Opinião - É fácil falar mal dos políticos


31/01/2011 18:10

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Em maio de 1958, Nelson Rodrigues (1912-1980) publicou artigo na revista Manchete com críticas ao pessimismo da população sobre o desempenho da seleção na Copa do Mundo da Suécia, que estava prestes a começar. Ainda traumatizados pelo fiasco de 1950, quando éramos favoritos absolutos e perdemos para o Uruguai em pleno Maracanã, os torcedores temiam novo fracasso do escrete canarinho.

Ao analisar essa atitude derrotista, o jornalista cunhou a expressão "complexo de vira-lata", que definiu como "a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, perante o resto do mundo". Para alegria de Nelson Rodrigues, porém, e de todos nós, o Brasil arrasou os adversários, conquistou seu primeiro título mundial e viu nascer o "rei" Pelé.

Meio século depois, muita coisa mudou em nosso país. Ganhamos mais quatro copas, avançamos na economia, educação, tecnologia e desenvolvimento social, entre outros setores, e angariamos respeito internacional como nação democrática, que valoriza as liberdades individuais e defende a paz mundial.

Uma coisa, porém, permanece inalterada: a incrível facilidade que encontramos para atribuir a culpa pela maioria das nossas mazelas aos políticos. Não digo isso por autodefesa, mas porque se trata de uma constatação nos meios de comunicação de massa, nos comentários em filas e mesmo nas conversas de botequim.

Prova evidente do que poderíamos chamar de "complexo do bode expiatório" é o caso das inundações e catástrofes naturais que ocorreram por conta das fortes chuvas de verão. Na primeira enchente, interdição de estrada ou deslizamento de encosta, surge a frase recorrente: "onde estão esses políticos, que não tomam providências?".

Realmente, a omissão e o descaso das autoridades na adoção de medidas preventivas são responsáveis por uma parcela considerável das tragédias. Não podemos, no entanto, fechar os olhos àqueles que provocam o entupimento de bueiros e reduzem a calha dos rios com lixo ou que, mesmo informados a respeito do perigo, insistem em morar em áreas de risco.

Esses aspectos, no entanto, não merecem destaque nos noticiários. Afinal, é fácil perpetuar o senso comum que atravessa gerações e estabeleceu que o político trabalha pouco, apresenta baixa produtividade e custa caro. E neste cenário, os alvos preferidos são os vereadores, deputados e senadores, todos integrantes do Legislativo, o mais frágil dos Poderes da República.

Alguém se recorda de alguma reportagem recente que avaliasse o desempenho do presidente da República, de um governador ou prefeito? Salvo em denúncias de grande repercussão, poucos se atrevem a incomodar, por exemplo, o governo federal que, diretamente ou por meio de corporações gigantescas como Banco do Brasil, Caixa Econômica, Petrobras e Correios, é o principal anunciante do país.

O Judiciário, então, dispensa comentários. Ainda que existam provas robustas acerca de atos ilegais ou desvio de conduta de seus componentes, quem dirige emissoras de televisão, jornais e demais veículos pensa no mínimo cem vezes antes de divulgar alguma coisa.

Sobra, portanto, o Legislativo, que não tem a força das verbas publicitárias nem da toga. No máximo, quando somos ouvidos, temos o direito de apresentar nossa versão, geralmente publicada com destaque infinitamente menor do que o espaço dado ao enfoque negativo.

O que as pessoas precisam entender é que o político não surge por geração espontânea. Ele nasce na própria sociedade, com virtudes e defeitos típicos daqueles que a compõem.



*Aldo Demarchi é deputado estadual pelo Partido dos Democratas e segundo secretário da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.

alesp