Opinião - Comemorar o quê?


31/03/2010 16:19

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Milhões de pessoas pararam em frente à televisão no dia 27 de março e, segundo a imprensa, mais de 200 pessoas estiveram em frente ao 2º Tribunal do Júri do Foro Regional de Santana (zona norte de São Paulo). Após ouvir o juiz Maurício Fossen anunciar a condenação do casal Nardoni, acusado de agredir, estrangular e jogar a menininha de 5 anos, Isabella Nardoni, pela janela no dia 29 de março de 2008, a população comemorou com razões de vitória. A pergunta que não quer calar: Qual o motivo da comemoração?

A menina continua morta, três famílias destruídas, duas crianças, Pietro, cinco anos, e Cauã, três anos, quase órfãs. A justiça foi feita, porém o vazio ficou. É um fato que deve levar a sociedade à reflexão sobre como evitar a destruição de outras famílias e de que maneira podem conservar o amor nos lares modernos. O Brasil parou mais uma vez diante de um crime que mobilizou a opinião pública toda.

"Condenados! Afinal, Isabella pode descansar em paz" foi à frase estampada em uma das revistas de maior circulação do país. Será mesmo? Que paz esse caso trouxe a todos os envolvidos? O caso tocou na ferida da maioria dos brasileiros e trouxe à tona a questão dos valores familiares que vêm se perdendo dentro dos lares. A frieza demonstrada pelo casal no curso do processo é o retrato da falta de diálogo, paciência e amor diante das dificuldades que uma família pode enfrentar a cada dia. Os valores familiares estão se perdendo no decorrer dos tempos, ou seja, a identidade familiar.

A condenação foi justa, entretanto, a questão continua aberta: Por que mataram? Talvez nunca saberemos. Que modelo de família os réus teriam recebido no decorrer de suas formações de caráter e personalidade?

A insensibilidade dos Nardoni frente aos fatos foi notória diante da perda de um ente querido; a passionalidade do pai em relação à morte da filha e dos avós que mantiveram a mesma postura referente aos netos, preocupa em termos de valores sociais.

Os fatos nos levam a tomar atitudes com o coração mais duro, isto é, de forma fria e induzida a sermos insensíveis ao sofrimento do outro. Entretanto temos que rever os valores a cada dia e tomarmos atitudes de forma mais humanizada.

Milhares de pessoas estavam ali, vindas de várias regiões do Brasil, de diferentes classes socioeconômicas e culturais. Sabiam realmente o que estavam fazendo? Será que esse desejo de vingança embutido em cada brasileiro que acompanhava não reflete a atual situação da sociedade como um todo? Toda população foi absolvida com o caso Isabella? Será que esse é o sentimento do "cidadão" brasileiro?

Por nada se mata e se destroi a vida de pessoas inocentes como se fosse uma ação normal ou uma necessidade fisiológica, ou como se chuta uma pedra.

A condenação, entretanto, não é apenas de Alexandre Nardoni e Ana Jatobá, mas de toda sociedade refletida na situação em questão. Para onde a sociedade está caminhando quando milhões de pessoas veem famílias serem destruídas e comemoram? Criamos uma sociedade que não se arrepende dos seus erros.

Quando os Nardoni deixaram o Fórum de Santana, as pessoas concluíram que a justiça havia sido feita. Mas a justiça é aquilo que faz valer o direito de cada um, só que nesse caso não me parece que o direito individual foi resguardado com a exposição excessiva e o pré-julgamento do casal. A comoção publica só foi possível por causa da ampla cobertura da imprensa e também porque, nesse caso, os brasileiros, injustiçados e abandonados, se viram militantes dessa causa. O clamor pela justiça é algo que quase todos os brasileiros vêm carregando, e isso ficou claro com a violência com que receberam os condenados, e até mesmo o advogado de defesa. A dor ganhou alma.

Não é a hora de pular, gritar e soltar fogos. O caso que acompanhamos nesses dias é algo triste e espelha a nossa sociedade atual. Agora é o momento de refletir sobre as outras tantas "Isabellas" que estão espalhadas pelo Brasil e que tem sido vítimas de pais pouco presentes, bem como as que perdem sua própria vida diante da violência doméstica ou do completo abandono, e isso ocorre independente da classe socioeconômica e cultural. As famílias precisam rever seus valores e manter um dialogo ativo com seus filhos, isso é fundamental para que casos como esse não se repitam.

*Gilmaci Santos é deputado e presidente estadual do PRB. Também participa das comissões de Defesa dos Direitos do Consumidor e de Economia e Planejamento.

alesp