Opinião - O trabalho escravo na Região Sudeste do país


20/01/2010 18:26

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Nesta quarta-feira, 20/1, o portal de notícias G1 apresentou uma reportagem que trata da violação de um direito fundamental do ser humano, a liberdade. Depois de mais de um século de abolida oficialmente a escravidão no país, o crime continua sendo praticado com frequência e com a certeza da impunidade, principalmente em áreas de difícil acesso. A escravidão contemporânea dispensa grilhões, mas é considerada mais cruel por manter em cativeiros os trabalhadores que, infelizmente, ignoraram tal crueldade em troca de comida e de salários humilhantes e incompatíveis às necessidades básicas de qualquer ser humano.

Na reportagem, o portal de noticiais afirma que a região Sudeste do Brasil lidera a lista de trabalhadores resgatados em condições "semelhantes à escravidão", conforme levantamento do Ministério do Trabalho. Este levantamento, que foi concluído há poucos dias, mostra o número de trabalhadores resgatados em vários Estados. No entanto, esta foi a primeira vez que a região superou todas as outras " incluindo a Norte e a Nordeste, onde tradicionalmente o trabalho escravo é mais combatido " e chegou à marca de 1.068 resgates. A fiscalização do Ministério do Trabalho teve início em 1995.

Para se ter uma ideia, o número divulgado representa 30% de todas as ações realizadas no ano passado que terminaram em libertação de trabalhadores. Em números absolutos, foram 3.628 trabalhadores que puderam voltar a usufruir o direito constitucional à liberdade. No mínimo, isso demonstra a necessidade de reflexão acerca da escravidão contemporânea e de urgente elaboração de ações rigorosas que punam aqueles que ainda mantêm em regime de escravidão os nossos trabalhadores. Não podemos permitir que notícias como a divulgada pelo portal G1 passem despercebidas.

Não devemos ser cúmplices de um "mercado de trabalho" que se fundamenta na mediocridade e na covardia para se enriquecer à custa da escravidão, do sofrimento de homens e mulheres, onde o lucro aparece como prioridade diante do respeito à vida. Ainda segundo o portal de notícias, o Rio de Janeiro foi o Estado que registrou o maior número de casos de escravidão, com 521 trabalhadores libertados, deixando para trás o Pará (326) e o Mato Grosso (308), que figuram nas primeiras posições. Minas Gerais teve 410 registrados, enquanto o Espírito Santo contabilizou 99 libertações e São Paulo 38.

Estes trabalhadores foram resgatados em condições tratadas no artigo 149 do Código Penal, que dispõe sobre o "trabalho forçado, servidão por dívida, jornada exaustiva ou trabalho degradante". É neste artigo que se fundamentam as operações da equipe formada por auditores fiscais, procurador do Ministério do Trabalho e agentes da Polícia Federal, que investiga as denúncias da prática de trabalho escravo. Há, ainda, a Convenção 29 da OIT, que considera forçado "todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob a ameaça de alguma punição e para o qual o dito indivíduo não se apresentou voluntariamente".

Apesar do fato de a região Sudeste ter recebido notoriedade por liderar a lista de trabalhadores resgatados em condições "semelhantes à escravidão", é importante destacar que o número de trabalhadores escravizados no país é ainda maior e varia entre 25 mil a 40 mil, segundo cálculo da Comissão Pastoral da Terra. A pecuária e o desmatamento são as áreas que ainda respondem por três quartos da incidência de trabalho escravo. Atividades agrícolas, de extração de madeira e produção de carvão também registram muitos casos semelhantes. Desta forma, volto a destacar a necessidade de reflexão e de ações rigorosas.

A erradicação do problema não depende apenas dos poderes públicos constituídos, mas de toda a sociedade. Denunciar a ação daqueles que mantêm trabalhadores na condição de escravos é mais que um simples ato de cidadania, pois se trata de uma ação humanitária. Não podemos aceitar que fatos, como o divulgado pelo portal de notícias G1, sejam entendidos como "normais" numa sociedade que valoriza e luta pelos seus direitos; uma sociedade que para ter garantido esses direitos também precisa compreender, de uma vez por todas, a importância dos seus deveres. Todos nós temos esse compromisso!



*Edmir Chedid é advogado, deputado estadual pelo Partido dos Democratas e presidente da Comissão de Transportes e Comunicações da Assembleia Legislativa.

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