O APAGÃO E A CULTURA DO DESPERDÍCIO - OPINIÃO

Roberto Engler*
22/05/2001 18:42

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Há uma história sobre dois vendedores enviados por uma fábrica de calçados para um país pobre da África. Algum tempo depois o primeiro envia um telegrama à matriz informando que não há possibilidades de mercado porque todos os habitantes andam descalços. Já o segundo envia mensagem relatando as excelentes oportunidades de negócios, já que no país ninguém ainda tem sapatos, todos andam descalços.

Sem querer aqui desculpar ou justificar a omissão dos responsáveis pelo planejamento da política energética, que nos legaram este vergonhoso apagão. Certamente merecem as críticas que lhes são destinadas. Mas gostaria de destacar que ao menos nesta situação caótica que pode surgir há algumas oportunidades a serem aproveitadas e até da desgraça é possível colher algo bom.

No caso a vantagem que o país pode auferir desta dificuldade é a reversão da nossa cultura do desperdício, tão profundamente arraigada na nossa cultura que somente uma tempestade da dimensão do apagão poderá ser capaz de desenraizar. No Brasil as riquezas disponíveis sempre alimentaram em nós esta cultura do desperdício, havia tanta abundância que nunca nos preocupamos em usar apenas o necessário, fazemos questão de desperdiçar, de não dosar nossos gastos em tudo, não só na energia.

Desperdiçamos a água, embora seja recurso limitado que deveria ser usado de forma racional e aproveito para lembrar que talvez o apagão talvez nos faça olhar com mais atenção o projeto em tramitação nesta casa que prevê uma utilização mais racional da água. Desperdiçamos alimentos que poderiam reduzir a fome se bem usados, desperdiçamos materiais em nossas construções, enfim, somos um país pobre com um lixo dos mais ricos.

Uma velha história diz que um pai, temendo a intemperança do filho, fez que este lhe prometesse no leito de morte que se um dia desbaratasse toda a fortuna da sua herança iria até o celeiro e se enforcaria numa determinada trave que indicou.

O filho, diante de tanta insistência fez este juramento mórbido. Dias depois o pai morre e o filho, como havia sido previsto, torra a fortuna do pai em poucos meses. Morto de vergonha, resolve cumprir a promessa para poder ao menos encontrar o pai com menos remorso no outro lado. Pendura-se na trave e quando vai pular para se enforcar a trave se solta e despeja sobre eles moedas de ouro, era a outra metade da herança que o pai havia reservado para quando o filho já tivesse aprendido a lição gastando a primeira.

Já estamos dependurados na trave, vamos esperar que a lição tenha sido aprendida - ainda que este desperdício não justifique por si só a crise - e daqui para frente sejamos mais cuidados em lidar com nossos recursos, sem ser pródigo com recursos que a dura custas aprendemos ser finitos.

*Roberto Engler é deputado estadual pelo PSDB

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