A dimensão econômica da violência doméstica

Opinião
30/05/2005 19:34

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Desde a criação das primeiras delegacias da Mulher, grande marco da preocupação do Estado no combate à violência de gênero, o Brasil avançou bastante na garantia dos direitos fundamentais das mulheres. Campanhas foram feitas, mobilizações foram realizadas, sanções legais foram tomadas e consciências foram abertas a uma nova compreensão da questão.

A grosso modo pode-se dizer que este movimento pelo fim da violência doméstica teve uma primeira fase "filosófica", na qual era preciso enfrentar a noção de que a violência doméstica era assunto privado. Depois passou por uma fase política, na qual o tema foi incorporado à agenda dos agentes políticos na busca de soluções. Na sequência chegou-se a uma dimensão judicial na procura de estruturas e sanções que punissem os abusos. Por fim, ocorreu um movimento de massas no sentido de convencer a população da importância da questão.

Chegou-se a um momento no qual a batalha não é apenas política, judicial, publicitária, mas deve também ser econômica. O grande elemento que hoje faz com que muitas mulheres ainda estejam submetidas a maus tratos é a dependência econômica mais do que qualquer outro. Situação esta que se agrava em função da crise econômica e dos elevados índices de desemprego, o qual geralmente atinge mais a população feminina do que a masculina.

Ao contrário do que possa parecer, a dependência econômica que atrela a mulher ao agressor não é uma realidade exclusiva da população mais carente, mas é um problema também para a classe média. Sem experiência profissional ou afastada do mercado de trabalho por anos, dotada de um tipo de conhecimento específico que em geral não é valorizada economicamente pela sociedade, a mulher muitas vezes tem de optar entre conviver com a violência doméstica ou a miséria.

É o momento do Estado e da sociedade buscar ferramentas para enfrentar este desafio da recolocação da mulher agredida no mercado de trabalho, libertando-a da dependência econômica. Certamente não é uma tarefa fácil, mas é sem dúvida essencial para que os níveis de agressão doméstica sejam rebaixados significativamente neste momento. Ainda que eles possam ser reduzidos através da conscientização e das medidas punitivas, não haverá um controle efetivo enquanto persistir o laço da subsistência unindo agressor e agredida.

A solução para a questão não é simples. Exige não só esforço, mas criatividade para aproveitar a experiência da mulher e revalorizá-la. A formação de cooperativas destinadas ao trabalho artesanal é um caminho promissor neste aspecto. Não lida somente com um universo no qual a mulher que não tem experiência no mercado de trabalho tradicional é familiarizada, como tem uma boa perspectiva de mercado e tende a ser cada vez mais valorizada.

Destaque-se que este caminho exige muito pouco do Estado, porque as cooperativas bem formadas, estruturadas de forma adequada e que forneçam também o treinamento gerencial às próprias mulheres ajudam-nas a abrir mercados com muita rapidez, o que as tornam auto-suficientes, gerando recursos para expansão e investimento. O Estado precisa, portanto, apenas dar um primeiro impulso para alavancar a solução ou jamais se superará esta dimensão econômica que impede a eliminação da violência doméstica.

*Rosmary Corrêa (PSDB), Delegada Rose, é deputada estadual e membro das Comissões de Segurança Pública e Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de São Paulo. Foi a titular da primeira Delegacia da Mulher instalada no país.

alesp