Audiência pública discute privatização de ações da Nossa Caixa


06/06/2001 17:30

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A Assembléia Legislativa realizou nesta quarta-feira, 6/6, audiência pública para discutir o projeto de lei 280/01, do Executivo, que visa colocar à disposição do mercado aberto parte das ações da Nossa Caixa S.A. O debate ocorreu no plenário Juscelino Kubitschek, com a presença de centenas de funcionários do banco nas galerias.

O secretário da Fazenda, Fernando Dall''Acqua, disse que o projeto trata de um conjunto de medidas que vai preparar o banco para o futuro e fez um resumo do histórico da Nossa Caixa durante as últimas gestões do governo estadual. "O banco associou custos altos, baixos lucros e perdas operacionais. Pouco a pouco, financiou setores estratégicos de baixa produtividade, o que acabou causando prejuízo."

Fernando Dall''Acqua afirmou que não há como discutir o papel dos bancos públicos sem abordar a problemática dessas instituições transformadas em instrumentos de fomento com aplicações em setores básicos e ao mesmo tempo em agentes aplicadores do mercado financeiro.

"Sem os recursos do Estado esses bancos passaram a ter dificuldades em desenvolver seus trabalhos. A reestruturação fiscal dos governos limitava o financiamento de bancos públicos, que se tornaram dependentes da captação no mercado", destacou Dall''Acqua.

O secretário lembrou que, ao renegociar a dívida do Banespa, Covas deixou claro ao Banco Central que não privatizaria a Nossa Caixa. "O BC aceitou, mas a condição imposta foi a de que a amortização da dívida da Nossa Caixa seria de 50%, e o governo pagou."

Para o presidente da Nossa Caixa, Geraldo Gardenale, o Banco Central é contrário a bancos estaduais e isso dificulta a sobrevivência desses bancos públicos. "Hoje, a Nossa Caixa está com as finanças sanadas e tem segurança no mercado. Estamos admitindo mais funcionários e com a aprovação do projeto o banco vai crescer."

Bancários querem garantias de que Nossa Caixa continuará como banco público

Davi Zaia, presidente da Federação dos Bancários de São Paulo, disse que a preocupação da entidade é ter garantias de que a Nossa Caixa continuará sendo um banco público. Entre as emendas apoiadas pela Federação estão a que trata da manutenção de 51% das ações no banco e a que trata do acordo de acionistas, para que não seja permitido que o controle do banco saia das mãos do Estado. Ele concordou com a necessidade de se capitalizar o banco, mas afirmou que os lucros obtidos pela Nossa Caixa têm sido repassados à Secretaria da Fazenda na forma de dividendos. "Talvez houvesse um retorno maior a longo prazo, podendo inclusive financiar investimentos, se esses dividendos ficassem com o banco." Ele lembrou que a Constituição prevê que a criação de uma nova empresa tem de ser feita por legislação própria. Sobre a Agência de Fomento, disse que é importante que ela seja criada para financiar os lucros do banco, mas ressaltou que o repasse deve ser feito pelo banco público e "não como faz o BNDES, que se utiliza de bancos privados".



Elias Munir Maalouf, presidente da Associação dos Funcionários da Nossa Caixa, disse ter ouvido com atenção o presidente do banco, mas que não conseguiu encontrar no projeto as coisas ditas por ele, ou seja, que se está buscando o fortalecimento do banco. Ele lembrou que o projeto da Nossa Caixa foi apresentado após a suspensão da venda da Cesp e afirmou que após a venda das ações proposta para o banco e a criação das subsidiárias não sobrará nada para a Nossa Caixa. "Num momento a situação do banco é muito boa. No outro, quando é para negociar com os funcionários, está uma catástrofe, muito ruim", disse. Para ele, se está abrindo caminho para a privatização do restante do banco, ficando os lucros para as carteiras e o custo para o banco. Ele disse que a Associação não é contra a abertura de capital, mas sim contra esse projeto.

Lício Sinzetto, representante do presidente da Associação Comercial de São Paulo, Alencar Corte, colocou a associação à disposição do que for necessário para o fortalecimento do único banco do Estado de São Paulo.

Fernando Dall''Acqua, secretário de Estado da Fazenda, respondeu às questões levantadas dizendo que as pessoas estavam fazendo colocações erradas e que a criação de uma subsidiária integral vai capitalizar o banco e não o contrário. Sobre a porcentagem de ações que poderia ser negociada posteriormente, o secretário disse que os 6% mencionados se referem à Companhia de Seguros do Estado de São Paulo (Cosesp). "A Cosesp já tem 6% das ações no mercado, das quais 5% são da Ceagesp, que é federal". De acordo com Dall''Acqua, esse é um caso específico e se refere apenas à Cosesp, "que não é da Fazenda estadual, mas sim dos inativos, do Instituto de Previdência do Estado de São Paulo (IPESP)", e 76% da receita da Cosesp vem dos balcões do Banespa e da Nossa Caixa. Ele ressaltou que o Banespa está vendendo ainda seguros para a Cosesp por conta de uma cláusula da renegociação da dívida que o obriga a continuar vendendo por 5 anos. Ele prevê que no futuro a Cosesp acabe. "Daqui há 5 anos, ela valerá zero".

Geraldo Gardenale, presidente da Nossa Caixa, reafirmou que a venda das ações permitirá ao banco capitalizar-se. Gardenale disse que o acordo de acionista está previsto para garantir que o banco possa ter as decisões. Para ele, o banco não se encontra, de forma alguma, em situação de insolvência. "Apenas precisamos nos capitalizar para o que virá lá na frente, no sentido de crescimento futuro." O presidente da Nossa Caixa garantiu a solidez do banco e afirmou que os clientes podem ficar sossegados. Segundo ele, a Nossa Caixa precisa, para crescer, de R$ 1 bilhão em 5 anos.

Deputados marcam posições quanto à abertura de capital da Nossa Caixa

Célia Leão, deputada estadual pelo PSDB, disse que o que se quer é a certeza de que o banco será preservado. "Quero dizer aos 15 mil funcionários que se a Nossa Caixa é o que é, deve-se ao trabalho árduo de vocês." A deputada disse ainda que o governador Geraldo Alckmin tem mãos para cuidar do banco e que o projeto deverá ser aprovado para que o banco seja preservado.

Cesar Callegari, deputado estadual pelo PSB, afirmou estar perplexo com a iniciativa do governo de alterar a modelagem do banco. "Se o banco vai bem, por que achar que num horizonte próximo o banco terá problemas?", perguntou o deputado, para quem "essa explicação ainda não foi dada". Ele disse que da forma que está sendo feito, o processo lembra a privatização das empresas de energia. De acordo com o deputado, o governo de São Paulo não tem credibilidade para apresentar um projeto sobre a Nossa Caixa depois do que aconteceu com o Banespa, "um processo altamente lesivo ao Estado de São Paulo".

Carlinhos Almeida, líder do PT na Assembléia, lembrou que as bancadas do seu partido, do PCdoB e do PSB apresentaram emendas ao projeto no prazo de 5 dias que tiveram para fazê-lo. "Começo por aí, a Nossa Caixa não pode ser tratada com urgência, mas deve sim ser tratada com respeito e prudência", disse ele. Para o deputado, isso é o mínimo que se pode esperar em relação a um banco que é patrimônio nosso. Almeida destacou o crescimento do banco de 1994 para cá e disse que ele pode crescer ainda mais ocupando os espaços que eram do Banespa. O deputado petista questionou o fato de o projeto de privatização da Nossa Caixa ter surgido "quando a privatização da Cesp foi suspensa, por ter, em meio ao apagão, se tornado inviável. Parece que o governo usou a privatização da Nossa Caixa como plano B". Para Carlinhos Almeida, a mensagem do governador tem apenas dois parágrafos, com graves conseqüências. Uma delas seria criar "uma espécie de polvo, cuja cabeça é o banco público e que tem sete tentáculos com vontade e direção próprias". Ele pediu que seja retirada a urgência do projeto.

Petterson Prado, deputado estadual pelo PPS, pediu que numa próxima audiência seja dado aos sindicatos que representam as categorias interessadas no projeto o mesmo tempo que foi cedido ao secretário e ao presidente da empresa presentes.



O deputado Renato Simões (PT) chamou os programas de privatização dos governos federal e estadual de "predatórios" e lamentou a abertura do capital da Nossa Caixa para o setor privado. O parlamentar perguntou ao secretário da Fazenda, Fernando Dall''Acqua, qual será o destino do dinheiro da venda das ações do banco e por que o governo considera necessária essa abertura, já que o banco ocupa o 13.º lugar em patrimônio e o 11.º lugar em liqüidez.

Simões pediu ao governo a retirada do pedido de urgência ao PL 280/2001 para que sejam feitas audiências públicas em todas as localidades servidas pelo banco.

Jamil Murad, deputado estadual pelo PCdoB, lembrou que na época da privatização do Banespa o governador Mário Covas afirmou que a Nossa Caixa exerceria o mesmo papel daquele banco privatizado. "Mas não estamos vendo isso". Para Murad, o governo do Estado está obedecendo determinações do governo federal, que, por sua vez, acata as ordens do FMI. "Eles não querem garantir o desenvolvimento do Estado e do país." Jamil Murad quer ver garantido aos funcionários do banco o direito à compra de 10% das ações a preço de mercado, "porque é evidente que o governo quer acabar com os bancos estaduais".

O deputado Vanderlei Macris (pelo PSDB) afirmou que o governo está preocupado em manter a transparência da discussão e que não se trata de um projeto de privatização da Nossa Caixa, "mas de abertura de capital". Segundo ele, a privatização do Banespa ocorreu em "circunstâncias extremamente anômalas", porque o seu patrimônio foi "dilapidado" pelos governos anteriores ao de Mário Covas.

Segundo Macris, o governador Geraldo Alckmin chamou todas as lideranças partidárias para explicar a proposta de abertura de capital, "antes de o projeto de lei ser encaminhado à Assembléia Legislativa". O deputado perguntou ao secretário da Fazenda se esse processo gerará demissão de funcionários.

Audiência encerra-se com incidente. Um incidente envolvendo o sindicalista Dirceu Travesso e o deputado Roque Barbieri (PTB) levou o presidente Walter Feldman a encerrar a audiência pública.

alesp