O ESTALO QUE MATA - OPINIÃO

Hamilton Pereira*
11/06/2001 14:37

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Chama a atenção de quem lê cotidianamente a imprensa sorocabana a quantidade de pessoas presas em flagrante na cidade por posse de crack. São raros os dias em que se abrem os jornais locais e não se lêem notícias sobre o assunto. O que me deixa entristecido é que parte dos presos são menores de idade ou com até 20 anos. É a nossa juventude matando seus anos dourados.

No dia 18 de maio último, por exemplo, o Cruzeiro do Sul revela que a "PM apreende 37 pedras de crack com rapazes" - uma menor de 16 anos e um jovem de 19. Dias antes, o mesmo jornal traz uma notícia chocante: vizinhos denunciam à polícia uma mãe viciada e prostituída que abandonara, com fome, seus dois filhos, não sem antes vender utensílios de sua casa para comprar drogas.

O crack surgiu nos anos 80 nos guetos pobres do Bronx, bairro de Nova Iorque, e se tornou a droga mais consumida nos Estados Unidos. Em inglês pronuncia-se "creck", por imitar o estalo da droga - mistura de cocaína com bicarbonato de sódio - quando queimado para aspirar. É fumado em cachimbos improvisados com copos de iogurte ou tubos de PVC. No Brasil, virou "crack".

Em São Paulo, o crack chegou no final da década de 80, na Zona Leste da Capital. Rapidamente se expandiu para outras regiões da cidade. Hoje é consumido em praticamente todos os médios e grandes centros urbanos paulistas. O consumo se expandiu de forma fulminante devido ao preço, bem mais barato do que a cocaína, e pela potencialização dos seus efeitos.

Sua capacidade de viciar é rapidíssima. Basta fumar de três a cinco vezes que o corpo e a mente passam a exigir mais e mais. Leva à degradação física, psíquica e social. Se consumir diariamente por dois anos, o viciado terá a destruição total de seu sistema nervoso. Menores de idade passam a roubar e assaltar para comprá-lo. Ao fazerem qualquer coisa para obter a droga, podem tanto matar como morrer em assaltos ou nas mãos de traficantes devido a dívidas.

Uma das poucas pesquisas sobre jovens e a droga, realizada em 1995, pelo Grupo Interdisciplinar de Estudos de Alcoolismo e Farmacodependência, do Hospital de Clínicas de São Paulo, com adolescentes entre 12 e 17 anos, revelou que 100% dos viciados diziam que o crack era o seu problema. Isso não acontecia com os alcoólatras (25%) ou consumidores de cocaína (73%). Outro dado da pesquisa: 85% dos viciados em crack descambaram para a marginalidade.

Hoje essa droga mortal atinge todas as classes sociais, como indica o aumento da demanda de viciados em clínicas particulares de tratamento a drogados. Os traficantes têm papel relevante nesse processo. De um lado, ao recrutarem menores pobres para formar seus exércitos de vendedores; de outro, por transformarem o consumo em moda e levá-lo às escolas ou redutos das classes média e alta.

O consumo de crack é um problema de saúde pública. Alertas sobre a epidemia de crack em nosso Estado ocorrem há tempo. O ex-presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Odyr Porto, propôs há seis anos um programa de educação intersecretarias por entender o caráter público da questão. Apesar dos alertas, houve e há omissão das autoridades sobre o assunto.

Quero aproveitar este espaço para chamar a atenção da sociedade, principalmente de pais e mães, sobre o que está ocorrendo em nossas cidades. Devemos refletir sobre a ineficácia das políticas de prevenção e repressão às drogas e o que cada um de nós pode fazer para reverter essa maldição chamada crack.

Um bom começo pode ser a aplicação da lei de minha autoria que institui o Programa Interdisciplinar e de Participação Comunitária para Prevenção e Combate à Violência nas Escolas da Rede Pública de Ensino, que procura combater, entre outras fontes de violência, o consumo e o tráfico de drogas.

Por fim, como defendo o conceito de inclusão social dos jovens - e não de isolamento, pois isto os empurraria ainda mais para a marginalidade -, é necessário também fortalecermos o trabalho que entidades de defesa dos direitos das crianças e adolescentes vêm fazendo em Sorocaba, prevenindo e orientando nossa juventude.

*Hamilton Pereira é deputado estadual (PT) e 1.º secretário da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

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