A falácia do crescimento

Opinião
02/01/2007 15:10

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Todo o final de ano gera uma expectativa natural de recomeço, de mudanças positivas e de bons fluídos, não apenas na vida das pessoas, mas em relação aos rumos do País. Pena que as manchetes insistam em colocar nossos pés no chão " "Lula já admite que país não cresce 5%"; "Lula prepara pacote de maldades"; "Reforma política não deve passar: dizem partidos"; "ONS confirma insuficiência de gás". Não quero fazer o tipo pessimista de plantão, mas na política aprendi desde cedo que há um abismo entre o discurso e a prática, uma lição que sugere certa dose realista ao analisarmos as perspectivas para 2007.

No último dia 29 de outubro, o presidente recém eleito anunciou a meta de crescimento de 5% do Produto Interno Bruto para 2007, conjuntamente a um pacote desenvolvimentista para o segundo mandato. O tempo passou e o conjunto de medidas foi batizado pela própria imprensa de "pacote de maldades", diante da disposição do governo de reduzir os seus "gastos", além da meta de crescimento ter sido reduzida para 4% do PIB, ainda meio ponto percentual acima das projeções do mercado financeiro.

Existem quatro motivos essenciais que justificam o ceticismo em torno da meta de crescimento. Primeiramente, não há sinais de mudanças significativas na atual política econômica adotada desde 2003. Outro aspecto está nos "gargalos na área de infra-estrutura", faltam melhores estradas e portos para escoar nossas riquezas, assim como ainda existe o risco de um novo apagão no setor elétrico em 2010, em meio aos entraves ambientais com as hidrelétricas e a oferta insuficiente de gás natural. Em relação à taxa de juros, apesar de dispormos da menor taxa nominal em anos, o Brasil ainda amarga a incômoda posição de campeão mundial da taxa de juros reais, descontando a inflação. Também não podemos esquecer da asfixiante carga tributária que abocanha mais de 40% do que é produzido no país.

No terreno político, a reforma prometida para fortalecer os partidos, acabar com a infidelidade partidária e inibir as alianças de ocasião ainda não encontra o respaldo necessário para a sua aprovação, seja no Congresso ou no Senado. Como se não bastasse, para aumentar ainda mais o distanciamento entre o Parlamento e a sociedade, foi aprovado um aumento de 91% no salário dos deputados e senadores, que representará um gasto extra da ordem de R$ 1,7 bilhão. Isso, poucos dias após ter sido fechado um acordo para elevar o salário mínimo para R$ 375.

Neste ponto, merece destaque a corajosa atitude do PPS de ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra este reajuste ultrajante. Segundo palavras do nosso presidente Roberto Freire, "a proposta de aumento deveria ter sido submetida ao plenário e não decidida a portas fechadas". E vou além: o mencionado aumento teria um efeito cascata que poderia comprometer os esforços de estados e municípios em respeitar os princípios da responsabilidade social, além do fato de que alguns deputados e senadores superariam o teto constitucional.

Em Brasília, vou defender os reajustes dos parlamentares atrelados aos aumentos dos servidores públicos federais, assim como no âmbito estadual e municipal. Desse modo, cada estado ou município adequaria sua folha de pagamento à sua realidade. Concomitantemente, reitero o compromisso de lutar por uma ampla e consistente reforma política, que institua o voto distrital misto, fortaleça os partidos e jogue uma luz permanente sobre os seus métodos de ação e no processo eleitoral, no tocante aos financiamentos de campanha.

E mais importante, precisamos avançar na elaboração de uma alternativa viável à atual política econômica, com o estabelecimento de uma mobilização nacional para a construção de uma real política desenvolvimentista, unindo a sociedade civil organizada, o setor produtivo, a opinião pública e as lideranças de partidos, sejam oposição ou não. Esses podem ser os primeiros passos para que o Parlamento seja, efetivamente, a representação dos anseios da população brasileira.

* Arnaldo Jardim é deputado estadual pelo PPS

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