. Então, de onde virá o dinheiro para pagar essa diferença?

Melhor seria o governo incentivar o uso da energia na atividade industrial, por exemplo, durante os períodos em que a demanda é mais baixa (durante a noite/madrugada), oferecendo compensações que poderiam ser repassadas aos trabalhadores em forma de incentivo salarial àqueles que aceitassem uma mudança, ainda que temporária, em sua jornada de trabalho.

Ainda assim, essas medidas precisam ser encaradas como paliativos. Soluções duradouras dependem de políticas energéticas definidas e racionais, com investimentos não apenas na construção de novas usinas, mas principalmente da interligação total do sistema, de modo a permitir mandar a energia que está sobrando para onde ela está faltando.

*Caldini Crespo é deputado estadual pelo PFL.

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