OPINIÃO: Triste defesa da impunidade


18/04/2005 15:37

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Com uma incrível criatividade para tentar iludir a população, o Governo do Estado acaba de "descobrir" um modo de atenuar o problema das cadeias lotadas: reduzir as penas impostas aos bandidos mais perigosos e cruéis. Isso até parece brincadeira, mas não é. O secretário da Administração Penitenciária, ex-juiz Nagashi Furukawa, fez de fato uma absurda declaração à imprensa ao comentar sua preocupação com o aumento do número de detentos nos presídios paulistas.

Para o secretário, é importante o Supremo Tribunal Federal (STF) tornar sem efeito a Lei do Crime Hediondo, que impõe punições mais rigorosas para os condenados por crimes de seqüestro, tráfico de drogas e estupro. Ou seja: a solução encontrada pelo "especialista" do Governo de São Paulo consiste em reduzir penas e, portanto, estimular ainda mais a já enorme impunidade que existe em nosso País. E ele torce para o STF mudar a lei.

A Lei do Crime Hediondo, de âmbito federal, sancionada há alguns anos, foi idealizada para combater a crescente onda de seqüestros e de tráfico de drogas no Brasil. A partir do fato de um crime ser considerado hediondo, a pena de prisão para seus autores aumenta. Só que o secretário Furukawa, que deveria estar preocupado com a repressão ao crime, parece mais ligado à tarefa de esvaziar cadeias.

Em cinco anos, o número de presos no Estado de São Paulo dobrou: passou de 53 mil, em 1999, para 109 mil, em 2004. E foi reduzido o número de crimes? Não. Então, o negócio é construir mais cadeias! Não é a primeira vez que o secretário Furukawa comete absurdos. Com sua experiência de juiz e de responsável por uma pequena cadeia do Interior, a de Bragança Paulista, ele foi "premiado" no governo Mário Covas com o cargo de secretário, passando a cuidar de uma das áreas mais tensas da administração pública. O governador Alckmin, que substituiu Covas, preferiu mantê-lo, mesmo depois do grande motim simultâneo ocorrido em quase 30 cadeias do Estado em 18 de fevereiro de 2001.

Furukawa foi, sem dúvida o violinista da orquestra regida por Alckmin no espetáculo da implosão da Casa de Detenção do Carandiru " uma ação demagógica, já que não havia novas cadeias suficientes para abrigar os presos mantidos naquelas celas. Desta forma, a cada semana, o secretário vem a público para reclamar que todos os presídios do Estado estão lotados. Adianta reclamar?

A onda de absurdos mostra duas situações: enquanto são registradas, em várias cadeias, rebeliões que culminam com o corte de cabeças de carcereiros e de presos pelos detentos, verifica-se que a alemã Melanie Werner, recolhida ao Presídio Feminino do Tatuapé condenada por tráfico de drogas, posou, em sua cela, para fotos sensuais veiculadas por uma revista e jornais.

De um lado, a tolerância na inspeção de objetos levados às cadeias faz com que os presos recebam celulares e armas. De outro lado, a mesma tolerância permite que uma detenta estrangeira faça da cadeia uma quermesse. Onde estamos? Como deputado estadual, tratei de agir. Assim como registrei na Assembléia Legislativa minha indignação contra a violência colocada em prática por alguns presos, sem que aparecesse algum policial do grupo dos atiradores de elite para cortar o mal pela raiz, eliminando os bandidos antes que estes matassem inocentes, enviei uma interpelação ao secretário Furukawa sobre o motivo alegado para permitir a produção de fotos da detenta Melanie naquelas condições. A crítica ao secretário, porém, estende-se ao governador, que, mais preocupado com as eleições de 2006, recorre ao marketing demagógico e evita a busca de soluções concretas para os problemas da população paulista.

O governo federal também não fica imune às críticas. O mais famoso preso do Estado de São Paulo é, na verdade, de outro Estado, o Rio de Janeiro: o traficante Fernandinho Beira-Mar, "hóspede" no moderno presídio de Presidente Bernardes por imposição do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Aquilo que seria solução passageira passou a ser algo definitivo, pois Beira-Mar continua na cadeia paulista, onde não tem as facilidades encontradas no Rio para burlar a vigilância e encabeçar motins.

Mais recentemente, cinco presos do Estado de Mato Grosso também foram transferidos para Presidente Bernardes. O governo federal não libera dinheiro para a construção de cadeias em todas as regiões do País. E São Paulo, que já sofre diretamente com os próprios erros, paga um preço alto pela incompetência da União e dos outros Estados.

* Afanásio Jazdji é deputado estadual

alesp