Construir cidadãos é melhor que fabricar cadeias

OPINIÃO - Romeu Tuma
02/07/2003 16:44

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O Estado de São Paulo gasta hoje R$ 767 por mês com cada preso nas penitenciárias paulistas. Eu e você, todos nós contribuintes, colocamos R$ 767 no bolso de cada um daqueles que só engrossam os índices de violência no Brasil. Você acha justo prosseguir com a atual política carcerária, em que o Estado apenas corre atrás do prejuízo, construindo mais e mais cadeias, que acabam superlotadas e não cumprem o tão sonhado papel de ressocialização dos detentos?

Algumas experiências isoladas começam a tomar corpo em diferentes Estados brasileiros. Precisam ser analisadas a fim de encontrarmos um modelo que realmente funcione, diminuindo o ônus que recai sobre a população. A Penitenciária Industrial Regional do Cariri, no Ceará, é um dos cinco presídios privatizados do Brasil. Lá, a limpeza e administração ficam por conta de uma empresa. A execução da pena é responsabilidade do Estado. Há outras duas no mesmo Estado, uma na Bahia e mais uma no Paraná.

Nessas cadeias, existe toda uma infra-estrutura visando atender a lei das execuções penais, que tem como objetivo final a ressocialização. Os presos contam com atendimentos psicológico, social e jurídico. Os 500 presos do Cariri, por exemplo, têm médico, dentista, escola, teatro, arte e trabalho. Uma linha de produção de jóias fica dentro da cadeia, de onde saem 250 mil peças por mês. Cada interno ganha R$ 180 por mês, o que equivale a 75% do salário mínimo, conforme determina a lei. O resultado não demorou a surgir: em quase três anos, o Cariri não assistiu a nenhuma fuga ou rebelião. A administração privada também facilita o combate à corrupção. Há rodízio de funcionários por hora e setor e nada de intimidades com os presos.

Apesar de interessante, nós seguimos pagando um preço caro para cada preso. A empresa de segurança que administra o presídio do Cariri recebe do governo R$ 650 por detento. Talvez aí resida o maior problema. É necessário desonerar o Estado e utilizar esses recursos que não são poucos em programas que inibam a violência. Tratar as causas e não os efeitos.

Em São Paulo, o governo estadual já repassou a administração de 15 unidades carcerárias para Organizações Não-Governamentais. O caso mais recente é a Penitenciária 3 de Hortolândia, que abriga 1.100 presos. O Estado segue responsável pela manutenção da segurança e da disciplina da prisão. A sociedade civil assume o gerenciamento da assistência material, jurídica, educacional, social, religiosa, psicológica, laborterápica e de saúde. No modelo paulista, há uma economia de 37%. Em vez daqueles R$ 767 mensais, ainda vamos bancar R$ 480 todo mês com cada um dos detentos. Ainda é muito, mas já podemos perceber que caminhos existem.

A partir dessas experiências, vamos buscar junto à sociedade civil e ao Parlamento definir o modelo ideal para utilizar esses recursos de forma inteligente. O ideal é que os presos tenham custo zero para o Estado. Só assim conseguiremos parar de correr atrás do próprio rabo. Desta forma, temos certeza, o governo, em vez de seguir como uma "grande fábrica de cadeias", poderá assumir um papel bem mais nobre, o de "construtor de cidadãos".

*Romeu Tuma é delegado de Classe Especial da Polícia Civil, deputado estadual (PPS-SP) e presidente da Comissão de Segurança Pública da Assembléia Legislativa de São Paulo

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