Opinião - Enchentes: algumas propostas políticas


12/03/2010 21:40

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O cientista mais popular do século XX, além de saber muito sobre física, também reconhecia a importância da vontade e do planejamento para as realizações humanas. Einstein deixou isto cristalino em seus apontamentos sobre nossa sociedade, registrados sob o título "Como eu vejo o mundo". Esta referência é importante para refletirmos sobre as chuvas deste início ano, classificadas corretamente como fora do comum, mas cujos efeitos sobre os municípios e especialmente sobre a população pobre são recorrentes.

É a população mais pobre que paga pela falta de políticas de ocupação do solo urbano, em que pese já existirem dispositivos legais para tanto, como o Estatuto das Cidades. No entanto, poucos municípios implementam o Estatuto, e aqueles que o fazem no intuito de planejar a ocupação do solo urbano, distribuir justiça social e debelar a ocupação de áreas de risco, várzeas, margens de rios e encostas, esbarram na falta de recursos para viabilizar alternativa de habitação para as famílias que precisam ser removidas. É justamente neste ponto que o Governo do Estado tem responsabilidade.

Desde 1989, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo aprova, junto com o Projeto de Lei Orçamentário, o aumento da tributação do ICMS, em 1%. Este crescimento regular do percentual do imposto tem como destino a construção de moradias populares, tarefa de responsabilidade da CDHU.

Entretanto além dos já conhecidos problemas de improbidade, a CDHU também atravessa um problema de gestão; falta uma política que priorize as ocupações de risco do Estado. O orçamento da CDHU para este ano será de quase R$ 1,4 bilhão, o que possibilitará a entrega de mais de 32 mil moradias, além das regularizações e revitalizações de bairros. Com a ampliação destes recursos em mais R$ 3 bilhões, é possível construir mais de 100 mil moradias ainda este ano. Ou seja, com uma nova diretriz política na CDHU, é possível resolver imediatamente a situação de calamidade na qual nos encontramos.

Os recursos sairiam do próprio orçamento do Estado. O presidente da República, quando esteve recentemente em São Paulo, afirmou que teria interesse em executar um projeto de combate às enchentes em nosso Estado - o chamado de "PAC das enchentes". Se esse não foi apenas mais um dos tantos discursos eleitoreiros do atual presidente, está dada a deixa para o governador do Estado enviar à Assembleia Legislativa uma proposta de alteração no orçamento. Assim, ao invés de destinarmos os R$ 8 bilhões previstos na lei orçamentária deste ano ao Governo Federal para fazer frente aos juros da dívida do Estado, que é praticamente toda federalizada, poderíamos enviar 40% menos, alterando este dispositivo no orçamento. O que possibilitaria ter os R$ 3 bilhões mencionados acima, viabilizando assim a remoção das famílias que habitam áreas de risco em nosso Estado de maneira planejada, respeitando a dignidade humana, e entregando-lhes outra casa e não um cheque-despejo de R$ 5 mil reais, como tem feito até o momento a Prefeitura de São Paulo.

A Assembleia Legislativa não se furtaria em aprovar uma proposta de alteração na peça orçamentária com este condão, desde que o destino final, ou seja, construção de moradias para famílias que habitam áreas de risco, ficasse bem claro e impositivo no texto legal.

Pois bem, está lançada a proposta. Resta saber se de fato existe vontade política para enfrentar e debelar o problema.



*Raul Marcelo, 30, é deputado estadual pelo PSOL e líder da bancada na Assembleia Legislativa, onde integra as comissões de Direitos Humanos e de Cultura, Ciência e Tecnologia.

alesp