China: risco ou oportunidade?

Opinião
27/04/2006 19:54

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A recente visita do presidente da China, Hu Jintao, aos Estados Unidos, trouxe à tona as preocupações do mundo em relação às práticas comerciais do gigante asiático. A ditadura comunista que se abriu ao capitalismo, no fim da década de 70, se tornou "a terra das oportunidades". Uma ascensão capaz de abalar a hegemonia do Ocidente mais o Japão, estabelecendo uma nova ordem mundial.

Não precisa ser economista ou especialista em comércio internacional para perceber a enxurrada de produtos chineses em nossas gôndolas. São calçados, roupas, óculos, eletrodomésticos, uma infinidade de produtos que estampam "Made in China". Com seus preços absurdamente baratos, as compras de bens de consumo daquele país pelos brasileiros aumentaram em mais de 50%, nos últimos meses, o que tem ocasionado dificuldades para vários setores tradicionais da nossa economia.

A bem-sucedida experiência chinesa no mercado internacional é fruto de um conjunto de fatores: mão-de-obra barata, protecionismo comercial, moeda desvalorizada, grande mercado interno, investimentos em infra-estrutura e ausência de legislações ambientais e trabalhistas. Mesmo assim, o Governo Lula reconhece a China como uma economia de mercado, sendo um dos avalistas para sua entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC), deixando para trás alguns pontos importantes.

Na China, o Estado é o eixo central das decisões, proprietário das maiores instituições. O crescimento econômico do país vem das exportações, que respondem por 40% do PIB. Entre 2001 e 2005, as vendas externas cresceram algo em torno de 137%, chegando a US$ 2,6 trilhões. Já as importações aumentaram 28%, para US$ 2,2 trilhões.

O trabalhador braçal chinês trabalha doze horas por dia, recebe US$ 30 mensais no campo e US$ 70 na cidade, enquanto a mão-de-obra qualificada urbana pode receber até US$ 500, além de um adicional por produtividade. Uma vez trabalhando, o governo garante saúde, educação e moradia, ou seja, quem recebe US$ 30,00 não vive abaixo da linha da pobreza, se equipara à nossa classe baixa. Isso, em meio à ausência de leis trabalhistas e com uma população de 1,6 bilhão de pessoas.

O segundo item é o sistema de câmbio. Desde julho de 2005, os chineses têm uma moeda "flutuante", o renminbi (yuan), que hoje está no patamar de 8,02 yuans para cada US$ 1, mas especialistas garantem uma desvalorização de 3%, ainda este ano. Se o país mantiver o crescimento do primeiro trimestre, a projeção de crescimento de 9,5% deve chegar a impressionantes 10,2 %, em 2006.

Mesmo sem contar com um Judiciário independente e de passar por uma indefinição em relação à propriedade privada, um sistema bancário estatal e precário, uma lei de patentes "frouxa" e uma tensão comercial com os Estados Unidos e a União Européia, os grandes mercados ocidentais têm investido no país, transformando-o em fonte de lucros por oferecer a melhor relação custo beneficio.

Em 2004, empresas norte-americanas com operações na China lucraram US$ 3 bilhões e investiram outros US$ 51 bilhões só no ano passado. Em 1980, eram somente 23 empresas dos EUA que operam na China, hoje, já são 49 mil empresas. O investimento externo não tem se mostrado meramente especulativo, pois várias empresas chinesas, inclusive algumas essenciais, foram compradas por multinacionais como Wal Mart, Carrefour, Kodak, ZF (alemã), obrigando o governo chinês a pensar em salvaguardas para o os setores de comércio e serviços.

Enquanto o mundo investe no mercado interno chinês, 90% das exportações brasileiras para a China são baseadas em commodities. Em suma, exportamos produtos sem valor agregado, o que não garante um vínculo comercial duradouro. Em sua última viagem a China, o presidente Lula exortou mais agressividade às empresas brasileiras em exportar, mas foi incapaz de estabelecer acordos comerciais com a inclusão de produtos com maior valor agregado, aproveitando o grande potencial de consumo interno chinês.

O "resumo da ópera" é que o Governo Federal precisa mudar de foco " o Brasil deveria fazer parte do crescimento econômico chinês. Por exemplo, na área dos biocombustíveis, onde somos uma referência mundial, poderíamos ser parceiros estratégicos, aliando a crescente necessidade chinesa por energia com as pressões internacionais em torno da preservação ambiental. O Brasil poderia exportar não apenas o álcool ou o biodiesel, mas veículos flexíveis, caldeiras para co-geração de energia, equipamentos, plantas de produção e o "know how" necessário para o desenvolvimento de toda uma cadeia produtiva de biocombustíveis na China, forjando ligações comerciais mais fortes, diante da criação de centros de manutenção e de vendas naquele país.



*Arnaldo Jardim

Presidente da Comissão de Relações Internacionais da ALESP

arnaldojardim@arnaldojardim.com.br

www.arnaldojardim.com.br

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