Chama a atenção de quem lê cotidianamente a imprensa sorocabana a quantidade de pessoas presas em flagrante na cidade por posse de crack. São raros os dias em que se abrem os jornais locais e não se lêem notícias sobre o assunto. O que me deixa entristecido é que parte dos presos são menores de idade ou com até 20 anos. É a nossa juventude matando seus anos dourados.No dia 18 de maio último, por exemplo, o Cruzeiro do Sul revela que a "PM apreende 37 pedras de crack com rapazes" - uma menor de 16 anos e um jovem de 19. Dias antes, o mesmo jornal traz uma notícia chocante: vizinhos denunciam à polícia uma mãe viciada e prostituída que abandonara, com fome, seus dois filhos, não sem antes vender utensílios de sua casa para comprar drogas.O crack surgiu nos anos 80 nos guetos pobres do Bronx, bairro de Nova Iorque, e se tornou a droga mais consumida nos Estados Unidos. Em inglês pronuncia-se "creck", por imitar o estalo da droga - mistura de cocaína com bicarbonato de sódio - quando queimado para aspirar. É fumado em cachimbos improvisados com copos de iogurte ou tubos de PVC. No Brasil, virou "crack".Em São Paulo, o crack chegou no final da década de 80, na Zona Leste da Capital. Rapidamente se expandiu para outras regiões da cidade. Hoje é consumido em praticamente todos os médios e grandes centros urbanos paulistas. O consumo se expandiu de forma fulminante devido ao preço, bem mais barato do que a cocaína, e pela potencialização dos seus efeitos. Sua capacidade de viciar é rapidíssima. Basta fumar de três a cinco vezes que o corpo e a mente passam a exigir mais e mais. Leva à degradação física, psíquica e social. Se consumir diariamente por dois anos, o viciado terá a destruição total de seu sistema nervoso. Menores de idade passam a roubar e assaltar para comprá-lo. Ao fazerem qualquer coisa para obter a droga, podem tanto matar como morrer em assaltos ou nas mãos de traficantes devido a dívidas.Uma das poucas pesquisas sobre jovens e a droga, realizada em 1995, pelo Grupo Interdisciplinar de Estudos de Alcoolismo e Farmacodependência, do Hospital de Clínicas de São Paulo, com adolescentes entre 12 e 17 anos, revelou que 100% dos viciados diziam que o crack era o seu problema. Isso não acontecia com os alcoólatras (25%) ou consumidores de cocaína (73%). Outro dado da pesquisa: 85% dos viciados em crack descambaram para a marginalidade. Hoje essa droga mortal atinge todas as classes sociais, como indica o aumento da demanda de viciados em clínicas particulares de tratamento a drogados. Os traficantes têm papel relevante nesse processo. De um lado, ao recrutarem menores pobres para formar seus exércitos de vendedores; de outro, por transformarem o consumo em moda e levá-lo às escolas ou redutos das classes média e alta.O consumo de crack é um problema de saúde pública. Alertas sobre a epidemia de crack em nosso Estado ocorrem há tempo. O ex-presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Odyr Porto, propôs há seis anos um programa de educação intersecretarias por entender o caráter público da questão. Apesar dos alertas, houve e há omissão das autoridades sobre o assunto. Quero aproveitar este espaço para chamar a atenção da sociedade, principalmente de pais e mães, sobre o que está ocorrendo em nossas cidades. Devemos refletir sobre a ineficácia das políticas de prevenção e repressão às drogas e o que cada um de nós pode fazer para reverter essa maldição chamada crack.Um bom começo pode ser a aplicação da lei de minha autoria que institui o Programa Interdisciplinar e de Participação Comunitária para Prevenção e Combate à Violência nas Escolas da Rede Pública de Ensino, que procura combater, entre outras fontes de violência, o consumo e o tráfico de drogas. Por fim, como defendo o conceito de inclusão social dos jovens - e não de isolamento, pois isto os empurraria ainda mais para a marginalidade -, é necessário também fortalecermos o trabalho que entidades de defesa dos direitos das crianças e adolescentes vêm fazendo em Sorocaba, prevenindo e orientando nossa juventude.*Hamilton Pereira é deputado estadual (PT) e 1.º secretário da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.