Deputado sugere plebiscito sobre utilização de células-tronco


30/06/2004 17:03

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Da assessoria do deputado José Caldini Crespo

Realizar um plebiscito para decidir questões polêmicas, como a utilização de células-tronco. Essa sugestão foi feita durante a gravação do programa Quarto Poder, da TV Assembléia, que teve o assunto como tema.

O deputado José Caldini Crespo (PFL), 2º secretário da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa e candidato a prefeito de Sorocaba, defendeu o Projeto de Lei 294/2004, de sua autoria - que cria o Banco Estadual de Células-Tronco colhidas a partir do sangue do cordão umbilical de recém-nascidos para o uso em pesquisas e no tratamento de doenças -, durante a gravação do programa Quarto Poder, da TV Assembléia. O programa desta semana, que irá ao ar nesta quinta-feira, 1º de julho às 21 horas, com reprise na sexta-feira, 2 de julho, ao meio dia, debate o tratamento que a imprensa tem dado ao assunto e a pressão que a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tem feito sobre o Congresso Nacional para que os parlamentares não aprovem a Lei de Biossegurança com a liberação do uso das células-tronco embrionárias.

Crespo sugeriu, no programa, um plebiscito como forma de ouvir a população. Para o deputado, o uso de células-tronco colhidas no sangue do cordão umbilical é hoje uma unanimidade. A polêmica se dá quando os pesquisadores propõem a utilização de células-tronco embrionárias capazes de se diferenciarem em todos os 216 tipos de tecidos humanos, conforme a geneticista Mayana Zatz, coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano brasileiro, professora de genética da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Associação Brasileira de Distrofia Muscular. Segundo a geneticista, as células-tronco advindas do cordão umbilical não têm essa propriedade, o que torna seu uso mais restrito, mas nem por isso menos importante.

Ponto de convergência

Para Crespo, o ponto gerador da polêmica é o momento em que a vida do ser humano tem início e, para os católicos como ele, quando é que a alma passa a fazer parte do corpo. "A Igreja Católica considera o momento da fertilização como o início da vida", lembrou Crespo. Um ponto de convergência entre todos os presentes é a firme posição contrária à clonagem reprodutiva. Possibilidade que, segundo a geneticista Mayana Zatz, já está devidamente impedida graças a um dispositivo no projeto de lei da biossegurança proibindo a transferência das células para útero. De acordo com ela, as academias de ciências de 63 países, inclusive o Brasil, já se posicionaram contra a clonagem reprodutiva.

Apesar da polêmica, Crespo defende que o projeto de lei que trata da biossegurança deva ser votado logo. "O tema é premente e deveria ser discutido ainda este ano. Infelizmente não acredito que isso vá acontecer. Quando se trata de temas polêmicos como esse, meus colegas parlamentares federais, a quem compete estabelecer as regras através das leis federais, parecem ter receio de tomar posição. Por isso sou a favor de um plebiscito para resolver essa questão e tantas outras também geradoras de polêmica e de receio por parte dos deputados federais e senadores, como a pena de morte", afirmou, completando que "o Brasil não pode perder o bonde da engenharia genética".

Para o deputado Crespo, ao se decidir pelo plebiscito governo, comunidade científica, parlamentares, imprensa e as diversas igrejas devem agir juntos na promoção de debates e para informar a população. Embora seja caro, existe a possibilidade de o plebiscito ser feito junto com as eleições, que ocorrem a cada dois anos. A solução proposta por Crespo ganhou a imediata adesão dos presentes ao programa Quarto Poder. "Muitos vão à urna por obrigação. A possibilidade de fazer parte de uma decisão como esta, seria até um incentivo a uma maior participação política da população", completou Crespo.

Quando começa a vida

Defensora da utilização de células-tronco embrionárias, a geneticista Mayana Zatz explicou porque se dá o nome de embrionárias a essas células. Segundo ela a denominação é feita dessa forma porque essas células têm a capacidade do embrião de se transformar em qualquer tecido. Ao responder ao questionamento feito pelo deputado Crespo sobre o momento exato em que a vida humana tal qual a conhecemos tem início, a pesquisadora disse que para a ciência até os 14 primeiros dias após a fertilização, mesmo quando no útero, o embrião ainda não possui sistema nervoso, não sente nada e, portanto, não seria ainda considerado uma vida. Para corroborar sua tese, Mayana destacou que já se aceita que a vida termina quando não há atividade cerebral. "Por quê não aceitar que não há vida se não houver atividade cerebral?", perguntou de volta.

A pesquisadora lembrou que o Dispositivo Intra- Uterino (DIU), aceito e aprovado pelo estado brasileiro como contraceptivo, impede a fixação uterina de embrião com até quatro dias. Ela ressaltou que apesar da Igreja Católica considerar o momento da fertilização o início da vida, os embriões produzidos em laboratório, mesmo quando implantados no útero da mãe, têm apenas 10% de chance de gerar um bebê, taxa que cai para cerca de 3% a 4% depois de congelados. Para ela esse material genético que está sendo descartado pelas clínicas de reprodução humana deveria estar sendo utilizado para salvar vidas. "Estamos lutando pela qualidade de vida e pela possibilidade de cura", afirmou.

Para o deputado Crespo, a pergunta inicial continuou sem resposta. "Quando é que a alma se implanta no ser humano? Como católico talvez eu só possa fechar questão sobre esse assunto no dia em que souber isso." Tanto José Roberto Ferreira quanto Mayana Zatz elogiaram a preocupação dos deputados paulistas com a questão da engenharia genética e da utilização das células-tronco no tratamento de doenças.

"Estou muito feliz que estejam tramitando nesta Casa projetos de lei para a criação de um banco estadual de células-tronco. Tenho defendido esta causa há alguns anos. Um banco público é muito melhor do que um banco privado. Num banco privado o material fica estocado para uso próprio, para o caso da pessoa vir a precisar. Seria o mesmo que estocar o próprio sangue por anos até que se precise, ou não. No caso das células-tronco extraídas do sangue do cordão umbilical, dependendo da doença que a pessoa desenvolva, elas podem, inclusive, não servir para a própria pessoa, já que poderia vir a ter a mesma doença depois. Com cerca de 12 mil a 15 mil amostras, o banco estaria apto a atender a toda a população e não haveria a necessidade de se guardar esse material por anos, já que o estoque seria renovado", disse Mayana.

Voluntário e confidencial

O PL 294/2004, apresentado pelo deputado José Caldini Crespo, prevê a obrigatoriedade da coleta, do armazenamento e da conservação do sangue do cordão umbilical de todos os recém- nascidos, de forma a abastecer o banco público de células-tronco de sangue de cordões umbilicais. O PL prevê ainda que a coleta será realizada somente com o consentimento materno e que a doação será voluntária e confidencial.

jccrespo@al.sp.gov.br

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