Ares de Montreal

Opinião
30/11/2005 20:20

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Representantes de 157 países estão reunidos na 11ª Conferência das Partes da Convenção sobre Mudança de Clima (COP), em Montreal. Essa é a primeira reunião entre os países que ratificaram o Protocolo de Kyoto, o acordo global de redução das emissões de poluentes causadores do aquecimento global, mais conhecido como efeito estufa. Nele, os países desenvolvidos se comprometem a diminuir em 5%, até 2012, as emissões de gases poluentes provenientes da queima de combustíveis fósseis, como o petróleo e carvão.

Lembro-me do meu entusiasmo quando, em 16 de fevereiro último, foi anunciada a ratificação do Protocolo de Kyoto. No artigo "Um grande passo para humanidade", comemorava que este acordo global poderia significar uma nova era, pautada pelo desenvolvimento sustentável e pelo respeito ao meio ambiente. Em meio a este processo, creditava ao Brasil um papel importante diante do potencial exportador de biocombustíveis, principalmente com o álcool. Nove meses se passaram e o ritmo da degradação ambiental capitaneada pelo desenvolvimento econômico desenfreado continua crescente.

Recente estudo divulgado pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UN-FCCC) mostra que, entre 1990 e 2003, enquanto os países do Leste e Centro europeu diminuíram suas emissões em 39,6%, principalmente em virtude da desaceleração econômica desencadeada pelo colapso do sistema comunista, os países mais desenvolvidos aumentaram suas emissões em 9,2%. A Espanha, por exemplo, elevou suas emissões em 41,7%; o Canadá, país sede da 11ª COP, 24,2%; o Japão, onde foi assinado o Protocolo de Kyoto, 12,8%. Até 2010, a previsão é que as emissões subam mais de 10%, diante do aumento da demanda global por energia.

Estes números demonstram que houve uma alta dose de dissimulação de alguns países signatários do protocolo. São igualmente graves a posição contrária da administração Bush e o comportamento de alguns países emergentes que, num primeiro momento, ficaram de fora das metas de redução, como a China.

Os EUA, com 4,5% da população mundial, respondem por 22% do consumo global de energia e 21,4% das emissões de CO2 (fora outros gases). No período da pesquisa, os norte-americanos já elevaram as suas emissões em 13,3% e continuam aumentá-las 1,5% ao ano. A aprovação da extração de petróleo no Alasca só denota que a sua atual política energética não deve mudar no curto prazo.

Já a situação da China, que ocupa o segundo lugar no ranking dos poluidores, é preocupante. Cerca de 70% dos seus rios estão contaminados, um terço do país é afetado pela chuva ácida, perdeu mais de mil lagos em 50 anos e tem 20 das 30 cidades mais poluídas do mundo. Essa a industrialização selvagem não deve diminuir, haja vista a recente contaminação por benzeno das águas do Rio Songhua, que deixou seu rastro por 370 quilômetros.

Diante deste quadro, não estranha que cientistas venham prevendo o agravamento de tempestades e inundações, secas e desertificação, além da elevação do nível do mar, queda nas reservas de neve e chuva em muitas regiões, agravando a escassez de água. Um estudo atribui às mudanças climáticas mais de 5 milhões de doenças em 30 anos, 150 mil mortes, e diz que pode piorar.

Em Montreal, o desafio está em colocar em prática toda a regulamentação que foi elaborada, ao longo dos últimos anos, como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), para garantir os investimentos necessários na produção de fontes energéticas mais limpas, além de começar as negociações para a segunda etapa do acordo global, pós-2012. Para isso, é necessário trazer para o tabuleiro tanto os EUA quanto os países emergentes " como China, Índia e Brasil.

Na contramão do pessimismo, numa atitude ousada, o Brasil aceitou colocar em pauta seu calcanhar-de-aquiles: o desmatamento, que representa dois terços das emissões nacionais. O País vai propor a criação de um financiamento internacional para reduzir o desmatamento, no sentido de compensar atividades econômicas que se utilizam desta prática. Com a nova proposta, ao mesmo tempo em que reconhece que é preciso fazer alguma coisa em relação às nossas florestas, poderíamos obter empréstimos capazes de promover o desenvolvimento sustentável nestas regiões. Durante a Conferência, o governador Geraldo Alckmin, que instituiu em São Paulo a Câmara Paulista de Biocombustíveis e constituiu o Fórum Paulista de Mudanças Climáticas, marcará um tento quando o secretário de Meio Ambiente, José Goldemberg, assinar um acordo bilateral entre São Paulo e a Califórnia (EUA) para combater as emissões, utilizando como carro-chefe o nosso álcool combustível.

O resultado da 11º COP não é definitivo. Afinal, os investimentos em energia renovável aumentam em todo mundo: só em 2004, foram US$ 30 bilhões. Mas, até quando vamos insistir em um futuro que não é sustentável, tanto do ponto de vista ambiental como da segurança energética? Continuo acreditando que a resposta está nas fontes renováveis de energia e nós, brasileiros, teremos um papel fundamental neste desafio global.



*Arnaldo Jardim

Coordenador da Frente Parlamentar pela Energia Limpa e Renovável

arnaldojardim@arnaldojardim.com.br

www.arnaldojardim.com.br

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