O INFERNO É AQUI MESMO - OPINIÃO

Milton Flávio*
06/07/2001 17:05

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O ex-presidente Collor dizia que os automóveis fabricados no Brasil, quando comparados aos produzidos em outros países, não passavam de verdadeiras carroças. Eram ruins e caros. Tinha razão o primeiro amigo de PC. O tempo passou, os carros melhoraram de qualidade, mas, ao menos em São Paulo e também nas médias e grandes cidades do país, continuam mantendo uma estreita ligação com as carroças: a baixa velocidade. Não porque lhes falte potência. Mas porque já não há mais espaço para eles. Pouco importa a hora, pouco importa o local: os congestionamentos se sucedem, numa freqüência capaz de tirar a calma de um monge budista.

As causas desse inferno são conhecidas. Em 25 anos, na capital paulista, a frota de veículos saltou de 1,4 milhão para 5,2 milhões. Em contrapartida, a malha viária urbana, que era de 13.800 quilômetros, passou para os atuais 15.600 quilômetros. Acrescente-se a isso o crescimento desordenado da cidade, a falta de sistemas de transporte coletivo adequados, a má conservação das vias, a escassez de semáforos inteligentes e a falta de educação de boa parte dos motoristas. Não fica difícil entender porque, para muita gente, o inferno é aqui mesmo. Ainda mais quando São Pedro, por sacanagem ou descuido, faz chover nos horários de pico e nos locais errados.

Gente do ramo estima que, somados os gastos com combustíveis e o tempo perdido, a brincadeira custa à metrópole paulistana a bagatela de R$ 3 bilhões por ano, pouco menos da metade de seu orçamento. Suponho que nessa conta de chegar não estejam computados os gastos com calmantes, psicólogos e massagens terapêuticas - se é que sobra tempo e disposição para relaxamentos a quem mora na zona Leste e trabalha no outro extremo da cidade.

Os especialistas são unânimes em afirmar que não há uma solução única para o problema, que é preciso adotar de forma conjunta e harmônica uma série de medidas. Medidas essas que vão da ampliação da rede de trens e metrô (o que, aliás, vem sendo feito pelo governo do Estado, após anos de descaso das administrações anteriores) até a cobrança de pedágios nas marginais e principais vias do centro expandido, mudança nos horários do comércio e indústria, realização de grandes obras viárias (o Rodoanel, como se sabe, está sendo construído em ritmo acelerado) e ampliação do sistema de rodízio, entre uma série de outras providências.

Como se percebe, a solução do problema passa pela adoção de várias providências, todas pouco palatáveis, ora porque mexem diretamente ou indiretamente no bolso dos contribuintes (pedágios ou impostos), ora porque obrigam os cidadãos a mudar hábitos arraigados.

A opção seria deixar tudo como está: na mais perfeita desordem. Nada de novas obras, nada de investimentos, nada de pedágios, nada de rodízios. Mas o desconforto e os prejuízos (coletivos e individuais) continuariam crescendo, em proporções geométricas. Nem que fosse só para provar que não há parto sem dor e que o inferno, minhas senhoras, meus senhores, é aqui mesmo. Até prova em contrário.

Milton Flávio é deputado estadual pelo PSDB e presidente da Comissão de Assuntos Internacionais da Assembléia Legislativa de São Paulo.

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