Na Roma republicana existia uma ilusão de democracia, apenas o suficiente para dar à população a impressão de que ela participava do processo de discussão através dos plebiscitos. Na prática estas enormes assembléias da população tinham pouca influência efetiva porque o magistrado que presidia a Assembléia tinha o poder absoluto de designar o objeto do voto, ninguém mais podia falar e só se podia votar sim ou não. A grande maioria dos parlamentos começou assim, ainda hoje há um aspecto importante, um dos elementos essenciais do poder político que é chamado de "poder de agenda", ou seja, a capacidade de definir o que será debatido.A grande verdade é que nós parlamentares deixamos em grande parte hoje de exercer este "poder de agenda", como seria legítimo que o fizéssemos como representantes da sociedade. Muito da nossa agenda hoje vem da imprensa, das manchetes de jornal, em grande parte por conta das nossas próprias deficiências acabamos nos submetendo a esta agenda discutindo de forma superficial e fragmentária aquilo que está nas manchetes de jornal e apenas durante o tempo em que estão nas primeiras páginas. Debatemos conforme for a primeira página do jornal de amanhã.O resultado disto é que o debate é superficial, por ser superficial o papel da Assembléia Legislativa é diminuído perante a sociedade e portanto o papel de cada um dos deputados também é diminuído. Assim como é que vamos conseguir promover discussão se não conseguimos reunir um debate sobre uma questão específica com tempo razoável para que de forma séria possamos produzir um resultado de qualidade para a sociedade?Sem dúvida, aquelas questões que estão nas manchetes são importantes, mas os parlamentares foram eleitos pela sociedade justamente porque ela viu em cada um de nós a capacidade de liderar, de guiar, de encontrar soluções, não porque julgou que seríamos arrastados pelas correntes e torrentes de opinião. Na medida em que os parlamentares se deixam levar pelas premências da mídia abrem mão de seu "poder de agenda" e, por se sentirem fracos cortejam a imprensa através de jogos de cenas diversos.Não tenho dúvidas de que uma parte ponderável desta situação de fragilidade na qual a Assembléia Legislativa se encontra é responsabilidade dos próprios parlamentares. Não sei e nem estou muito preocupado como isto começou, sei que quando cheguei à Assembléia " e já estou no terceiro mandato " já era assim e foi piorando. Enquanto subsistir os "pacotes natalinos" nos quais cada deputado indica um projeto para ser aprovado e aprova-se tudo sem nem saber direito o que está sendo votado será difícil que o Legislativo Paulista " e diversos outros porque esta é uma prática comum " consiga oferecer uma proposta efetiva de políticas públicas de qualidade nos vários setores.Não acredito em apontar problemas sem apontar soluções. As soluções que vejo podem até não ser as melhores e estou certo que qualquer um dos outros 93 deputados estaduais e centenas de lideranças da sociedade civil poderiam acrescentar outros aspectos relevantes a estas propostas. Mas é a partir de uma proposta concreta e delimitada que se pode fazer a discussão avançar, como sabem todos aqueles que trabalham em equipe, é neste espírito de iniciar o debate em torno de algo objetivo que vislumbro alguns caminhos alternativos.O Parlamento tem seu tempo de maturação das idéias, até pela sua própria natureza plural, sua necessidade de transformar a diversidade de opiniões em uma síntese o mais consensual possível de visões políticas, sociais e econômicas distintas. Não refuto em momento nenhum esta necessidade e lamento a pouca capacidade da imprensa de compreender esta necessidade de maturação.Porém este tipo de debate não é o que se faz no plenário debaixo dos holofotes da mídia, não é o que se obtém através das "obstruções vazias" quando a oposição simplesmente tenta impedir ou retardar alguma votação utilizando-se de expedientes regimentais utilizados para outros fins que não os previstos inicialmente. A obstrução tem de ser técnica e visar de alguma forma melhorar a idéia original, não pode ser mero instrumento das disputas políticas, despreocupada dos problemas da sociedade.Assim de um lado é necessário agilizar o processo de votação, limpar o entulho de diversos "acordões de natal" formados por projetos que em grande parte jamais foram discutidos na Assembléia e foram vetados. Ao mesmo tempo é preciso fortalecer as Comissões Permanentes, que devem ser o espaço qualificado para a discussão especializada daqueles que têm interesse e conhecimento em um determinado tema, que têm seus mecanismos para mais do que apenas propor leis de ocasião possa pensar em profundidade em políticas públicas e definir coletivamente, inclusive com a participação da sociedade civil, uma legislação de qualidade que contribua para a formulação desta política.Como exemplo de ação bem sucedida utilizando este método cito a "Política Estadual de Resíduos Sólidos", produzida na legislatura anterior por um conjunto de oito deputados, a partir de um debate aprofundado e orientado a partir das questões técnicas e das necessidades políticas, não pelas agendas vindas externamente.*Rodolfo Costa e Silva, engenheiro sanitarista e advogado, é deputado estadual do PSDB.