FUGAS NOS PRESÍDIOS E OS "FACTÓIDES" DO GOVERNADOR - OPINIÃO

Renato Simões*
08/06/2001 14:00

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A Assembléia Legislativa de São Paulo acaba de constituir a CPI do Sistema Penitenciário. O que nos motivou a criar essa nova CPI foram inúmeras denúncias de fugas de traficantes e transferências fraudulentas de presos ligados ao crime organizado levadas à CPI estadual do narcotráfico, da qual participei como coordenador do grupo de trabalho que investigou a ação do narcotráfico através das rotas aéreas e, finalmente, como relator geral.

A megarrebelião ocorrida nos dias 18 e 19 de fevereiro, que atingiu cerca de 30 estabelecimentos prisionais de São Paulo, reforçou ainda mais a vontade política da Assembléia Legislativa em colaborar com o Estado na definição de uma política penitenciária capaz de deter o crime organizado e de instaurar uma nova fase na vida dos presídios deste Estado.

O que mais chama a nossa atenção na crise penitenciária atual é que o Estado vem assistindo de forma absolutamente perplexa à perda de controle público sobre o Sistema. Há poucos dias, diante de mais uma ação ousada de resgate de presos, o governador Geraldo Alckmin veio a público para dizer que tinha encontrado a solução para o problema dos resgates de presos: os detentos passariam a ser transportados acorrentados. Infelizmente, trata-se de mais um "factóide" daquele que, enquanto autoridade, devia estar pensando medidas mais amplas e eficazes.

O Estado de São Paulo, com certeza, dispõe de instrumentos muito mais eficazes para conter o grave problema dos resgates e das fugas de presos do que simplesmente mandar acorrentá-los. Esperamos que a CPI do Sistema Penitenciário aponte nessa direção, para que o governador do Estado de São Paulo, na falta do que falar a respeito desse assunto, não tenha de lançar mão dessa medida pirotécnica e dizer que vai resolver um problema tão grave através de correntes. Aliás, o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Márcio Bonilha, vai no caminho oposto ao sugerido pelo governador Geraldo Alckmin e, diga-se de passagem, num caminho muito mais promissor. O desembargador fala em modificações estruturais no Código de Processo Penal para permitir a informatização do processo interrogatório de presos através de meios hoje disponíveis na tecnologia da informação, que permitiriam a um juiz interrogar um preso através de um sistema integrado de computadores em locais muito distantes. Fala ainda em uma outra mudança que não depende de modificações do Código de Processo Penal nem de novas tecnologias. Fala de uma seletividade na marcação das audiências de instrução de processo, para que, quando houver fundadas razões sobre a periculosidade de determinados interrogados, a audiência possa ser remarcada ou o juiz possa se deslocar até a unidade penitenciária para ouvir o depoimento do preso. Essa prática já foi testada em Osasco e pode ser usada, através de decisão do Tribunal de Justiça, para outras unidades, que devem ser preparadas para permitir que o juiz de direito exerça a sua função sem nenhum deslocamento de preso e sem nenhum risco à segurança pública. Precisamos desse tipo de sugestão para ser discutida. Não precisamos dos "factóides" do governador do Estado de São Paulo. Não precisamos de um governador que fala o que lhe convém diante de um processo tão grave e complexo, apresentando propostas simplistas e de eficácia praticamente nula.

*Renato Simões é deputado estadual pelo PT, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa, relator da CPI do Narcotráfico e membro efetivo da CPI do Sistema Penitenciário.

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