Violência contra moradores de rua foi um dos temas debatidos pela Comissão de Direitos Humanos

Retrospectiva 2004
21/01/2005 21:03

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DA REDAÇÃO

No final de agosto, a violência contra moradores de rua foi o tema das discussões travado pela Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa, presidida pelo deputado Renato Simões (PT). A reunião contou com a participação do padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua, Aldaíza Sposati, secretária municipal de Assistência Social, do promotor público de justiça Carlos Cardoso, de representantes de organizações sociais e moradores de rua.

No início da reunião foi mencionada a Comissão de Representação, constituída por nove parlamentares da Assembléia, para acompanhar as investigações sobre os casos de assassinatos dos moradores de rua da região central da cidade.

Intolerância social

O padre Júlio Lancellotti disse que a violência contra os moradores de rua não é algo recente, é uma situação recorrente e presente no dia-a-dia de todos os envolvidos com essas pessoas. "O fato ocorrido na última semana foi inédito por ter sido cometido em série e ter características de execução".

Umas das preocupações do padre é o policiamento nas áreas onde aconteceram as mortes. "Temos que evitar o terrorismo. Os policiais não podem aterrorizar os moradores, dizendo a toda hora que eles devem ir embora, pois os assassinos podem chegar. Eles devem inibir a violência com competência e capacidade de acolher", completou.

Segundo o representante da Pastoral, medidas de segurança não bastam para melhorar a vida dos que habitam as ruas. São necessárias políticas de saúde mental, atendimento a dependentes químicos e programas de empregos, mas, principalmente, deixar de lado a indiferença: "é preciso oferecer-se como pessoa e conviver com eles", disse o padre.

A clara intolerância contra minorias que toma conta de parte da sociedade preocupa o padre Júlio, que acredita que essa onda de violência pode migrar para outros grupos sociais.

Rede Rua

Alderon Pereira da Costa, membro da Associação Rede Rua, que auxilia moradores de rua e produz o jornal "O Trecheiro", acredita que a primeira violência sofrida por essas pessoas é o próprio fato de elas terem de ir para rua: "mas, além disso, elas sofrem pequenas violências, como latinhas jogadas sobre eles e fogo ateado sobre seus cobertores". Alderon disse que não acredita que haja grande empenho nas investigações e que o esforço que está sendo feito deve-se à grande repercussão dessas mortes na mídia. "Mesmo assim, o simples fato de estarmos aqui discutindo esse assunto já é uma grande vitória".

Quem é o morador de rua?

Ninguém melhor para traçar um quadro do morador de rua do que ele próprio. Disley Germano estudou até o primeiro ano do 2º grau e fez vários cursos profissionalizantes. Após a morte dos pais, a constância no desemprego levou o jovem de 29 anos a perder a condição de se sustentar por conta própria. Obrigado a desocupar a casa onde morava, por falta de pagamento, acabou indo para a rua. Apesar de ter irmãs, Disley afirmou que a ausência de diálogo acabou afastando-o da família.

Atualmente, ele pernoita no Albergue Arsenal da Esperança, onde, diz, "é muito bem atendido". Mas a grande expectativa de Disley é obter uma ocupação profissional que lhe permita manter uma moradia. "Já me inscrevi na Cooperativa de Catadores de Papel. Acho que é a única saída para aqueles que vivem na rua, a união em torno de cooperativas."

Programa de emagrecimento do Metrô

No final de novembro, a Comissão de Direitos Humanos discutiu o programa de emagrecimento aplicado pelo Metrô aos seus funcionários.

Participaram do debate os presidentes do Metrô, Luiz Carlos Frayze David, do Sindicato dos Metroviários, Flávio Godoi, e do Sindicato dos Médicos de São Paulo, José Erivalder Oliveira.

Frayze David explicou as razões que levaram a empresa a implantar o programa de combate à obesidade. Segundo ele, o Metrô recebe diariamente cerca de 2 milhões de usuários e, para acompanhar esse fluxo, é necessário que os agentes de segurança tenham preparo físico condizente com os cargos que ocupam. "Além disso, a companhia tem preocupação em fazer o acompanhamento médico e nutricional de seus funcionários", declarou.

A companhia adota o padrão da Organização Mundial de Saúde (OMS) para avaliar o Índice de Massa Corpórea. A partir desse padrão, cerca de 40% dos funcionários estavam com o peso normal, 49% com sobrepeso, 8% com obesidade moderada e 1% com obesidade severa. Entretanto, ninguém foi considerado inapto.

Foi estabelecido um programa que previa atividades aeróbicas, caminhada e ginástica localizada, voltado à recuperação física e não ao combate da obesidade. "O funcionário podia optar se queria fazer o acompanhamento individual ou em grupo". Dos participantes do programa, 80% atingiu a meta estabelecida para redução de peso.

Sugestões do sindicato

"Nosso intuito é resolver a questão e não apenas denunciar. Assim, elaboramos sugestões", afirmou Godoi. O presidente sugeriu: a aferição de peso não deve mais ser feita pela chefia de segurança, mas pelo serviço médico da companhia; garantia de emprego para aqueles que sofrem lesão médica; criação de uma comissão paritária para discutir e implementar um programa que não vise tão somente o combate à obesidade, porém a saúde como um todo; implantação de um centro de treinamento e condicionamento físico com um programa exclusivo para agentes de segurança; e oferta pela companhia de roupas e sapatos adequados para os exercícios.

Opinião médica

O presidente do Sindicato dos Médicos informou que a aferição de peso não deve ser feita por um profissional apenas. "O ideal é que uma equipe avalie o funcionário e identifique as causas do sobrepeso".

O médico advertiu que a atividade é estressante e que esse é um fator que pode influenciar na alteração de peso. "Afinal, para ser admitido o funcionário foi considerado apto. Isso quer dizer que ele ganhou peso ao longo dos anos". Erivalder também explicou que é necessário aporte psicológico aos funcionários e definição da inaptidão, se física ou laboral.

Rádios comunitárias

Em dezembro, uma das audiências públicas promovidas pela comissão trouxe para o Parlamento a discussão sobre a atuação situação das rádios comunitárias no Estado. Na audiência, radialistas acusaram agentes da Anatel e da Polícia Federal de terem atuado com abuso de poder na busca e apreensão de equipamentos e na prisão dos operadores de rádio.

O presidente da Associação Brasileira das Rádios Comunitárias (Abraço), Ricardo Campolim, lamentou a morosidade da agência reguladora em expedir as licenças de funcionamento das estações, já que, em dez anos, de 17 mil pedidos, apenas 2,5 mil foram expedidos. "Além de legítimo, o trabalho das rádios comunitárias deveria estar legalizado por meio das licenças de funcionamento", afirmou o radialista.

O gerente regional de fiscalização da Anatel, Paulo Januário, explicou que, quando há denúncia, os fiscais da agência se apresentam no local de funcionamento das rádios para realizar a vistoria dos equipamentos. "Na maioria dos casos, as rádios comunitárias são instaladas em residências. Por causa disso, quando os moradores não permitem a entrada dos fiscais, o procedimento é acionar a Polícia Federal".

Por sua vez, a delegada federal Fernanda de Castro afirmou que a corporação somente atua na repressão às rádios clandestinas mediante mandado judicial, mesmo considerando isso um excesso de zelo. "Quando um crime está ocorrendo dentro de um domicílio, é perfeitamente legal o ingresso de policiais, mesmo sem mandado", argumentou. "Quando há interferência na comunicação entre a torre de comando do Aeroporto de Guarulhos e as aeronaves, paramos tudo o que estamos fazendo e vamos rastrear a antena", disse a delegada, explicando que isso acontece cerca de sete vezes por ano.

O presidente da comissão, deputado Renato Simões, falou da assinatura, pelo presidente Lula, de decreto que institui um grupo de trabalho interministerial no sentido de se buscar um novo marco institucional, mais democrático, para a radiodifusão.

alesp