OPINIÃO: 450 anos

Arnaldo Jardim*
14/01/2004 16:33

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O país e o mundo assistiram, a partir do início do século passado, uma bela, tranqüila e pacata cidade localizada no alto da Serra do Mar paulista vertebrar um dos mais rápidos e pujantes processos de desenvolvimento de que se tem notícia na história moderna. A partir dos anos 30, São Paulo começaria a abandonar definitivamente as características que a marcaram desde sua fundação para mergulhar num crescimento acelerado que a faria despontar como o principal pólo econômico do país, verdadeiro celeiro de crescimento da indústria, do comércio, da construção civil, do sistema financeiro, da educação, da arte, da moda, da cultura e da culinária, trazida das mais diversas regiões do mundo por levas de imigrantes e migrantes que aqui aportavam, responsáveis por ajudar a moldar a nova roupagem da cidade que resplandecia.

Exemplo para toda a Nação e orgulho dos que aqui residem, São Paulo, hoje prestes a completar 450 anos, se expandiu de forma vertiginosa mas, devido à rapidez da explosão desenvolvimentista que a transformou de uma cidade com 130 mil habitantes em 1895, numa megalópole com 10,5 milhões de habitantes em 2000, deixou no caminho um rastro de mazelas e toda a ordem de problemas causado por seu crescimento espantoso e desordenado.

É um fato que a população está perdendo, a cada dia que passa, mais qualidade de vida. É evidente que a cidade não pode continuar convivendo com os problemas que hoje batem à porta de todo paulistano. O trânsito caótico, a falta de transporte, o déficit habitacional, o alto índice de desemprego, o crescimento da violência e outras questões de sustentabilidade urbana são discussões que não podem mais ser adiadas e cujas soluções requerem urgência.

A mesma cidade que cresce vertiginosamente para o céu com seus edifícios modernos e vanguardistas, enfrenta hoje um imenso déficit habitacional atingindo mais de 1 milhão de pessoas. Como reflexo dessa situação, temos o aumento vertiginoso de cortiços e favelas, o crescimento desordenado de moradias sobre áreas de mananciais e uma parcela significativa da população sendo empurrada para as ruas ou sob os viadutos.

A mesma cidade que ostenta a indústria e o comércio mais desenvolvidos do país, convive atualmente com um dos maiores índices de desemprego de sua história, assiste a um crescente achatamento na renda de sua população e a um empobrecimento cada vez maior das parcelas menos favorecidas. Dados recentes dão conta de que perto de 200 mil pessoas estão literalmente fora do estado de direito e cidadania não tendo sequer condições de arcar com o pagamento diário de uma passagem de ônibus para que possam se locomover à procura de emprego. Grande parcela desta fatia excluída acomoda-se sob viadutos pela impotência e precariedade de vida.

Parafraseando o visionário ex-prefeito de São Paulo, José Carlos de Figueiredo Ferraz, "São Paulo precisa parar".

Responsável por ter dado à cidade, na década de 70, o novo Plano Diretor, a Lei de Áreas Verdes, a Lei de Zoneamento, a Prodam, a Emurb, um plano de vias expressas, entre outras conquistas, talvez tenha partido de Figueiredo Ferraz o primeiro grande puxão de orelha nas gerações vindouras: se não aliarmos desenvolvimento econômico e crescimento sustentável, corremos o risco de comprometermos o futuro de nossa querida cidade e de todos os que aqui residem.

"Tudo em ti agora é grande, teus feitos e teus problemas. Tua riqueza e tua pobreza", disse Figueiredo Ferraz ao ser empossado na Prefeitura paulistana em 1971. Trinta anos depois, essa advertência toma uma dimensão ainda maior.

É preciso parar. Parar para repensar o que será de São Paulo nas próximas décadas. Parar para buscar as soluções urgentes e necessárias para o caos urbano que vivemos. Parar para refletir sobre em que cidade seus milhões e milhões de habitantes querem viver. Parar para decidir por quais trilhos de São Paulo queremos ver nossos filhos e netos caminhando no futuro.

alesp