OPINIÃO - Fala, Alencar!


07/04/2005 08:32

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Milton Flávio*

"Se não houver mudança radical, o país estará liquidado. Entre todos os países civilizados, o Brasil é o único que adota essa política monetária. O país está liquidado com essa taxa de juros, não podemos continuar assim. Os pontos anunciados na campanha presidencial ainda não saíram do papel. Nosso discurso de campanha não assumiu o poder. A falta de recursos atinge as estradas de ferro, portos e aeroportos, coisas urgentes que não estão recebendo financiamento, como é o caso do saneamento básico. Também há falta de investimento em saúde e educação. Não houve obra de recuperação. Nada. Por quê? Porque faltou dinheiro onde não deveria ter faltado".

Preocupe-se o leitor. Embora concorde com tudo o que está escrito acima, não sou o autor do comentário. Se fosse, não faltaria quem o tratasse com desdém, como se fosse birra de deputado de oposição ao PT. O primeiro parágrafo é mera reprodução do que disse José Alencar, vice-presidente da República e ministro da Defesa, ao jornal "Estado de Minas", em entrevista publicada no dia de 20 de março. Tenho certeza absoluta que ele conhece o governo federal muito melhor do que a maioria de nós. Daí a relevância de suas palavras.

Cresce a cada dia entre os analistas políticos independentes a certeza de que o governo Lula não tem, como nunca teve, um projeto claro para o desenvolvimento econômico e social do país. Na área política, o que temos é retrocesso. Não bastassem as diversas tentativas de cercear a liberdade de expressão de jornalistas, produtores culturais, promotores públicos e funcionários de carreira, o que se assiste é um aparelhamento do Estado como jamais se viu e o recrudescimento de práticas fisiológicas. A bem da verdade, o governo Lula da Silva em sua relação com o Congresso Nacional nada inovou. Ao contrário. Aprofundou práticas que há muito deveriam ter sido abolidas.

Voltemos à fala do vice-presidente. Os números estão aí, à disposição de todos nós, para mostrar que nos dois últimos anos (gestão Lula) o governo investiu em saneamento básico o equivalente a cerca de 10% do que foi gasto em 2001 e 2002, último biênio da gestão FHC. É certo que o presidente não se dá por vencido. Contra os números oficiais, afirma o contrário. Talvez porque ele próprio acabe crendo em suas bravatas.

É certo que boa parte do dinheiro que poderia ser investido em saúde, educação, estradas de ferro, rodovias, portos e tudo o mais é gasto com a dívida pública, que não pára de crescer por conta dos juros astronômicos fixados pelo Banco Central. Mas é igualmente certo que a falta de investimento em áreas fundamentais também deriva de gastos desnecessários, que são fomentados pelo, por assim dizer, jeito petista de governar.

Alguns números falam por si. Estudo promovido pela Assessoria Técnica do PSDB na Câmara Federal revela que, em termos nominais, sem descontar a inflação, em 2004, o atual governo arrecadou R$ 79,5 bilhões a mais do que em 2002, último ano da gestão FHC. Deste total, nada menos que 63% foram gastos com despesas correntes e encargos sociais; 24% foram reservados para compor o superávit fiscal; 1,2% destinado a novos investimentos. Em dois anos, a administração petista contratou 73.787 funcionários, sem contar os 35 mil mata-mosquitos, contratados temporariamente. Projeções indicam que, em 2005, pouco menos de 50 mil novos funcionários poderão ser contratados.

Não é tudo. Dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI) revelam que, no gabinete da Presidência da República, os gastos com serviços de terceiros cresceram nada menos do que 257% em dois anos, saltando de R$ 72,2 milhões em 2002 para R$ 258,3 milhões em 2004.

Por essas e outras, é que não dá para deixar de dar razão ao vice-presidente Alencar. "Se faltou dinheiro onde não deveria ter faltado", para usar uma expressão sua, é porque ele foi e vem sendo mal gasto pela gestão petista. Enquanto isso, a carga tributária só faz crescer.

*Milton Flávio é deputado estadual pelo PSDB-SP e professor de Medicina da Unesp

miltonflavio@al.sp.gov.br

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