Quando a lei protege a violência

OPINIÃO - Afanasio Jazadji*
03/10/2003 15:16

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O assassinato do banqueiro chileno Waldo Arturo Ugalde Erazo por três adolescentes, na praia da Enseada, Guarujá, no penúltimo domingo de setembro, levou a sociedade paulista a refletir melhor sobre a proteção dada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente a menores de idade que praticam atrocidades. M.S.C., conhecido como "Catatau", de 15 anos, deu tiros no chileno diante das duas filhas da vítima, e não sofrerá punição. Uma representante da ONU, Asma Jahangir, que visitou unidades da Febem e vários presídios de São Paulo nos últimos dias, concluiu que a situação de menores infratores internos e de detentos é "terrível", mas não chegou a ter contato com o drama de vítimas da violência praticada por aqueles que hoje permanecem isolados da sociedade.

"Cadeia para mim é hotel. Eu como, bebo, durmo e ninguém me trata mal", diz J.S.S., de apenas 12 anos, que já perdeu a conta de quantas vezes esteve na Delegacia Central do Guarujá. O garoto conta que está no mundo dos roubos desde os oito anos e só num fim de semana praticou seis assaltos, levando correntes de ouro, celular e dinheiro, num total de 320 reais, para comprar maconha. "Para mim, tanto faz se é homem ou mulher. É fácil roubar", diz.

"Vou ser delegado. Acho essa profissão dez", afirma J.S.S. a respeito de seus planos. Alguns policiais do Guarujá que conhecem os garotos infratores da Baixada Santista dizem que esses assaltos são apenas o primeiro passo para assassinatos, como ocorreu no caso do banqueiro chileno.

Mais de 80% dos crimes que acontecem no Guarujá, Baixada Santista, são praticados por jovens, segundo a Polícia Civil. Em algumas ruas próximas da praia de Pitangueiras, moradores enfrentam dificuldades até para entrar nos prédios por causa da ação ostensiva dos jovens, que agem em bicicletas ou a pé. Policiais militares e civis garantem que a violência chegou a tal ponto por causa da certeza de impunidade.

"Catatau", de 15 anos, que matou o banqueiro chileno, escreveu seu nome nas paredes do pátio da Delegacia Central, em uma das dezenas de vezes que esteve no local. Em seguida, foi liberado. O Estatuto da Criança e do Adolescente, oficializado no país há mais de dez anos, não permite que jovens sejam presos. O delegado titular do Guarujá, Milson Sérgio Vasques Calves, afirma que os adolescentes promovem os ataques mais perigosos, pois têm certeza da impunidade. A maioria desses garotos da Baixada está ligada ao tráfico de drogas, assim como ocorre em São Paulo e no Rio de Janeiro.

O comandante do 21.º Batalhão do Guarujá, coronel Raimundo Silva Filho, tem opinião semelhante. Depois de ter adquirido grande experiência no setor, ele chegou à conclusão de que seu trabalho não leva a nada: "É como se nós estivéssemos brincando de fazer polícia, porque prendemos, mas temos de soltá-los por causa do Estatuto. Perdemos tempo". É um desabafo importante e deveria levar parlamentares e juristas a pensar em mudar o estatuto.

*Afanasio Jazadji é radialista, advogado e deputado estadual pelo PFL

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